Emigrantes queixam-se de dificuldades para votar e sentem-se ignorados
28-01-2022 - 08:00
 • Liliana Monteiro

Portugueses a residir no estrangeiro formam o "terceiro maior círculo eleitoral", mas sentem-se esquecidos pelos políticos e queixam-se de barreiras ao voto.

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São muitos os que nem chegam a ver o boletim para votar por Correio. Queixam-se da ausência de informação sobre a campanha e de estarem excluídos dos programas dos vários partidos. Querem continuar a poder ajudar a decidir sobre o futuro do país e pedem a revisão da fórmula eleitoral atribuída aos emigrantes.

São mais de um milhão e 500 mil recenseados por todo o mundo, saíram do país à procura de melhores condições de vida, mas muitos continuam a querer a ajudar a definir o rumo Portugal.

A comunidade portuguesa no estrangeiro tem capacidade de eleger quatro deputados, mas isso é esquecido muitas vezes, lamenta Rui Barata, um português, de 35 anos, a residir há mais de uma década em Estrasburgo.

“Somos mais de 900 mil na Europa e elegemos dois deputados, e somos mais de 600 mil no resto do mundo e elegemos dois deputados. O que não há noção em Portugal é que somos o terceiro maior círculo eleitoral em número de recenseados no país, logo a seguir à região metropolitana de Lisboa e do Porto. Infelizmente, continuamos com uma representação muito aquém.”

Como vota a comunidade portuguesa?

Este cartógrafo de profissão explica que há duas modalidades: ou se escolhe o voto por correspondência, e aí a carta chega a casa e depois cabe ao emigrante reenviá-la para Lisboa, ou manifesta a vontade de voto presencial na embaixada ou consulado, que pode ficar a centenas de quilómetros de distância do local de residência. “Quem vota presencialmente, vota no consulado e, ao final do dia, é enviada a contagem dos votos para Lisboa”.

É com tristeza que Rui Barata revela que a campanha não chega a cada um deles, dos que estão além-fronteiras portuguesas.

“A nós chega muito pouca informação. Não recebemos folhetos de campanha em casa por via postal, por email também não recebemos porque os partidos não têm os nossos dados, apenas o Estado tem. A Comunicação Social da diáspora vai tentando divulgar algumas informações. Se os partidos não fazem esforço para que se divulgue a democracia e se partilhe as suas ideias, os portugueses no estrangeiro como revés da moeda muitas vezes também não votam e abstêm-se”.

Voto difícil

Engane-se quem pense que votar fora de fronteiras portuguesas é fácil. Rui Barata diz ter conhecimento de vários casos, até de conselheiros das Comunidades Portuguesas em Paris que não receberam o voto porque os Correios franceses reenviaram o boletim para Portugal.

“Nesse caso temos de fazer uma participação à Comissão Nacional de Eleições (CNE) e esperar um segundo envio do boletim de voto, algo que é excecional e nem sempre é aceite”.

Acrescenta que o voto, muitas vezes, depende muito do funcionamento dos Correios de cada país e, por norma, quem vive na África do Sul, Brasil, Venezuela, Catar e Singapura sente sempre grandes dificuldades.

Mas os problemas não se ficam por aqui. Este jovem emigrante revela mais razões que deixam muitos portugueses de fora do ato democrático de votar. “Muitas vezes a morada do Cartão do Cidadão não está atualizada ou até pensavam que estavam recenseados e, por questões administrativas, deixaram de estar e ficam impedidos de votar e isso para nós é escandaloso!”

Por isso mesmo, Rui Barata, também ele membro do Conselho das Comunidades Portuguesas, considera que é preciso mudança, propostas há muito que têm sido dirigidas aos vários governos sem sucesso.

“Não percebemos porque é que não são os postos consulares a enviar, diretamente, os boletins de voto aos portugueses e que eles possam remeter os votos depois também ao consulado e o resultado assim chegar por mala diplomática a Lisboa. Isso resolveria o problema dos serviços de Correio.”

A pandemia poderá trazer ainda mais uma dificuldade na validação dos votos daqueles que não residem no nosso país. O voto por correspondência obriga ao envio de uma cópia do Cartão do Cidadão (noutro envelope que não o do voto) e o documento de identificação não pode estar fora de validade há mais de dois anos. “Em certos países, com toda esta situação pandémica, alguns portugueses podem ter o bilhete caducado sem terem tido hipótese de renovação”, sublinha Rui Barata.

Perante mais uma eleição pede-se no final uma reflexão e levantamento de todas as ocorrências que impediram a participação democrática dos portugueses emigrados para que num novo escrutínio tudo possa correr melhor.

Voto por correspondência até dia 29 de janeiro

Segundo o Ministério da Administração Interna, os eleitores que votam por via postal devem devolver a carta com o boletim de voto até ao dia 29 de janeiro.

Já os eleitores recenseados no estrangeiro que tenham optado pelo exercido voto presencial para a eleição da Assembleia da República devem dirigir-se a 29 ou 30 de janeiro às embaixadas e postos consulares.

A lista dos locais de voto no estrangeiro está disponível na página da Administração Eleitoral da Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna (consulte aqui o documento em formato PDF).

No dia 29, a votação decorrerá entre as 8h00 e as 19h00 locais em todos os continentes. No dia 30, o horário mantém-se em todos os locais à exceção do continente americano, onde a votação tem início às 08h00 e encerra entre as 12h00 e as 17h00, consoante o local.

O eleitor deve indicar o nome e entregar ao presidente da mesa o documento de identificação civil. Na falta de documento de identificação, o eleitor pode identificar-se por meio de qualquer outro documento oficial que contenha fotografia atualizada ou através de dois cidadãos eleitores que atestem, sob compromisso de honra, a sua identidade, ou, ainda, por reconhecimento unânime dos membros da mesa.