Há eleições na Madeira a 22 de setembro. Quem vai governar? Será que o PSD mantém a liderança?
27-05-2019 - 12:14
 • Maria João Costa , no Funchal

A Madeira vai a votos em eleições regionais, 15 dias antes das legislativas. Governado há mais de 40 anos pela direita social democrata, o arquipélago vive um momento crucial. As sondagens indicam uma maior proximidade entre PS e PSD.

À porta do movimentado Mercado dos Lavradores, no Funchal, as conversas sobre política cruzam-se com o burburinho dos grupos de turistas. Alfredo Moura, antigo bombeiro da cidade, hoje com 82 anos, discute com os amigos o futuro da Madeira, que vai a eleições a 22 de setembro, 15 dias antes das legislativas. A incógnita é saber se o PSD se mantém no poder.

Sobre as expectativas quanto a resultados, o antigo bombeiro afirma à Renascença que “era bom que mudasse um pedacinho, nem que fosse um mandato, só para ver o que isto dava”. Ainda assim, admite Alfredo Moura: “Penso que isso não vai acontecer.”

Nas ruas já há cartazes. Nos próximos meses os madeirenses terão de decidir em quem votar dentro de menos de quatro meses.

No Governo regional há 42 anos, o PSD recandidata-se com Miguel Albuquerque – atual presidente do executivo madeirense. Sentado no seu gabinete na Quinta Vigia no Funchal, Albuquerque explica: “No PSD, nunca tivemos uma vida fácil porque sempre houve uma bipolarização política na Madeira, entre o PSD e a oposição. O PSD exerce o poder na Madeira há 42 anos. Estou convencido que as pessoas não vão fazer uma mudança. Não vão mudar para pior porque isso chama-se masoquismo! Esta esquerda não tem nada para oferecer. O exemplo a nível nacional, é suficiente para que os madeirenses não embarquem em promessas e falsas ilusões”.

Do outro lado está Paulo Cafôfo. O atual autarca do Funchal, vai no segundo mandato e sucedeu a Miguel Albuquerque na câmara, ponto fim a mais de 30 anos de maiorias absolutas do PSD. Candidato independente apoiado pelo PS, elege outros adversários para a campanha. “Não fomento esta cultura de madeirenses contra cubanos. Aliás, esta questão de que há um inimigo que é Lisboa ou que há um inimigo interno apoiado por Lisboa, não faz sentido. O inimigo da Madeira são o desemprego, as listas de espera, e a fraca qualificação dos madeirenses.”

Nas últimas regionais de 2015, o segundo partido mais votado foi o CDS que tem agora novo rosto. Rui Barreto que nos recebeu na sede do CDS no Funchal em dia de chuva, traça no guião de um partido de oposição, a saúde como uma das apostas.

“As listas de espera aumentaram muitíssimo. Temos mais de 60 mil atos médicos em lista de espera, entre tratamentos, cirurgias e exames médicos. Diria que é preciso fazer uma auditoria clínica logo no início da próxima legislatura e se volte a colocar o doente no centro da ação política”, avança.

Além da saúde, Rui Barreto fala-nos ainda do custo de vida. “Nós somos dos portugueses que pagam mais impostos em Portugal. Temos um programa de ajustamento económico-financeiro, mas temos ainda muito para recuperar. Quero devolver mais rendimento à classe média que está fortemente fustigada. Não é prometer tudo a todos, o céu na terra, devemos fazê-lo de forma gradual e nos próximos 10 anos tem de haver um compromisso.

Mas nas ruas, à porta do Mercado dos Lavradores encontramos Idalina. É da Camacha, mas vem todos os fins-de-semana ao Funchal ajudar a mãe na venda das flores. O negócio já viveu melhores dias. Vestida com o fato tradicional da Madeira Idalina fala-nos da carga de impostos. “São muitos os impostos, são muitas as exigências e não é fácil.”

Outras são as contas que Miguel Albuquerque, o presidente do Governo regional faz em jeito de balanço do último mandato. “A economia da região sobe há 66 meses consecutivos. Está em crescimento 2, 3 superior á média nacional e europeia. O desemprego baixou de 15,8% para 8,8%.

Baixamos os impostos, quer o IRS pelo quarto ano consecutivo nos seis escalões; quer o IRC para as pequenas e médias empresas para 13,6% E houve um reforço nas áreas sociais com um conjunto de medidas com grande repercussão no rendimento das famílias.”

Há sete anos, na Madeira foi criado o Banco Alimentar Contra a Fome que já distribuiu duas mil toneladas de alimentos. Hoje dá apoio anual a 52 instituições chegando a 8 mil pessoas. Fátima Aveiro, responsável pelo projeto diz que a situação melhorou desde a crise económico-financeira, mas é preciso quebrar o ciclo da pobreza e apurar as causa, até porque afirma: “Não há dinheiro que chegue para tudo”.

Mulher de fibra, Fátima Aveiro considera ser “preciso um estudo, não só a nível social como em outras áreas para se definir uma estratégia. Não é ficar a fazer estudos e mais estudos e o estudo do estudo, não! Tem de haver estudos sérios de impacto, para depois definir o que é necessário fazer. Eu não posso aceitar que sejam precisas três gerações, ou seja 150 anos, para sairmos do ciclo da pobreza. Não pode ser. Isto é um problema sério e os políticos têm de entender esta realidade e ir à raiz do problema em detrimento de outras áreas obviamente, mas são prioridades.”

