​Governo aprova o direito real de habitação duradoura. O que é?
05-09-2019 - 17:03
 • Sandra Afonso

Com este decreto-lei, as famílias têm “uma solução habitacional estável por um período vitalício”, refere o Ministério das Infraestruturas e da Habitação, em comunicado. Na prática, podem garantir a casa pelo pagamento ao proprietário de uma caução e de uma contrapartida mensal, enquanto durar o contrato. O diploma já tinha passado em Conselho de Ministros, faltava o decreto-lei, agora aprovado.

O que é o Direito de Habitação Duradoura (DHD)?

É o direito de residência de forma permanente e vitalícia numa habitação, mediante o pagamento ao proprietário de uma caução inicial e de uma prestação mensal. É uma alternativa às soluções de aquisição de habitação própria ou de arrendamento habitacional.

Qual é a duração?

O morador tem o direito de residir toda a vida na habitação, mas pode renunciar livremente a qualquer momento, sendo-lhe devolvida a totalidade ou parte da caução paga ao proprietário.

Quem pode constituir um DHD?

Qualquer pessoa, singular ou coletiva, pública ou privada, proprietária de uma habitação, desde que o imóvel esteja livre de encargos e ónus (nomeadamente, de uma hipoteca) e seja entregue ao morador com um nível de conservação, no mínimo, médio. Qualquer pessoa, ou conjunto de pessoas singulares, pode constituir-se como morador.

Como é constituído o DHD?

Através de um contrato, celebrado por escritura pública ou por documento particular, com assinaturas das partes presencialmente reconhecidas. O DHD está sujeito a inscrição no registo predial, a requerer pelo morador no prazo de 30 dias a contar da data de celebração do contrato.

Como é pago o DHD?

O morador paga ao proprietário uma caução inicial - que lhe pode ser devolvida, em parte ou na totalidade, se renunciar ao DHD durante os primeiros 30 anos de residência na habitação - e uma prestação mensal.

O valor da caução é acordado entre o morador e o proprietário, mas tem obrigatoriamente que ser entre 10% e 20% do valor mediano de venda de mercado da habitação, de acordo com a localização e dimensão. O valor mediano é calculado com base no indicador de preço de venda por m2 divulgado pelo INE.

Nos primeiros 10 anos do contrato, o morador tem direito à devolução da totalidade da caução, caso decida renunciar ao DHD. A partir do 11º ano de vigência, e até ao 30º ano, é deduzido anualmente o montante de 5% da caução, como forma de pagamento ao proprietário. Passados 30 anos, a totalidade da caução terá sido paga ao proprietário. Em qualquer momento, entre o 11º e o 30º ano de vigência do DHD, o morador pode renunciar, com direito ao saldo restante da caução.

Se existirem dívidas, decorrentes do não cumprimento pelo morador das suas obrigações, o proprietário pode deduzi-las do saldo da caução, em qualquer caso de extinção do contrato.

O valor da prestação mensal a pagar ao proprietário é estabelecida livremente entre as duas partes.

Quais as vantagens para o proprietário?

Rentabilidade estável e segura, uma vez que a caução neutraliza o risco de não pagamento das contrapartidas devidas ou de não realização das obras que deve efetuar;

Redução significativa do custo da gestão do património edificado, pois é o morador que tem a seu cargo a realização das obras de conservação ordinária e o pagamento das despesas relativas às mesmas, às taxas municipais e ao IMI;

Possibilidade de gerir e rentabilizar o capital correspondente à caução paga pelo morador;

Direito de reaver a habitação em estado de conservação, no mínimo, médio, em caso de extinção do direito. Quando forem necessárias obras, as despesas podem ser deduzidas na caução a devolver ao morador.

Que vantagens tem o morador?

