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A 19 de junho de 1999, o Sporting Clube Campomaiorense, clube de uma vila com menos de 10 mil habitantes, mas empurrado pela força da Delta Cafés e do investimento de Rui Nabeiro, teve o momento mais alto da sua história, ao chegar à final da Taça de Portugal.
Numa final sem os habituais protagonistas, o Campomaiorense acabaria por perder frente ao Beira-Mar, por 1-0, momento marcante que coincidiu com o início do desvanecimento de um clube que, menos de três anos depois, fechou portas ao futebol sénior, mas deixou marca no futebol nacional e alentejano.
"Foi uma decisão do presidente [João Manuel Nabeiro, filho de Rui Nabeiro]. Acho que a final da Taça foi um momento marcante, tiveram alguns problemas internos que levou à decisão de não continuar com o futebol sénior. Temos de respeitar, não era o cenário que nós queríamos, mas o clube agora foca-se só na formação", explica o presidente da Associação de Futebol de Portalegre, Daniel Pina.
O clube foi despromovido da I Liga em 2000/01 e, depois de uma temporada tranquila no meio da tabela da II Liga, a decisão foi acabar com o futebol profissional no Estádio Capitão César Correia. Para trás ficam cinco temporadas ao mais alto nível.
O Campomaiorense ainda voltou a competir nos campeonatos distritais, mas atualmente foca-se exclusivamente no futebol de formação e outras modalidades, como judo, natação e ginástica.
"O investimento é caro e decidimos apostar só na formação. Para jogar no distrital, é preciso amor à camisola e gosto pelo clube. As pessoas queriam dinheiro e é por isso que muitos clubes do distrital estão a fechar. Foi por aí, o investimento foi focado na formação, que é o que faz mais sentido", assume Luís Maia, coordenador do clube.
Rui Nabeiro morreu no sábado, aos 91 anos. O fundador da Delta, empresa ligada ao ramo do café, conseguiu empurrar o clube da terra até aos maiores patamares do futebol português.
Luís Maia faz parte da estrutura do clube há 16 anos e é o atual coordenador. João Manuel Nabeiro, filho de Rui Nabeiro, continua a ser o presidente. A família financia todas as atividades do clube.
"O papel deles é a vida do clube. Sem eles, o clube não teria vida. A Delta Cafés é o único patrocinador do clube. O João Manuel Nabeiro é presidente há 35 anos. Há um legado muito grande que deixam ao Campomaiorense. Sem a família Nabeiro e a Delta Cafés, o Campomaiorense dificilmente existiria ou teria durado tantas épocas consecutivas", diz, à Renascença.
Vários jogadores e treinadores de renome chegaram a passar pelo clube alentejano. Isaías, que tinha sido campeão nacional no Benfica, Jimmy Floyd Hasselbaink, que viria a tornar-se lenda do Chelsea, Lito Vidigal, Paulo Torres e Carlos Martins vestiram a camisola do Campomaiorense.
Manuel Fernandes, João Alves, Carlos Manuel e Diamantino Miranda foram treinadores da equipa durante os anos de I Liga.
"As melhores memórias foram as épocas de várias subidas até à I Liga, as festas que fazíamos e no culminar com a final da Taça. O Campomaiorense deixou o seu legado no país e principalmente no Alentejo. Temos saudades, são tempos que dificilmente voltarão", assume Luís Maia.
Apesar do clube ter deixado o futebol sénior, a Delta continua a ser o único patrocinador do clube, com investimento considerável: "Temos uma estrutura muito grande e mantemos tudo praticamente vivo, como o estádio e os funcionários. Temos 200 miúdos no futebol, quase 100 jovens na ginástica, 80 na natação e entre 40 e 50 no judo. É tudo muito dispendioso e é a empresa Delta que suporta", explica o coordenador.
Rui Nabeiro é presidente honorário do Campomaiorense. Foi o filho que tomou as rédeas do clube, mas o pai sempre esteve ligado ao futebol.
"É sócio honorário da Associação de Futebol de Portalegre desde 1999 e eternizamos a Supertaça distrital de seniores com o nome dele. Durante todos estes anos ia ao jogo entregar a taça. Será a primeira vez que isso não vai acontecer, o que nos deixa tristes", revela Daniel Pina.
Época dourada do Alentejo dificilmente voltará
O Campomaiorense foi o último clube alentejano a disputar a primeira divisão portuguesa, pouco depois de o Elvas também ter passado pela elite. Foram os últimos clubes a colocar a região no mapa do futebol nacional.
"Foram momentos importantes para o distrito, que passa por imensas dificuldades. Era o clube de referência do Alto Alentejo, o clube que estava na primeira divisão e nos campeonatos profissionais. Mesmo que nem todos fossem adeptos, sendo alentejanos acabavam por se rever no Campomaiorense", diz o responsável pela associação.
São tempos que não voltarão, assume o dirigente: "Muito provavelmente, não. O tecido empresarial no interior é cada vez menor, o futebol mudou e funciona à base das SAD. Não é fácil aparecer quem queira investir. As dificuldades são cada vez maiores a todos os níveis. O despovoamento é grande, perdemos população de forma exponencial e isso faz com que investimento não seja atrativo na nossa região".
Certo é que "é muito difícil" que a família Nabeiro volte a investir num projeto de futebol sénior, concordam Daniel Pina e Luís Maia.
"Antigamente, os miúdos ficavam na terra e trabalhavam na fábrica. Hoje eles vão todos estudar. Dos 12 juniores de segundo ano da época passada, que seriam a base de uma equipa sénior, foram todos tirar um curso superior e saíram de Campo Maior. Fica difícil. Queremos é dar-lhes uma boa base, a nível desportivo e pessoal. É esse o nosso objetivo", assume Luís Mata, coordenador do clube.
Longe dos holofotes da primeira divisão e de investimentos de maior escala do grupo formado por Rui Nabeiro, o Campomaiorense vai continuar a focar-se "nas crianças da nossa terra, sem megalomanias".