Novo aeroporto. "Estamos nas mãos da ANA"
08-12-2023 - 06:30
 • Sandra Afonso (Renascença) e Marta Moitinho Oliveira (Público)

A coordenadora da Comissão Técnica Independente, que avaliou a melhor localização para o futuro aeroporto de Lisboa, avisa que, sem acordo com a ANA Aeroportos, a obra vai demorar mais a arrancar. Em entrevista à Renascença e ao Público, Rosário Partidário defende a renegociação do contrato de concessão e a retirada urgente da gestão das taxas aeroportuárias à ANA.

“Estamos nas mãos da ANA”, afirma a coordenadora da Comissão Técnica Independente (CTI), Maria do Rosário Partidário, sobre o novo aeroporto de Lisboa.

Em entrevista ao programa Hora da Verdade, da Renascença e do jornal "Público", Rosário Partidário defende a renegociação do contrato de concessão com a ANA - Aeroportos de Portugal e, de imediato, a passagem da gestão das taxas aeroportuárias do concessionário para o regulador, a Autoridade Nacional de Aviação Civil (ANAC).


Sobre os valores envolvidos, a Comissão Técnica explica que o aeroporto se paga a ele próprio, e que não será necessário o contributo do Estado. No entanto, em Vendas Novas há expropriações a fazer, em Alcochete é preciso compensar a Força Aérea por causa do campo de tiro. Quem é que vai pagar estas contas? É o Estado?

Sim. Só que, no cômputo geral, a 50 anos de operação, estimamos 12 anos para começar a gerar receita. Neste período, o aeroporto gera receita que paga os investimentos. Não estamos a falar no dia x em que se decide que se vai construir aquele aeroporto, vai ter que se pagar oito mil milhões de euros.

Então o Estado tem que entrar com o dinheiro?
Isso já não consigo [dizer].

Qual é que é o modelo para financiar esse investimento?
Não sei se será o Estado, se é o promotor. Se a ANA diz que tem disponibilidade para fazer o Montijo, se calhar tem disponibilidade para começar a fazer Alcochete. É a mesma disponibilidade. E com isso começar a gerar receita. Estou eu a sugerir, mas eu não sou especialista nessa área e nós não tivemos esse mandato. E isso decorre depois das decisões políticas que vierem a ser feitas. Mas não me parece impossível. Em vez de investir no Montijo, investe no Campo de Tiro de Alcochete. Além de que o Aeroporto Humberto Delgado (AHD) é muito muito rentável. Há ali uma fortíssima fonte de financiamento, se houver interesse em usá-la.

Pegando na disponibilidade da ANA, se não houver acordo entre o Estado e a ANA, que tem a concessão, qual é que é a solução para Portugal poder construir um novo aeroporto?
De facto, a pergunta feita dessa maneira mostra mesmo que estamos nas mãos da ANA.

É o que parece…
Parece, não é? Parece e é. O Governo tem que analisar o contrato e ver. E a ANA tem de refletir também. Porque a ANA tem uma atividade que é muito rentável. Não acredito que a queira dispensar e ainda vai ter 20 anos, 15 anos pela frente, com o AHD a funcionar. Imagino que a Ana não vai querer prescindir do AHD. Se o Estado disser que não quer a opção da ANA e que quer a opção para o que vier a decidir, dentro do contrato de concessão, isso significa passar da opção do concessionário para a opção do concedente. E depois é uma questão de negociação.

Abertura de um novo concurso internacional…

Depende da ANA. Se não chegarem a acordo, resolverem o contrato, tem que haver outro concurso para abrir uma nova concessão.

Mas vai atrasar todo o processo…

Claro. O contrato de concessão condiciona a decisão.

A Comissão Técnica Independente recomendou a passagem das taxas aeroportuárias para o regulador, a Autoridade Nacional de Aviação Civil (ANAC). Esta transição deve acontecer desde já?
O mais cedo possível. Isso é fundamental.

E qual seria o impacto?
Nomeadamente do ponto de vista de regular de facto as taxas. Neste momento o Estado não tem controle sobre as taxas e a ANA decide sozinha sobre as taxas.

Poderia inclusive baixar o valor das taxas?
Poderia baixar o valor das taxas. É evidente que as taxas são uma das fontes de rendimento das receitas reguladas. As receitas reguladas ninguém as conhece, porque a ANA não revela esses valores, uma vez que está cotada em bolsa e, portanto, não partilha esses valores. Há várias coisas que se deviam mudar no contrato de concessão. A questão da decisão sobre as taxas é uma delas.

Que outras coisas deveriam mudar no contrato de concessão?
Nomeadamente o equilíbrio entre as partes, que está muito desequilibrado.

E esta não poderia ser uma oportunidade para fazer isto?
Claro. Mas é preciso que o Estado saiba o que quer e faça o seu papel.