Covid-19. Preço das máscaras é um problema nos bairros pobres
01-06-2020 - 17:08
 • João Carlos Malta

O alerta é dado pelo presidente da União das Misericórdias. Manuel Lemos afirma que há um trabalho fundamental de comunicação e pedagogia direcionado para a importância da máscara, nos meios mais desfavorecidos, que ainda não foi feito.

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O presidente da União das Misericórdias, Manuel Lemos, garante que os problemas económicos nos bairros mais carenciados impedem que muitos acedam às máscaras. A falta de equipamento de proteção individual pode ser um fator adicional para que Lisboa, e os concelhos limítrofes, se tenham tornado o novo foco da Covid-19 em Portugal. É nesta região que se têm concentrado mais de 90% dos casos nos últimos dias.

O mesmo responsável diz que, no terreno, muitos falam do valor que têm de despender por aquele equipamento de proteção individual como um motivo que dificulta a aquisição. “Referem o preço, com certeza, é sempre referido pelas pessoas”, diz à Renascença, o presidente da União das Misericórdias.

Manuel Lemos explica depois que, “embora haja muitas máscaras sociais”, as mesmas “representam um pouco no orçamento dos agregados familiares”. “E as famílias que vivem na margem da linha de água, qualquer encargo suplementar é muito complicado para eles”, sublinha.

A Renascença contatou o Ministério do Trabalho e da Comunicação Social para perceber se há alguma ação para que os mais pobres tenham acesso a máscaras caso não tenham possibilidade financeiras para a aquisição, mas não obteve resposta.

Já a meio do mês de maio, a Escola Nacional de Saúde Pública havia publicado um estudo segundo o qual quem ganha menos está exposto ao risco de contágio da pandemia.

O estudo mostra que 60% dos inquiridos sentem dificuldades na aquisição de máscaras, mas “são as pessoas com menor rendimento que têm mais dificuldades na compra deste material”.

“Uma em cada duas pessoas, que ganhe menos de 650 euros, sente dificuldades na aquisição de máscaras de proteção”, explicou à Renascença coordenadora do estudo, Sónia Dias.

Também são as pessoas com rendimentos mais baixos que “mais têm de se deslocar para o local de trabalho”, acrescenta.

Dados que, para a investigadora, são “preocupantes” e revelam “diferenças na exposição ao risco” de contágio.

“Tomando como referência os que ganham 650 euros, percebemos que metade têm de se deslocar para o seu trabalho, enquanto, que nas pessoas com rendimentos superiores a 2.500 euros por agregado familiar, verificamos que 75% estão em teletrabalho”, conclui.

Fartinhas do confinamento

O presidente da União das Misericórdias, Manuel Lemos, diz que “as pessoas cumpriram muito bem o confinamento, mas estavam muito fartinhas do confinamento”. Por isso, quando o Estado levantou as restrições “as pessoas conviver uma com as outras”.

“Naturalmente nos sítios mais pobres, onde há menos máscaras, menos distanciamento entre as pessoas faz-nos sentido que isto aconteça. Mas é sempre lamentável que tenha acontecido”, avança Manuel Lemos. E acrescenta que espera que o Estado “seja capaz de debelar essa crise muito rapidamente”.

“É importante por causa da nossa economia”, remata Manuel Lemos.

Apesar de avisar que ainda não foi feito um estudo sobre o tema, esta é a ideia que emerge do contato com as pessoas, à qual soma uma outra: há muito trabalho a fazer no campo da informação e pedagogia.

“Talvez ainda não tenha sido muito bem explicada a importância da máscara, nós comportamo-nos com padrões de comunicação médios e para chegar a estas pessoas não basta a televisão e a rádio. Temos de encontrar fórmulas novas para explicar os riscos de não usar máscara”, sublinha.

A máscara, na opinião do presidente da União das Misericórdias, é fundamental porque: se “eu usar protejo o outro”, e se “o outro usar protege-me a mim”. “Há uma ideia de comunidade e solidariedade”, crê.

Nos bairros mais pobres essa solidariedade existe em grande escala, segundo Manuel Lemos, mas “tem de ser explicada a importância da máscara”, senão a mesma não é percecionada.

O responsável diz que, neste momento, as misericórdias não estão a fazer distribuição de máscaras, mas já o fizeram no passado através da doação de um milhão de unidades que vieram da Misericórdia de Macau, e de protocolos com empresas privadas e com o Estado.