A palavra democracia é usada frequentemente com sentidos muito diferentes. Os países soviéticos consideravam-se “democracias populares”, apesar da chamada ditadura do proletariado (que, de facto, era a ditadura da oligarquia do regime, num Estado policial). A ditadura de Salazar auto-intitulava-se oficialmente “democracia orgânica e corporativa”. Etc.
Nas democracias representativas, que predominam na Europa, as liberdades cívicas e políticas são salvaguardadas pela lei. E aí existe uma clara separação entre o poder político e o poder judicial. É o que felizmente se passa em Portugal, por muitas críticas que mereça o poder político e o sistema judicial.
Assiste-se hoje a regressões democráticas, em particular quanto a essa separação de poderes. É o que acontece na Turquia e na Venezuela, por exemplo. Mais grave, também em Estados membros da UE o poder político está a interferir no poder judicial. Acontece na Hungria, uma “democracia iliberal”, segundo o seu primeiro-ministro. E está a acontecer na Polónia, onde agora governa um partido ultraconservador.
O Senado polaco, onde esse partido detém a maioria, aprovou três leis que subordinam o poder judicial ao governo e ao Presidente da República. Uma que pretende forçar os membros do Supremo Tribunal a demitirem-se, ficando apenas os aprovados pelo Presidente da República. A segunda daria ao Parlamento o controle do Conselho Judiciário Nacional, que nomeia os juízes. E a terceira dá ao ministro da Justiça poderes para nomear os juízes dos tribunais de direito comum.
Esta terceira lei foi ontem assinada pelo Presidente da República, que se opõe às outras duas. Tal oposição foi inesperada, porque o Presidente era membro do partido no poder na Polónia. Mas seja porque o Presidente Andrzej Duda é advogado de profissão, seja porque se realizaram inúmeras manifestações no país contra essas leis pouco democráticas, Duda colocou um travão nas intenções governamentais.
Pode ser que o Presidente Duda queira apenas introduzir alterações cosméticas nas duas leis que vetou. E deixou passar a terceira. Mas o que fez já é um primeiro passo no sentido de evitar atentados à democracia liberal na Polónia.
Entretanto a UE fez saber que, se a Polónia não respeitar a separação de poderes, poderá ser suspenso o seu voto no Conselho. Mas o facto de a UE pouco ter feito para travar a “democracia iliberal” na Hungria não permite colocar muitas esperanças naquela ameaça.