Irmã oblatas não saem de Bangui. "Se não estivermos lá, quem é que os defende?"
03-05-2018 - 18:45
 • Aura Miguel

A superiora geral das Irmãs Oblatas do Coração de Jesus, a portuguesa Júlia de Sousa, assume que há medo no seio da congregação da República Centro-Africana, mas garante que ninguém desiste. "Não temos armas, mas a nossa presença questiona-os", diz, em entrevista à Renascença.

A superiora geral das Irmãs Oblatas do Coração de Jesus, a portuguesa Júlia de Sousa, diz, em entrevista à Renascença, que as irmãs da sua congregação não querem deixar a República Centro-Africana, apesar dos riscos que correm.

"Não podemos deixar sozinhas as pessoas indefesas", diz a irmã Júlia, numa reacção ao incidente, ocorrido na terça-feira, junto à Igreja de Nossa Senhora de Fátima, em Bangui, que provocou a morte de 20 fiéis, incluindo um padre.

"Se não estivermos lá, quem é que os defende? Não temos armas, mas a nossa presença questiona-os. Eles mataram este padre, mas, no fundo, não o mataram, porque a vida dos mártires é semente dos cristãos e outros hão-de vir e continuam a testemunhar e a ficar. Isso dá-nos muita força. Porque lutamos por um ideal e não podemos deixar sozinhas as pessoas indefesas. Por isso, continuamos: as nossas escolas foram destruídas e nós continuamos a reconstruir", diz Júlia de Sousa, que conhece as nove irmãs que formam a comunidade local das oblatas.

A irmã Júlia já visitou por várias vezes a República Centro-Africana, para estar com a sua comunidade, situada em Bangui, na zona muçulmana, um dos bairros mais perigosos da cidade. Ela própria, numa dessas visitas, já sofreu um ataque.

"Uma noite, estávamos a preparar o 8 de Dezembro, atiraram-nos uma granada, que bateu na capela, mas não explodiu. Foi explodir mais longe. Tudo abanou, parecia um tremor de terra e, ao longe, da catedral, viram um grande clarão. O cardeal de Bangui mandou este padre, que assassinaram agora, para ver se as irmãs estavam todas mortas, mas ele só pode chegar de manhã. Nós conseguimo-nos refugiar num corredor e ficámos toda a noite ali. Houve uma irmã que me disse 'Irmã Júlia, chegou o nosso fim, vamos renovar os nossos votos'", conta.

A casa das irmãs oblatas fica num bairro ao lado da Igreja alvo do ataque de terça-feira: "São dois bairros, um ao lado do outro. Temos bons contactos e este padre que faleceu era um padre que não tinha medo, andava sempre no diálogo e a comunicar, tinha muita esperança e passou por tantos perigos."

Em relação aos acontecimentos de terça-feira, Júlia de Sousa apurou junto da congregação que o ataque se deu "durante uma eucaristia que reunia as confrarias de São José".

"Estavam todos reunidos, havia muita gente, dentro e fora da igreja. As minhas irmãs estavam lá e mandaram fotografias do massacre e estão muito assustadas, sobretudo, porque morreram pessoas muito ligadas a elas. Mas querem continuar lá".