UE: as dificuldades de decidir
20-07-2020 - 10:10

A UE não parece capaz de ultrapassar as sucessivas dificuldades em que se encontra envolvida desde o fim da guerra fria. Com Angela Merkel em fim de carreira, não se vislumbra na Europa comunitária quem possa liderar as mudanças necessárias para reformar a UE.

É possível que do Conselho Europeu que decorre há quatro dias em Bruxelas saia finalmente um acordo. Provavelmente com muitos cortes no dinheiro que estava previsto para ajudar os países membros mais afetados pelos efeitos económicos e financeiros da pandemia.

Mas as dificuldades em atingir um consenso, tendo a longa cimeira de Bruxelas sido precedida de quase dois meses de conversas bilaterais entre os dirigentes dos 27, bem como entre estes e membros da Comissão Europeia, revelam uma situação preocupante na UE. Recorde-se que a proposta da Comissão Europeia, precedida por uma inovadora proposta franco-alemã, surgiu no fim de maio.

Em Bruxelas, à margem da cimeira, A. Costa disse aos jornalistas que há um sentimento de comunidade em vários Estados membros, mas que ele não se manifesta noutros. Talvez estivesse a pensar nos quatro “países frugais”, Holanda, Áustria, Dinamarca e Suécia, que se mostraram relutantes em contribuírem financeiramente para ajudar os países do Sul da Europa. Todos aqueles quatro países receberam, sem objeções, uma enorme ajuda financeira dos EUA, o Plano Marshall, três anos depois do fim da II guerra mundial (a Finlândia estava então muito próxima da União Soviética, que recusou a ajuda do Plano Marshall).

A UE não parece capaz de ultrapassar as sucessivas dificuldades em que se encontra envolvida desde o fim da guerra fria. Ou seja, desde o colapso do comunismo soviético. Este era uma ameaça e, por isso, promovia a unidade das democracias europeias. A saída do Reino Unido da UE marca um abalo sério ao “espírito de comunidade” na Europa. Simultaneamente, pela primeira vez desde a II guerra mundial, os EUA, com Trump, encaram negativamente a integração europeia.

Esta situação nova coloca aos países europeus a necessidade de investirem mais na sua própria defesa. A resposta dos Estados membros da UE tem sido lenta e insuficiente.

O problema da imigração perdura sem solução à vista há mais de cinco anos. Há Estados membros que não recebem um único imigrante ou um refugiado. E foi escandalosa a falta de solidariedade para com a Grécia e a Itália, destino da maior parte dos que atravessaram o Mediterrâneo à procura de acolhimento na Europa e não se afogaram.

Passou o tempo em que a perspetiva de entrar na UE promovia reformas democráticas nos antigos países satélites da URSS. Agora, a Hungria e a Polónia recebem alegremente fundos europeus, mas vão eliminando elementos fundamentais de uma democracia autêntica, como a independência do poder judicial. A UE condena essa deriva anti-democrática, mas não se mostra capaz de a ultrapassar. E o primeiro ministro da Hungria ainda veio para Bruxelas ameaçando impedir a aprovação de qualquer acordo onde houvesse uma referência ao Estado de direito.

Uma resposta séria à pandemia e aos seus brutais efeitos económicos e sociais parecia ser a oportunidade para relançar a UE. Essa oportunidade está agora mais longínqua.

E como Angela Merkel está em fim de carreira, não se vislumbra na Europa comunitária quem possa liderar as mudanças necessárias para reformar a UE ou para criar uma eventual alternativa, com os países que tenham realmente “espírito comunitário”.