Execução de comandos revela fraquezas das forças afegãs
13-07-2021 - 18:40
 • Filipe d'Avillez

Semanas depois de os americanos terem começado a retirar do Afeganistão, depois de 20 anos, as forças armadas locais dissolvem-se a olhos vistos, entre rendições, deserções e mortes.

Pelo menos 22 elementos das forças de elite do Afeganistão morreram num massacre levado a cabo na província de Faryab, segundo imagens reveladas esta terça-feira.

Os soldados tinham chegado horas antes à cidade de Dawlat Abad para tentar evitar a ocupação da mesma pelos taliban, mas rapidamente ficaram sem munições e os reforços e apoio aéreo pedidos nunca apareceram.

No vídeo, cuja autenticidade foi confirmada pela CNN, ouvem-se vozes a exortar os comandos a sair de um edifício cercado. Quando estes emergem, desarmados e com os braços no ar, os taliban abrem fogo, matando-os a sangue frio, apesar de apelos de alguns locais para que não o façam.

O assassinato destes militares terá acontecido em meados de junho, mas apenas foi confirmado agora e revela da pior forma o estado caótico em que se encontram as forças armadas afegãs, em clara dissolução apenas algumas semanas depois de os Estados Unidos terem dado início à saída do país, com efeitos a partir do início de maio e conclusão no final de agosto.

Segundo um artigo publicado no jornal britânico “The Guardian”, quando confrontados com a saída dos aliados americanos, 20 anos depois de estes terem ajudado a destronar o regime Taliban que protegia Osama Bin Laden na altura dos ataques do 11 de Setembro, vários estrategas afegãos exortaram o Presidente a mudar a estratégia de defesa, chamando o grosso das forças armadas para proteger os pontos mais sensíveis do país, incluindo estradas e grandes cidades, ainda que isso significasse abandonar vários postos mais distantes.

O Presidente Ghani, contudo, recusou estas propostas e disse que o Governo não abandonaria um centímetro de território. Contudo, segundo o “Guardian”, nem os mais pessimistas estavam à espera da rapidez com que milhares de soldados afegãos desertaram ou simplesmente fugiram dos seus postos, nalguns casos abandonando o país e permitindo aos taliban conquistar grandes quantidades de território, incluindo vários centros urbanos.

Em vídeos postos a circular nas redes sociais pelos taliban vêem-se muitos soldados afegãos a entregar as suas armas e equipamento a troco de dinheiro para poderem voltar a casa. A estratégia dos jihadistas tem como propósito desencorajar outros militares de resistir ao seu avanço.

Em muitos casos restavam apenas as forças de elite, como os 22 comandos de Dawlat Abad, mas apesar da sua excelente formação e experiência, estes nada podem fazer sem munições e sem apoio, como aconteceu no vídeo agora revelado.

Sem o apoio aéreo dos americanos os afegãos estão dependentes dos seus próprios aviões e helicópteros, mas estes são escassos para as necessidades e têm sido alvejados com particular cuidado pelos jihadistas que, em muitos casos, estão a ir ao ponto de assassinar pilotos, difíceis de substituir. Outra dúvida é se as empresas privadas encarregadas de fazer a manutenção dos aparelhos ficarão no país muito mais tempo, dada a insegurança crescente, já que o Afeganistão não tem engenheiros nem peças para poder fazer essa manutenção por si.

Face a esta situação, o Presidente Ghani já se viu forçado a pedir a senhores da guerra regionais que voltem a ativar as milícias que durante tantos anos tentou eliminar do panorama afegão. Estas milícias, cuja atividade é muitas vezes financiada pelo tráfico de droga, são depois difíceis de controlar e apresentam uma ameaça direta à autoridade do Governo central.

Vinte anos depois de ter chegado ao Afeganistão, Washington arrisca-se a ver todo o trabalho feito no país – acompanhado do sacrifício de mais de 2.300 militares americanos mortos e dezenas de milhares de feridos – evaporar-se no espaço de meses e o país dominado novamente pelos extremistas islâmicos.