Foi já na Faculdade de Direito, onde procurou e não encontrou a infalibilidade das leis, que João Taborda da Gama começou a ler a Bíblia, uma versão em inglês que tinha lá em casa. E por aí começou o processo conversão deste especialista em Direito Fiscal que também é comentador e que em Novembro fez parte do Governo por três semanas. Um processo de conversão que que demorou alguns anos, que o levou a encontrar o seu lugar na Igreja Católica e que contou no último Conversas sobre Deus, que teve lugar esta semana na Capela do Rato, em Lisboa.
Nascido em 1977, filho do socialista Jaime Gama, ex-ministro e ex-presidente da Assembleia da República, e da professora Alda Taborda, João tinha em casa uma “atitude neutra” em relação a Deus. Filho único, criado no Lumiar, tem “poucas lembranças de reflectir sobre a existência de Deus na infância e adolescência”. Como contou na conversa com Maria João Avillez, não foi baptizado em bebé, mas os pais ainda “fizeram alguns esforços” e um deles foi inscrevê-lo na catequese, de onde foi expulso com um primo por apresentarem uma versão pouco canónica da Avé Maria.
“Não me apareceu Jesus Cristo de cachecol do Sporting, nem uma luz ou um trovão”, gracejou na noite de quarta-feira. Aos 21, 22 anos começou a ler a Bíblia. “Aquilo que li, sobretudo no Novo Testamento - as parábolas e os desafios de Jesus - começou a fazer cada vez mais sentido”, contou João Taborda da Gama. Depois, começou a sentir necessidade de aprofundar o conhecimento cultural e histórico, começou a interessar-se pela pessoa histórica e política de Jesus.
“Às tantas, esse processo interior começou a ser racionalizado” e teve uma pessoa – “há sempre uma pessoa nestas histórias” – que o ajudou no caminho que, rapidamente, percebeu que o levaria à Igreja. “Muito cedo, no meu processo de conversão, percebi que não seria só um processo interno da minha relação com Deus. A dúvida era: ‘eu não conheço a Igreja, será que a Igreja tem lugar para mim’”, recordou, definindo o seu percurso como “muito sereno”.
Depois, começou “a ter necessidade de ir à missa, de ver mais”, mas ainda às escondidas. “A pessoa não percebe muito, está sempre com medo de ser apanhado”, contou João Taborda que, nesta fase, não contava aos amigos o que se estava a passar consigo. Mas, continuou: “Há um momento em que saio do armário e tenho de entrar na sala e na sala ninguém me conhece.” E ai descobre que a Igreja tem lugar para toda a gente e, portanto, também tem lugar para ele e “isso é uma ideia muito libertadora e revolucionária”.
Também libertador foi a aceitar que nem tudo é racionalizável. “A fase mais libertadora e de verdadeira conversão foi perceber que a racionalidade não vai explicar tudo e que essa não explicação não é obscurantista, mas é iluminadora e libertadora”, afirmou Taborda da Gama, que também contou que “Deus é esperto” e o deixou achar que tinha o domínio o processo até chegar o momento em que percebeu que não tinha e não se importou com isso.
“Sinto que fui ter com Ele, mas se acreditar em Deus que sabe tudo e vem ao nosso encontro foi ele que veio ter comigo”, disse o advogado que procurou no Direito a infalibilidade das leis, mas que, no momento em que percebeu a falibilidade da justiça humana, foi atraído pela ideia de “uma outra justiça”.
Em 2005 foi baptizado e encontrou na espiritualidade inaciana (de Santo Inácio de Loyola, fundador da Companhia de Jesus) o seu lugar de referência. Faz parte de uma CVX (comunidade de vida cristã), tenta “ver Deus em todas as cosias e todas as coisas em Deus” e que “ Deus seja algo do dia-a-dia”. E acha que o que Deus hoje lhe pede é “mais tranquilidade”: “Que me preocupe mais em como é que Ele me vai encontrar do que em como o vou encontrar.”
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