Leopard 2 na Ucrânia? "Não sei se vale a pena pensar nisso", admite militar
27-01-2023 - 11:36
 • André Rodrigues

Dos 37 carros de combate Leopard 2 portugueses, apenas um terço estarão em condições de operar em cenário de guerra, o que, segundo o Major-General Raul Cunha, "é o mínimo dos mínimos" para Portugal cumprir com a NATO. Já o Major-General Carlos Branco olha para Portugal como o “pobre que tem as calças e os sapatos rotos e ainda oferece a camisa”.

O Major-General Raul Cunha considera improvável o envio para a Ucrânia de tanques Leopard 2 alocados ao campo militar de Santa Margarida.

“Não sei se vale a pena estarmos a pensar nisso. Nós não temos mais condições para dar mais material, pura e simplesmente”, admite o militar, em declarações à Renascença.

Já quanto à capacidade de Portugal para dar treino aos militares ucranianos para operar estes veículos, Raul Cunha admite que tal será possível, “porque temos, pelo menos, um esquadrão operacional em Santa Margarida”, o correspondente a entre 12 e 14 tanques pesados.

“Temos, talvez, dos melhores carristas a nível das forças armadas europeias. Mas isso só não chega”, acrescenta.

Esta semana, o atual ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho – que foi ministro da Defesa no anterior Governo – referiu que “o importante é que está assumido este compromisso” de enviar quatro viaturas pesadas de combate Leopard 2 para a Ucrânia.

Essas declarações foram, entretanto, corrigidas pela atual titular da pasta da Defesa, Helena Carreiras, que clarificou que não havia “nenhuma decisão de envio de carros de combate [Leopard 2] por Portugal à Ucrânia".

Um episódio que, na perspetiva de Raul Cunha, resulta do facto de Gomes Cravinho “pensar que ainda é ministro da Defesa e pensar que ainda pode usar a seu bel-prazer os meios de que a Defesa dispunha para os seus objetivos pessoais e políticos”.

Para este especialista, o agora ministro dos Negócios Estrangeiros “não tem a mínima noção da quantidade de decisões erradas que tomou e daquilo que fez para que as nossas Forças Armadas chegassem ao estado em que estão”.

O desencontro de versões entre ministros é, segundo este militar, mais um sinal do “desinvestimento de sucessivos governos nas Forças Armadas” num cenário em que “a manutenção destes carros é caríssima, exige, quer pessoal treinado em condições, quer verba”.

“Visto de uma forma simplista, tudo é possível”

Este é um argumento corroborado pelo Major-General Carlos Branco que olha para Portugal como “aquele pobre que tem as calças e os sapatos rotos e ainda oferece a camisa”.

A imagem serve para justificar o argumento de que a cedência de quatro Leopard 2 a Kiev será uma “medida pouco sensata, tendo em conta a exiguidade de meios disponíveis”.

“Visto de uma forma simplista, tudo é possível. Pensar que vamos colocar carros de combate na Ucrânia hoje, e que amanhã estamos prontos para combater, isso é um exercício de ignorância”, adverte o militar, em declarações à Renascença.

Questionado sobre a necessidade de, em 2008, o Estado português ter adquirido 37 destes tanques de última geração aos Países Baixos, Carlos Branco lembra que “Portugal precisa de uma unidade orgânica e estes 37 carros de combate não permitem que essa unidade orgânica se constitua”.

E vai mais longe, em resposta aos críticos do que aparenta ser um elevado número de veículos de combate: “Se alguém achar que Portugal deve-se resumir ao seu retângulo e não deve participar no esforço coletivo, se não quisermos participar nos exercícios da NATO, se não tivermos qualquer tipo de ambição e de projeção em termos de política externa, até podemos sair da NATO, ou nem ter Forças Armadas”.

Já quanto à disponibilidade assumida pela ministra da Defesa para acolher militares ucranianos para receber formação, o Major-General Carlos Branco alerta “isso também não pode ser visto de forma leviana e as pessoas têm de saber do que estão a falar: só dou treino em função do equipamento que tenho”.