Promover património com raspadinhas? "Era melhor ajudar quem abusa do jogo"
02-06-2021 - 00:06
 • Pedro Filipe Silva (entrevista) , André Rodrigues (texto)

Pedro Hubert, psicólogo e especialista em jogo patológico, explica que o problema do aumento do jogo “não é só em Portugal, é universal". Mas avisa que se há cada vez mais pessoas a jogar, fruto da pandemia, isso traduz-se num “aumento do número de jogadores patológicos”, que passam “do abuso à dependência".

A pandemia de Covid-19 trouxe um aumento da dependência do jogo.

É essa a perceção do psicólogo Pedro Hubert, especialista na área do jogo patológico, no contexto das conclusões do estudo do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD), segundo o qual cerca de 80 mil portugueses são afetados pelo vício do jogo.

As raspadinhas são as mais procuradas pelos consumidores e só é batida pelo Euromilhões.

O estudo acrescenta que mais de metade dos jogadores de raspadinha são mulheres entre os 35 e os 54 anos, com habilitações relativamente baixas e rendimentos entre 500 e 1000 euros mensais.

Face a estes dados, Pedro Hubert, que é técnico de aconselhamento no Instituto de Apoio ao Jogador (IAJ) confirma à Renascença que, em tempo de pandemia, o número de pedidos “aumentou imenso, por isso estes dados estarão desfasados, mas foi importante este estudo ter saído para termos algumas indicações que são preciosas” para compreender as tendências do jogo patológico em Portugal.

Mas o problema do aumento do jogo “não é só em Portugal, é universal e há cada vez mais pessoas a jogar em todos os formatos, seja online, seja offline ou os dois modos em conjunto”, o que se traduz num “aumento do número de jogadores e do número de jogadores patológicos”, ou seja aqueles que passam “do abuso à dependência”, detalha.

Por essa razão, Pedro Hubert diz não compreender que, perante um problema crescente, o Governo tenha decidido criar a raspadinha do património, lançada no mês passado.

“Não concordo absolutamente nada quando a ministra da Cultura diz que os portugueses têm a liberdade de decidir se jogam ou não jogam, porque há algumas pessoas que, quando experimentam deixam de ter essa liberdade”, alerta o psicólogo.

Daí que Pedro Hubert defenda que “poderiam ser encontradas outras fórmulas” para promover o património e a cultura, porque, diz, “esta opção, poderia fazer acompanhar-se por um acréscimo do jogo responsável ou de meios para atender as pessoas que têm problemas de tendência de abuso de jogo e, a meu ver, não foi feito rigorosamente nada”.