Da tuberculose à Covid-19, os benefícios da Serra da Estrela
18-09-2021 - 09:40
 • Maria João Costa

Este fim-de-semana várias iniciativas assinalam os 140 anos da primeira Expedição Científica à Serra da Estrela. Em 1881 procuravam-se os benefícios para a cura da tuberculose, hoje a Serra é procurada por quem quer respirar da pandemia.

Em agosto de 1881, um grupo de uma centena de especialistas explorou ao longo de 15 dias a Serra da Estrela. Tratou-se daquela que foi a primeira Expedição Científica aquele território, organizada então, pela “jovem” Sociedade de Geografia de Lisboa. Para recordar esta aventura histórica, este fim-de-semana decorrem várias visitas e um almoço que recupera um dos menus da Expedição de há 140 anos.

As iniciativas organizadas pelo município de Seia, a Sociedade de Geografia de Lisboa e a plataforma História, Territórios, Comunidades da Universidade Nova pretendem evocar a Expedição, mas também valorizar hoje aquele que é o ponto mais alto de Portugal continental, com toda a sua fauna e flora.

Helena Pinto, investigadora do História, Territórios e Comunidades e uma das organizadoras desta celebração, lembra que há 140 anos a Expedição foi um “projeto inovador”, num contexto onde a Sociedade de Geografia de Lisboa estava “ávida de conhecimento”. Então, a Serra da Estrela era “um território pouco conhecido” refere a investigadora ao programa Ensaio Geral da Renascença.

Há 140 anos, nesta expedição “a medicina tentava obter respostas na natureza, e nos prossupostos entre as áreas da botânica, da flora e da meteorologia, cruzar com os saberes da ciência médica para obter respostas para a cura da tuberculose.”

Na altura os expedicionários “fizeram uma recolha da vegetação e da flora presente na Serra da Estrela, em particular nas zonas mais elevadas”, explica ao Ensaio Geral o biólogo José Conde. Este investigador do Centro de Interpretação da Serra da Estrela acrescenta que a equipa que andou em 1881 no terreno também investigou a fauna daquele território.

“Algumas das espécies que então foram observadas, e recolhidas, mais tarde viriam a ser reconhecidas como espécies exclusivas da Serra da Estrela, ou como tendo no âmbito nacional uma circulação muito restrita”, destaque José Conde que conclui, “a Expedição contribuiu para um melhor conhecimento da Serra da Estrela e é um trabalho a que se tem de dar continuidade”.

140 anos celebrados com visitas e um almoço

Para marcar os 140 anos sobre a Expedição, este fim-de-semana decorre um programa que tem como “enfoque a afirmação dos grandes territórios sanatoriais de montanha”, explica Helena Pinto.

O percurso começa com uma visita à Estância de Montanha das Penhas Douradas e a revisitação de alguns dos locais mais emblemáticos da expedição de 1881. Helena Pinto explica que vão visitar “desde a Casa da Fraga até aos chalés”. Este último tipo de construção teve um papel importante no tratamento da tuberculose, tinham, refere a investigadora, “varandas de cura” e estavam “encostados a maciços rochosos que os protegiam dos ventos mais agrestes”. As varandas ficavam viradas para “um enclave de proteção, de uma paisagem que trazia benefícios da parte climatológica para a ginástica respiratória destes doentes”, explica Helena Pinto.

Ainda este sábado, depois de descer das Penhas Douradas, a visita vai seguir até às Termas de Manteigas, “hoje um estabelecimento termal moderno do Inatel” refere a investigadora. Numa parceria com o Inatel e a Escola Superior e de Hotelaria da Guarda, será servido um almoço que recupera o menu da Expedição e que “foi reinterpretado por três chefes”.

No domingo está prevista a visita “aquilo que é ainda o remanescente da Estância Sousa Martins” explica Helena Pinto que acompanhará a deslocação ao atual Parque da Saúde da Guarda.

Estas celebrações dos 140 anos terão mais tarde um outro momento, a 30 de setembro no Museu da Farmácia em Lisboa. Tal como então, hoje a Serra da Estrela é procurada por quem quer encontrar espaços ao ar livre para lidar com o momento de pandemia que se atravessa.

José Conde, biólogo do Centro de Interpretação da Serra da Estrela explica que “a existência na Serra da Estrela de vastas zonas selvagens e áreas de altitude de um enorme contraste climático” proporcionam ao visitante do século XXI passeios “num silêncio por vezes quase absoluto”, só interrompido “pelo canto, chilrear e crepitar do vento”.

Nas palavras deste biólogo, que fala dos benefícios da montanha, a Serra da Estrela tem por isso, hoje no contexto de pandemia “as condições para uma recuperação mental e sobretudo para nos encontrarmos connosco próprios”. “A montanha é um local pela sua singularidade, pelos seus contrastes climáticos, um local muito especial da nossa geografia”, aponta José Conde.