Direito vitalício a residir numa habitação, que só pode ser extinto por vontade do morador ou incumprimento definitivo do contrato;

Muito menor necessidade de investimento (e endividamento) em comparação com a aquisição de casa própria;

Solução alternativa, quando a aquisição com recurso a crédito não é possível ou desejável;

Solução para os proprietários ocupantes que desejem vender a sua habitação sem comprometer o acesso a uma nova solução habitacional em condições de estabilidade: podem reinvestir apenas uma pequena parte do valor de venda numa nova habitação e libertar o restante para o orçamento familiar ou reinvestir;

Direito à devolução, total ou parcial, da caução, caso opte por renunciar nos primeiros 30 anos.

Possibilidade de hipotecar o DHD se precisar de contratar crédito para pagar a caução.

Quais são as obrigações do proprietário e do morador?

Cabe ao proprietário:

- Entregar a habitação em estado de conservação, no mínimo, médio;

- Pagar obras e outros encargos relativos às partes comuns do prédio e, em caso de condomínio, pagar quotizações e demais obrigações;

- Garantir os seguros legalmente obrigatórios;

- Realizar e suportar as obras de conservação extraordinária na habitação (salvo anomalias que resultem de atos ilícitos e ou do não cumprimento de obrigações do morador);

- Gerir a caução e, com a extinção do DHD, assegurar a devolução ao morador do saldo devido.

Cabe ao morador:

- Utilizar a habitação exclusivamente para residência permanente;

- Pagar as taxas municipais e o Imposto Municipal sobre Imóveis;

- Realizar e suportar o custo das obras de conservação ordinária na habitação e da avaliação do estado de conservação, a cada 8 anos. Quando o nível de conservação da habitação, resultante desta avaliação, for inferior a médio, e a avaliação demonstre que as anomalias resultam da ausência de obras de conservação ordinária, cabe ao morador realizá-las e confirmar o nível médio de conservação com nova avaliação;

- Consentir ao proprietário a realização das obras de conservação extraordinária, a que este está obrigado, e informá-lo logo que tenha conhecimento de anomalias na habitação cuja reparação seja obrigação do proprietário.

Em que condições pode o DHD ser extinto?

Por renúncia do morador, com a morte do morador (se for constituído a favor de mais do que uma pessoa, com a morte do último deles) ou por incumprimento definitivo de qualquer uma das partes.

Constituem causa de incumprimento definitivo

O não pagamento de montantes devidos pelo morador ou pelo proprietário, uma vez ultrapassados os prazos estabelecidos;

Reincidência de atraso no pagamento de montantes devidos pelo morador - três, quatro ou cinco vezes (seguidas ou interpoladas) consoante o contrato vigore respetivamente há menos de 15 anos, há mais de 15 e menos de 30 anos ou há mais de 30 anos.

O morador pode renunciar livremente ao DHD em qualquer momento, com uma antecedência mínima de 90 dias em relação à data de entrega da habitação.

Um morador pode dar o DHD como garantia bancária num crédito para pagar a caução?

Sim. O DHD só pode ser hipotecado pelo morador para garantir crédito que lhe seja concedido para pagar, no todo ou em parte, o valor da caução. O cancelamento da hipoteca, na sequência da renúncia do morador, tem sempre de ser autorizada pelo credor hipotecário. Se o morador adquirir a propriedade do imóvel, sobre o qual foi constituído o DHD, a hipoteca transfere-se para a propriedade.

O que acontece se existir uma hipoteca sobre o DHD e o morador deixar de cumprir as suas obrigações junto do banco?

O banco pode executar a hipoteca. Neste caso, o proprietário tem opção de compra deste direito e pode utilizar o saldo da caução existente à data. Se o proprietário não exercer a opção de compra, o DHD pode ser vendido pelo banco, para pagar o valor em dívida. Quem comprar o DHD, tem direito a residir na habitação até que passem 30 anos desde a data de constituição do DHD.

Uma habitação com um DHD constituído pode ser vendida?

Sim, o proprietário pode transmitir livremente a terceiros a sua propriedade. Neste caso o DHD mantém-se.

O DHD pode passar de pais para filhos?

Não. Um DHD só pode ser transmitido quando a hipoteca contraída pelo morador é executada, como garantia do crédito para pagar, no todo ou em parte, o valor da caução.