Cavaco defende referendo porque “eutanásia é a decisão mais grave” que o Parlamento pode tomar
12-02-2020 - 07:25
 • Eunice Lourenço

Ex-Presidente considera que legalização da morte assistida será um “grave erro moral” pelo qual os deputados devem ser penalizados.

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Aníbal Cavaco Silva, ex-Presidente da República, junta-se às vozes que pedem um referendo caso a legalização da eutanásia seja aprovada no Parlamento. Numa declaração à Renascença, o antigo chefe de Estado é duro nas palavras e considera que a opção pela eutanásia é um “grave erro moral” e decisão mais grave que os deputados podem tomar,

“Considero a legalização da eutanásia a decisão mais grave para o futuro da nossa sociedade que a Assembleia da República pode tomar. É abrir uma porta a abusos na questão da vida ou da morte de consequências assustadoras”, diz Cavaco Silva, que aponta diretamente aos deputados em vésperas de uma reunião do grupo parlamentar do PSD, onde o assunto deverá ser discutido.

“Os deputados não podem tratar com leviandade o bem mais precioso de cada indivíduo, a VIDA. Não procurem enganar os portugueses dizendo que é uma questão de consciência. É sim, um retrocesso no nosso sistema de valores”, afirma o ex-Presidente, que adianta mesmo que se o referendo for recusado “os portugueses que defendem o primado da vida humana devem registar o nome daqueles que, na Assembleia da República, votaram a favor da eutanásia” porque “para o futuro, é importante não esquecer quem são os responsáveis por tão grave erro moral”.

O debate dos projetos de lei para a legalização da eutanásia está marcado para dia 20. Em maio de 2018, a medida foi recusada por apenas cinco votos de diferença, mas desde logo o Bloco de Esquerda anunciou que voltaria a tentar na nova legislatura. Além do projeto de lei do Bloco, há projetos do PS, PEV e PAN e o Iniciativa Liberal também anunciou que terá projeto de lei nesse sentido, como, aliás, fazia parte do seu programa eleitoral.

“Em maio de 2018 foram derrotados na Assembleia da República os partidos que querem fazer de Portugal um dos pouquíssimos países do mundo em que a lei permite a eutanásia, isto é, que um médico possa provocar a morte a outra pessoa. Apesar de derrotados há menos de dois anos, esses partidos insistem agora em aprovar a despenalização da eutanásia, apenas três meses após o início da nova legislatura”, começa por lembrar Cavaco Silva, nesta declaração.

“Podiam dar prioridade ao combate à pobreza, ao desenvolvimento da rede de cuidados paliativos, ao combate à corrupção, a tirar Portugal da cauda da União Europeia em matéria de desenvolvimento. Mas não. Para esses partidos a prioridade é autorizar por lei que um médico possa matar outra pessoa”, continua o ex-Presidente, que também refere que a eutanásia só é legal em sete países no mundo, quatro dos quais na Europa.

“Nos pouquíssimos países do mundo em que a eutanásia é legal têm vindo a aumentar as denúncias da prática da morte sem o consentimento explícito da própria pessoa”, afirma Cavaco, para quem “não há razão que justifique que alguns partidos queiram forçar Portugal a ir contra a situação vigente na quase totalidade dos países do mundo e legalizar a eutanásia”.

Por tudo isto, o ex-Presidente defende que “o mínimo que a Assembleia da República deve fazer é perguntar diretamente aos portugueses, através de um referendo, se concordam ou não que continue a ser um crime um médico provocar a morte de outra pessoa”.

“Estando em causa a questão da vida ou da morte, apelo a todos a que lutem para que a Assembleia da República ouça a voz do Povo através da realização de um referendo. É uma decisão tão grave que deve ser amplamente discutida e explicada antes de ser decidida”, conclui Cavaco Silva.

A proposta de um referendo à legalização da eutanásia está a ser promovida pela Federação Portuguesa pela Vida. O objetivo é recolher 60 mil assinaturas para propor ao Parlamento um referendo de iniciativa popular. Uma vez conseguidas as assinaturas, essas só forçam o Parlamento a discutir a proposta, ou seja, para que o referendo se realize é preciso que seja aprovado no Parlamento e a pergunta a fazer seja aprovada pelo Tribunal Constitucional.

Nenhum partido, por enquanto, se comprometeu com a aprovação do referendo, mas, no fim-de-semana passado, o Congresso do PSD aprovou uma moção que vincula o partido e o seu grupo parlamentar à defesa do referendo. Quanto às propostas de lei que vão a discussão no dia 20, o PSD dará “liberdade total” de voto aos seus deputados, como anunciou o presidente do partido, Rui Rio, logo no dia em que o debate foi marcado.

Rui Rio, que é também líder parlamentar, é favorável à legalização da eutanásia, sendo mesmo um dos subscritores do manifesto de 2016, que deu início ao processo legislativo que culminou com a rejeição da eutanásia em maio de 2018. Segundo informações recolhidas pela Renascença, o atual grupo parlamentar do PSD será maioritariamente contra, havendo cerca de um terço dos deputados que poderá votar a favor ou que ainda estão indecisos.

Este será um dos assuntos desta quinta-feira do grupo parlamentar, que em princípio será a única antes do debate de dia 20.