A democracia recua em Israel
24-07-2018 - 06:49

Uma nova lei israelita dá passos no sentido antidemocrático, racista e teocrático. A minoria árabe passa a ser ainda mais discriminada.

Desde há dias, multiplicam-se as críticas a Israel. Infelizmente, no essencial, essas críticas são justas.

Há décadas que se diz, e é verdade, que em Israel vigora uma democracia, enquanto os seus eternos inimigos muçulmanos vivem, em regra, debaixo de ditaduras mais ou menos teocráticas - isto é, onde a religião não é separada da vida política e civil e das suas instituições. Aliás, os fundadores de Israel, há 70 anos, eram judeus seculares e democráticos.

Mas uma lei aprovada no parlamento israelita na semana passada veio manchar o carácter democrático do regime. Essa lei atribui aos judeus, e só a eles, o direito à autodeterminação. Ou seja, Israel é, agora, oficialmente um Estado judaico. “O Estado de Israel é o Estado-nação do povo judaico, no qual ele concretiza o seu natural, cultural, religioso e histórico direito à autodeterminação”, diz a lei. E passou a existir uma única língua oficial em Israel, a hebraica. A língua árabe deixou de ter esse estatuto.

Acontece que um quinto da população do país não é judaica, é árabe; e o seu número tende a aumentar. Ora, os cidadãos árabes de Israel, que já antes se queixavam de serem discriminados, passam com esta a lei a ser cidadãos de segunda classe, ou mesmo nem isso. É um passo no sentido de uma espécie de “apartheid”, por ironia quando se celebra o centenário do nascimento de Nelson Mandela.

Na definição legal do que é ser judeu, entra, como vimos, o fator religioso. Não será ainda uma teocracia nem um regime declaradamente racista - mas Israel aproxima-se perigosamente de vir a sê-lo.

Entretanto, aumenta a influência política dos judeus ultraortodoxos, alguns dos quais participam no governo de Netanyahu. Os quais reclamam, por exemplo, transportes públicos exclusivos para homens e outros apenas para mulheres - sem misturas.

A mesma lei considera que a multiplicação de colonatos judeus na Cisjordânia deve ser encorajada pelo governo. É o golpe de misericórdia na solução de paz envolvendo dois Estados, um israelita, outro palestiniano. Solução que Netanyahu há muito metera na gaveta.

Não se confunda, porém, o lamento face a este recuo democrático com qualquer manifestação de anti-semitismo. É exatamente o contrário.