O diário britânico “The Guardian” entrevistou um ex-espião do KGB, Yuri Schvets, que vive nos EUA desde 1993, tendo adquirido a nacionalidade americana. Schvets foi a principal fonte de um livro agora publicado sobre as relações dos EUA com a Rússia, escrito pelo jornalista americano Craig Hunger. Schvets e o livro contam uma história muito interessante sobre Trump e a polícia secreta russa. Uma história verídica? Neste momento é impossível garantir; mas é uma história verosímil, que não foi, entretanto, desmentida, que eu saiba. Em Portugal pelo menos o jornal “Público” abordou o assunto.
Em resumo trata-se do seguinte. Putin foi um agente ativo do KGB, antes e depois do colapso da União Soviética. A polícia secreta russa manteve enorme poder, apesar daquele colapso. Há décadas lançou uma ofensiva de “charme” a Trump, bem como a outras promissoras personalidades dos EUA. Schvets foi enviado para os EUA e uma das suas missões não foi converter Trump ao comunismo, que tinha desaparecido, mas levá-lo a simpatizar com a Rússia de Putin. A aposta foi ganha, sobretudo quando em 2016 Trump foi eleito presidente dos EUA.
A estratégia dos serviços secretos russos era seduzir americanos que poderiam ser mais tarde úteis para a política externa de Putin. Diz o “Guardian” que Trump foi o “alvo perfeito”. Durante 40 anos o KGB, agora com outro nome, fingiu-se imensamente impressionado com a personalidade de Trump. Percebendo que lidavam com uma pessoa extremamente vulnerável no plano intelectual e psicológico e que, além disso, se mostrava muito suscetível às lisonjas, os agentes secretos russos nos EUA encorajaram-no a candidatar-se a presidente.
Mas, ainda antes disso, Trump manifestou opiniões nada ortodoxas para um conservador, como criticar a guerra fria de R. Reagan contra a Rússia, acusar o aliado Japão e exprimir ceticismo quanto à NATO. “A América deve deixar de pagar para defender países que não conseguem defender-se”, disse então Trump. Afirmações destas provocaram grande entusiasmo em Moscovo, como se calcula.
Deve dizer-se em abono do ex-espião Schvets que ele próprio ficou surpreendido com a vitória de Trump nas eleições presidenciais de 2016. Disse ele ao “Guardian”: “Este foi um caso sem precedentes. Eu era conhecedor das medidas para aliciar simpatizantes nos EUA, mas nunca tinha visto nada semelhante – até Trump se tornar presidente dos EUA, porque isso era uma coisa louca. Era difícil acreditar que Trump fosse aceitável para pessoas sérias no Ocidente”...
Percebe-se, assim, a estranha relação de Trump com Putin – que ele nunca criticou, quando o seu hábito era insultar toda a gente, a começar pelos amigos. Mas Putin tem agora mais com que se preocupar. Não é que ele arrisque ser afastado do poder, pois o aparelho repressivo que o sustenta é muito forte. Mas não há dúvida de que a extraordinária coragem do seu opositor Navalny suscitou uma inédita onda de manifestações contra o Kremlin. E a vizinha Bielorrúsia continua a dar, também, um exemplo destemido contra a feroz repressão do seu presidente, exemplo que os russos conhecem.