Rui Rio e a lógica do ninho
15-01-2019 - 16:13

Claro que não é a ótica da descentralização que preside à marcação do local onde terá lugar o Conselho Nacional extraordinário do PSD, na próxima quinta-feira. É a estrita lógica do ninho. Rio dá a ideia de que, se um dia for primeiro-ministro, vai querer mudar o Terreiro do Paço para a avenida dos Aliados.

Desafiado, Rui Rio preferiu “não abandonar a sua zona de conforto”, mostrando que também aí não segue a linha nem os conselhos de Passos Coelho. A resposta a Luís Montenegro será dada no Porto, na próxima quinta-feira, às 17 horas, o que dificulta a vida a muitos membros do Conselho Nacional do PSD que, longe dali, têm obrigações profissionais e políticas nessa tarde.

Dir-se-á: mas que mal tem ser no Porto, se a deslocação para Lisboa também teria de ser feita por uma série de conselheiros do Norte? A justificação não colhe. Lisboa, além da sede do poder, encontra-se geograficamente no centro do país, a meio caminho entre Porto e Faro. Rio parece desconhecer toda essa imensa parte do país que vai de Setúbal ao Algarve.

Claro que não é a ótica da descentralização que preside à marcação do lugar. É a estrita lógica do ninho. Rio dá a ideia de que, se um dia for primeiro-ministro, vai querer mudar o Terreiro do Paço para a avenida dos Aliados. Só porque fica ali mais à mão e, parecendo que não, dá para ir a pé.

Mesmo para analistas que, como eu, embora de Lisboa são provavelmente os últimos defensores da regionalização, não há forma de compreender esta obsessão nortista. Tão típica, aliás, de alguns outros que nasceram nas mesmas margens do Douro. Um tique que faz com que Coimbra já lhes pareça o “estrangeiro”.

A incapacidade de Rio para galgar essa pequena margem, a única onde se sente em casa, é provavelmente uma das grandes barreiras à sua projeção nacional. Santana foi autarca na Figueira da Foz, cargo que usou como trampolim para se candidatar a voos mais altos. Rio foi autarca no Porto, mas essa experiência (apesar do seu sucesso) parece virar-se contra ele a cada passo. Como se aí se esgotasse todo o seu currículo, toda a sua estratégia e todo o seu apoio.

Está sempre num permanente regresso à origem, e vale a pena lembrar que, mesmo no Porto, parecia querer distância da sua própria cidade. Governava contra os seus teatros, os seus clubes, as suas elites, a sua gente. Isso colocava-o ao abrigo das máfias da influência, mas erguia uma enorme barreira entre ele e o seu povo, ou, pelo menos, entre ele e as suas elites.

A resposta aos jornalistas dada em alemão não foi apenas uma infelicidade. Foi uma demonstração de quem prefere “estrangeirar-se” a ter de dar troco a pessoas que vê com a sobranceria própria de quem nunca reconhece aos outros a capacidade para o igualar. Rio é, porventura, infinitamente melhor do que parece ser. Aliás, não se deixa conhecer. Mas a verdade é que resta avaliá-lo com aquilo que vemos e sabemos.

Admito que esteja até melhor preparado para o cargo de primeiro-ministro do que Montenegro. Tão ou mais calculista, certamente ainda mais ambicioso, apesar da sua simpatia e comunicabilidade transbordante.

Mas se Rio responde a Montenegro reduzindo-o à sua real insignificância (em 20 minutos de discurso não se ouviu uma ideia que não se resumisse a reduzir o seu próprio partido à irrelevância total), a verdade é que nunca sairá reforçado do confronto.

Sem eleições diretas, o atual líder trava também o caminho a quem não aposta em golpes de Estado, e evita confrontar-se e debater com todos os seus outros contestatários. E são mesmo muitos. Gente como Miguel Morgado - preparados, cultos, com ideias fortes e estratégias claras. Mais à direita, sem dúvida, mas que durante quatro anos deram o corpo e a cara às balas nos difíceis tempos de Passos Coelho e da “troika”, enquanto Rio espreitava a sua oportunidade, sempre adiada com calculismo.

Num PSD que não parece social-democrata, até por isso valeria a pena ir a jogo antes de este partido (só norte e sem Norte) chocar contra a parede com a qual Rio parece querer esbarrar, sem sequer tentar procurar minorar o embate.

Na quinta-feira às 17 horas, quantos estarão no Porto dos 136 potenciais conselheiros nacionais para votar a moção de confiança? Arriscaria dizer, embora espere enganar-me, que apenas os de sempre. Quem vive ali à beira, nas distritais afetas ao líder (a começar em Braga …) ou talvez quem não tenha mais nada para fazer. E não venham dizer que isso se aplica a Lisboa, onde no mesmo dia decorre o Conselho de Estado e deveria haver trabalho parlamentar no plenário.

Se não aparecerem os críticos, que imagem vai passar para o exterior do maior partido da oposição? A do PSD conformado e reformado, feliz com os seus militantes “nem-nens”? Umas tantas e estimáveis cabeças grisalhas e uma série de jovens turcos que nem estudam, nem trabalham, nem se interessam, ou nem lá vão?