Má alimentação “custa milhões” ao Estado. “É preciso uma acção concertada”
21-11-2017 - 12:24

A bastonária da Ordem dos Nutricionistas esteve na Manhã da Renascença para falar sobre o impacto dos maus hábitos alimentares dos portugueses.

A má alimentação dos portugueses “está a custar muitos milhões ao Estado, ao Serviço Nacional de Saúde”, diz a bastonária da Ordem dos Nutricionistas. E são “gastos directos”, destaca.

Convidada da Manhã da Renascença no dia em que a Ordem realiza o seu primeiro congresso, Alexandra Bento dá como exemplo o aumento da incidência da diabetes.

“A diabetes tem vindo a aumentar imenso aquilo que é o gasto em saúde e o SNS não vai conseguir ser sustentável para conseguir fazer face ao tratamento prolongado que doenças como a diabetes, as doenças cardiovasculares e os vários tipos de cancro” implicam, prevê.

“E muitas destas doenças estão relacionadas muito directamente com os maus hábitos alimentares”, destaca ainda.

Alexandra Bento concorda, por isso, com a introdução de taxas nos alimentos considerados prejudiciais à saúde, com mais sal, açúcar ou gordura.

“Além de um simbolismo forte, tem uma acção eficaz, porque obrigam a indústria a reduzir açúcar e sal e, eventualmente, a taxação até pode vir a ser ampliada para as gorduras”, afirma.

Numa altura em que o Orçamento do Estado está em discussão, a bastonária da Ordem dos Nutricionistas apela a uma acção concertada a começar pelo Governo.

“Vemos o Ministério da Saúde muito empenhado em tocar nas questões alimentares, porque sabe a factura que paga, e vemos, por outro lado, o Ministério das Finanças a não aprovar, por exemplo, a presença de mais nutricionistas nos centros de saúde”, aponta como exemplo de “descoordenação entre aquilo que se considera que é prioritário no país”.

“Falta uma acção conjunta” que envolva também “a indústria alimentar, que tem de olhar para os seus produtos e reformulá-los”, e a distribuição, “porque no final do dia, todos nós temos responsabilidades”.

“Portugal pode aproveitar este grande momento, porque a sensação que eu tenho é que todos os operadores do sector alimentar – leia-se indústria alimentar, restauração, a distribuição – estão num momento em que perceberam que têm que se envolver; estão num momento em que perceberam que não podem vender por vender, que têm que reformular os seus produtos alimentares” e “colocar nas prateleiras dos supermercados aquilo que é mais promotor de saúde”, considera a nutricionista.

Essencial para mudar os hábitos alimentares é, na opinião de Alexandra Bento, uma campanha junto das escolas.

“É preciso ver o que se fez no nosso país em termos de educação ambiental. Porque foram os nossos filhos que nos trouxeram para casa aquilo que são os conceitos principais e nos ensinaram a reciclar, o que é óptimo”, recorda.

Através das escolas, não só se chega a casa, como às refeições escolares. “Eu tenho visitado algumas escolas e verifico que, ainda que o prato seja muito equilibrado, elas não o vão comer, porque não estão habituadas a comer sopa, porque não estão habituadas a comer legumes no prato”, salienta a bastonária.

É, por isso, “preciso que se pense nisto como uma verdadeira causa nacional. Porque muito se diz sobre alimentação, aumentam os mitos e os falsos conceitos e não se aposta no local certo, que é nas crianças, nas escolas”, insiste.

Esta terça-feira, realiza-se o primeiro congresso de nutricionistas, no qual participam especialistas de todo o mundo. É o primeiro sem o patrocínio da indústria alimentar. “Quando há patrocínios, é evidente que há conflitos de interesses”, reconhece Alexandra Bento.

“O que não quer dizer que a indústria alimentar não seja um parceiro de excelência” e que “nutricionistas e indústria alimentar não possam trabalhar em conjunto. Podem e devem”, salienta.

“Aliás, não consigo imaginar a indústria alimentar a trabalhar neste caminho da saúde sem a presença de nutricionistas. Em Portugal, a presença de nutricionistas a trabalhar na indústria alimentar é escassíssima, o que quer dizer que a indústria alimentar olha muitas vezes para os nutricionistas como promotores dos seus produtos alimentares e não como profissionais de saúde que podem auxiliá-los a mudar os seus produtos alimentares”, lamenta.