​Laranja vivo e azul liberal. Um encontro premonitório em Santa Catarina?
27-01-2022 - 22:26
 • André Rodrigues

Rui Rio e João Cotrim de Figueiredo não chegaram a encontrar-se na arruada pelo coração da baixa do Porto, mas o cruzamento das duas arruadas pareceu um encontro de amigos. Ou futuros aliados no Governo.

Se a Rua de Santa Catarina fosse o Parlamento, o PSD teria conseguido uma aproximação à Iniciativa Liberal, um dia depois de António Costa ter por lá passado sozinho.

Se o quase encontro entre Rui Rio e João Cotrim de Figueiredo foi obra do acaso, ninguém sabe. O certo é que o líder do PSD chegou com vários minutos de atraso em relação à hora prevista (16h00), fintou os simpatizantes e os muitos jornalistas que o aguardavam no cruzamento da Capela das Almas, entre as ruas de Santa Catarina e Fernandes Tomás.

Foi nesse compasso de espera , lá em baixo, perto do local onde Rui Rio iria discursar, junto ao Café Majestic, que bandeiras azuis ao alto anunciavam a arruada da Iniciativa Liberal.

"São os bons a juntarem-se", ouviu-se alguém dizer, à medida que os liberais, encabeçados por Cotrim de Figueiredo se aproximavam a passos largos do ponto de encontro da arruada do PSD.

PSD + IL = Portugal?

Premonição de um eventual entendimento entre os dois partidos a partir de 30 de janeiro ou não, o certo é que bastou um assobio de Salvador Malheiro para os sociais-democratas abrirem um corredor para a arruada da IL. A passagem fez-se pacífica, entre sorrisos e trocas de cumprimentos entre liberais e simpatizantes do PSD.

Um encontro não de rivais, mas de velhos conhecidos e, até, amigos.

A junção das vozes que apregoavam as siglas dos dois partidos, numa parafernália tortuosa para os tímpanos, acabou por se sintetizar em "Portugal, Portugal, Portugal" entoado a plenos pulmões de um lado e do outro da rua.

À passagem, João Cotrim de Figueiredo recebeu o cumprimento e muitos sorrisos atrás das máscaras laranja. Uns mais anónimos do que outros, outros mais efusivos, como o abraço que o líder da IL deu ao economista Álvaro Santos Almeida, antigo vereador do PSD na Câmara do Porto, depois de ter saído derrotado nas autárquicas de 2017 por Rui Moreira.

Cotrim vestindo informal, de calças de ganga e sapatilhas, Santos Almeida de fato e gravata, falaram por breves segundos e, no meio da música, do rufar dos tambores da arruada laranja e dos gritos dos militantes de ambos os partidos, lá se conseguiram ouvir os votos mútuos de "felicidades" e "boa campanha".

Luís Filipe Menezes com Rui Rio. "As nossas disputas sempre foram dentro de portas"

Foi um dos momentos da tarde: Luís Filipe Menezes, ex-líder do PSD e antigo autarca de Gaia, apareceu ao lado Rui Rio.

"As nossas disputas sempre foram dentro de portas, depois cá fora estamos juntos. É a nossa filosofia e é isso que justifica que o PSD vai ganhar estas eleições, porventura, com uma folga superior àquilo que as sondagens dizem", referiu Menezes que diz não se recordar de uma mobilização assim "há 20 anos ou mais".

"Eu sempre estive ao lado do partido e do presidente do meu partido em todas as eleições, primeiro na campanha para as autárquicas e agora em eleições nacionais", prosseguiu Menezes que chamou, ainda, à atenção para o facto de "ninguém ter ainda visto o António José Seguro ao lado de António Costa".

Uns metros à frente, Paulo Rangel fez o apelo ao voto útil: "é importante que esta mobilização dê um sinal aos portugueses que ainda estão em dúvida, àqueles que ainda podem estar a hesitar entre o PS e o PSD ou, até, entre outros partidos e o PSD que o PSD é o único que está em condições de derrotar António Costa e o PS. Só votando no PSD e em Rui Rio é que pode haver uma mudança em Portugal".

Mas Rui Rio, nem vê-lo. Até que uma outra coluna laranja começou a subir a principal artéria comercial da baixa do Porto, confundindo simpatizantes e jornalistas.

Santa Catarina foi Porto e muito mais

Rui Rio fintou todos e só pôs os pés na rua uns metros à frente do centro comercial de Santa Catarina.

Protegido por uma robusta bolha de segurança de que nem transeuntes nem jornalistas conseguiam aproximar-se, o líder do PSD viu-se em casa, sorriu mais do que noutras arruadas, ouviu as mensagens de incentivo do costume numa rua onde estava o Porto social-democrata, mas muito mais do que isso. Havia cartazes de Barcelos, de Arcos de Valdevez, ouvia-se gente vinda de Guimarães, da Póvoa de Varzim e de outros locais do norte do país.

A arruada fez-se mais curta do que o previsto, mas não menos triunfal. Rio caminhou escassos até à varanda por cima de uma loja de pronto a vestir que, coincidência das coincidências, fica mesmo ao lado da antiga secção do PS da freguesia de Santo Ildefonso.

Foi a partir dessa varanda que o líder social-democrata voltou a acusar António Costa de "deturpar" as propostas do PSD, a posição de Rui Rio sobre a saúde, o salário mínimo nacional e as pensões.

"Fez uma campanha baseada na mentira. Merece perder", disse o líder do PSD.

Se o Porto foi o ensaio para o último dia de campanha em Lisboa, o PSD superou o desafio de forma empenhada.

"O político português mais honesto desde Sá Carneiro" ou "o presidente que fechou as portas da Câmara ao FC Porto campeão"

Se a rua é um barómetro, Rui Rio recebeu franca aprovação nas ruas da Invicta.

"É o político português mais honesto desde Sá Carneiro e tem de ganhar, para ver se mudamos de vez e mandamos aqueles socialistas embora", dizia um apoiante de Rui Rio.

Mas o Porto e, principalmente, os adeptos do futebol não esquecem as relações tensas entre Rio autarca e o clube mais representativo da cidade.

"Ele diz que o PS vai perder, vamos ver. O Porto é que manda. E eu não esqueço que ele fechou a Câmara ao Porto campeão", retorquiu uma ferrenha, e minoritária, adepta do FC Porto no meio da arruada laranja que animou o penúltimo dia de campanha para as eleições de domingo.