Que prioridades para Portugal na Europa nos próximos quatro anos?
26-09-2015 - 02:25

O desafio foi lançado pela Renascença ao antigo primeiro-ministro Pedro Santana Lopes e ao ex-comissário europeu António Vitorino. Os comentadores do programa "Fora da Caixa" avançam uma lista de temas europeus de interesse nacional, à atenção do próximo primeiro-ministro.

O que interessa à Europa também interessa a Portugal. António Vitorino defende que o crescimento económico e a criação de emprego constituem "o problema central do futuro europeu, da legitimidade do projecto europeu, tanto para portugueses para qualquer outro povo".

Nos temas que são especialmente importantes para Portugal, o antigo comissário europeu elenca três questões fundamentais.

"A questão da liberdade de circulação de trabalhadores, um ponto muito sensível que está sob ataque. A liberdade no espaço Schengen que,com este dominó de reinstauração de controlos fronteiriços, está objectivamente debaixo de mira. E uma terceira questão que, não sendo especificamente portuguesa, interessa particularmente a Portugal: completar a construção da arquitectura institucional da União Económica e Monetária", defende António Vitorino no programa "Fora da Caixa", o debate semanal de temas europeus na Renascença.

O antigo primeiro-ministro Pedro Santana Lopes junta a esses temas mais uma mão cheia de prioridades portuguesa na frente europeia.

"O dossier sobre as reformas das instituições e dos tratados interessa a todos os europeus. A questão energética, com o acesso a mercados seguros. Não deixaria de fora as pescas e a agricultura, com as quotas pesqueiras e os subsídios a determinados sectores. No plano externo, as relações da UE com o Magrebe a frente mediterrânea, que nos interessa bastante. Também o programa Horizonte 2020, fundos comunitários e os 77 mil milhões de euros que estão neste quadro da investigação e inovação são sectores de óbvio interesse para Portugal", enumera Santana Lopes na Renascença.

Coesão, uma amiga para sempre

Santana Lopes continua a defender a importância da coesão, um termo que vem dos primeiros tempos de Portugal na Comunidade Europeia.

"É um bom vocábulo para Portugal não largar e falar muito dele. Acho que não pode ser esquecido em todas as reformas que aí vêm. Esta velhíssima batalha de alguns por uma menor assimetria entre as diferentes regiões da Europa é muito difícil de fazer e construir. Mas a coesão económica e social é a outra face da moeda de uma política monetária comum. Uma face que tem estado muito apagada pelos ventos, diluída. É um dossier que interessa muito a Portugal", argumenta o antigo primeiro-ministro. Em resposta, António Vitorino defende uma adaptação do conceito à realidade do euro. "Tem que ser sintonizado com o objectivo da estabilidade do euro. E portanto a convergência real das economias da zona euro é uma condição indispensável para que a zona euro possa continuar a funcionar", acrescenta o comentador socialista.

Esta versão moderna da coesão aplica-se, diz Vitorino, por via de uma nova dinamização dos objectivos da convergência, longe de um passado baseado em investimento em infra-estruturas.

"Esse ciclo acabou. Hoje tem que haver um ciclo novo que passa pela qualificação das pessoas, pela educação. Passa pela investigação cientifica e desenvolvimento em articulação com as iniciativas empresariais. Passa pela energia - os desequilíbrios do custo energético na zona euro são um factor de desequilíbrio profundo de competitividade", argumenta o antigo ministro do PS.

De Londres a Rabat

António Vitorino e Pedro Santana Lopes sublinham ainda a importância das negociações sobre o Tratado Transatlântico de Comércio. Mas há outras conversações que vão ocupar os líderes europeus nos próximos tempos, com interesse específico para Portugal. Vitorino diz que, do ponto de vista do interesse estratégico nacional, é "bastante importante" que o Reino Unido permaneça na União Europeia.

"Uma saída enfraqueceria significativamente a componente atlântica do projecto europeu, com o desaparecimento do seu principal país. Reforçaria a tendência centrífuga, continental do projecto europeu e avolumaria ainda mais o peso de Berlim. É do nosso interesse colaborar para que o Reino Unido tenha condições para ficar na União Europeia. O que não significa que o devamos fazer a qualquer preço. É manifesto que as propostas do senhor Cameron em matéria de liberdade de circulação de trabalhadores não podem receber o apoio português", apela o comentador socialista no programa "Fora da Caixa".

Já Pedro Santana Lopes considera que o estreitamento de relações entre a União Europeia e Marrocos é do "profundo interesse" de Portugal. " Marrocos é um caso extraordinário da história. Rabat é a capital mais próxima de Lisboa e estamos ambos tão longe. É um caso estranhíssimo para 'psicólogos da história", remata o antigo primeiro-ministro.

O Fora da Caixa é um programa da Renascença em colaboração com Euranet, rede europeia de rádios. É transmitido todas as sextas-feiras, habitualmente às 23h00.