A educação e o regresso dos emigrantes da Venezuela

No ano em que no arquipélago se assinalam os 600 anos da Descoberta da Madeira e Porto Santo, nas escolas vive-se a data com várias iniciativas. É o caso da Secundária Francisco Franco no Funchal, onde chegaram nos últimos tempos alunos vindos da Venezuela. São estudantes com bom aproveitamento diz-nos António Pires, o presidente do conselho executivo explica à Renascença que estes estudantes têm “bons resultados escolares e até se conseguem integrar bem”. Este docente indica que “há muitos alunos que já vêm com o secundário concluído, mas que às vezes preferem ficar cá um ano a assistir às aulas para se integrarem melhor no ensino e outros que vêm para concluir.”

Também no ensino básico os estudantes que chegam da Venezuela vêm bem preparados confirma-nos Lídia Albornoz. Esta professora na escola EB1 do Caniço arrisca dizer que estes alunos “são melhores a português do que muitos alunos madeirenses. São esforçados, participativos, com uma energia brutal”.

A educação dos madeirenses é de resto outra das prioridades políticas dos candidatos da direita à esquerda. Paulo Cafofo, candidato socialista considera que os madeirenses têm “de voltar a ter orgulho de ser madeirense.” Para isso, avança o candidato é preciso “qualificar as pessoas e apostar na educação”, porque refere Cafofo: “temos a mais alta taxa de abandono preços e no ensino no nosso país - 66% da população não tem o ensino secundário, temos a mais alta taxa de analfabetismo do país, portanto isto são valores que temos de inverter se queremos desenvolver, porque acredito que o desenvolvimento está na qualificação dos madeirenses”.

Também Rui Barreto, candidato do CDS aposta na educação. Para o novo líder centrista no arquipélago, é um “problema, a qualificação dos recursos humanos. 57% da população em idade ativa tem apenas o 9º ano de escolaridade.” Para este madeirense há outros madeirenses qualificados espalhados pelo mundo que têm de ser convocados. “É muito importante para recuperar a Madeira fazer de facto uma rede de net work com os nossos e convidar os nossos a transformar a nossa terra”.

O aeroporto e os ventos de mudança

São muitos os alunos que acabam a estudar fora do arquipélago. Vir a casa implica pagar viagens de avião. Essa é outra das questões que vai marcar a campanha das regionais. O presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque não poupa críticas à transportadora aérea nacional e ao executivo central e diz que teve de criar uma solução para os estudantes. “Arranjamos um fundo, onde os estudantes e os pais dos estudantes só pagam um valor facial da viagem que são 65 euros. Estamos à espera que o Governo há 3 anos faça essa resolução no sentido de aplicar a mesma solução para os voos dos residentes, pagando só 86 euros. Estamos à espera, já falamos diversas vezes com o Governo, o Governo não está interessado em fazê-lo”.

Mas Albuquerque vai ainda mais longe nas críticas á transportadora aérea. “Outro problema é a TAP que neste momento tem uma política de preços perfeitamente constrangedora, antinacional e que é uma vergonha em que os madeirenses e os próprios portugueses para circularem em território nacional têm perspetivas de preços de 400, 500 euros quando TAP tem neste momento uma maioria de capital publico. A TAP faz o que quer, pratica preços pornográficos limitando e condicionando quer o turismo nacional para a Madeira quer a circunstância de os cidadãos não poderem circular dentro do território nacional a preços acessíveis.”

Também o partido Juntos pelo Povo que nas últimas regionais elegeu cinco deputados que se sentam à esquerda na assembleia regional critica os preços praticados, mas lembra o acordo que foi assinado por Miguel Albuquerque. Élvio de Sousa considera não ser “admissível para uma região autónoma insular pagar 600 euros para ir a Lisboa tratar de um assunto. O modelo do subsídio de mobilidade que foi feito com o governo de Passos Coelho e Paulo Portas e o atual presidente do Governo foi uma solução para financiar as companhias aéreas, nomeadamente a TAP. A solução está a honorar os cofres do Estado acima dos 30 milhões, tal como na Região Autónoma dos Açores, e é inadmissível que tenhamos que pagar em média 300 e tal euros para ir a Lisboa ou ao Porto. Esta situação, para nós é uma situação de lesa cidadania.”

O candidato do JPP pede mesmo a intervenção do Presidente da República. Na campanha socialista a questão do aeroporto tem outra perspetiva. Paulo Cafofo aposta em duas frentes, uma delas técnica.

Em declarações à Renascença, no seu gabinete na autarquia, diz: “Há aqui a questão dos ventos. Há uma matéria que não é política e que é técnica que são os parâmetros que estão definidos. Aqui a ANAC enquanto entidade competente é que terá de avaliar ou não a alteração dos parâmetros que estão no aeroporto. A minha opinião é que sempre que estiverem em causa questões de segurança, aí não podemos mexer. Mas há uma decisão política que é a Madeira ter um plano de contingência quando acontecem estas situações de inoperacionalidade. O que não pode acontecer é o aeroporto devido às condições atmosféricas estar inoperacional e transformar-se num caos.”

Apesar de tudo, para o turismo da Madeira 2018 foi um ano bom, mas a incerteza sobre 2019 é grande.

Pode haver ventos de mudança aponta Mónica Freitas, diretora de Marketing do Hotel do Carmo, no Funchal. “Se olharmos de há um ano para trás são 7 as companhias aéreas que saíram da Madeira, algumas por falência, outras porque decidiram não voar para a Madeira nomeadamente à conta dos condicionalismos que o aeroporto de vez em quando tem tido. Quase toda a gente diz que tem medo de aterrar na Madeira o que é uma estupidez. É um preconceito que se criou. Até porque acho que nível de segurança deve ser dos aeroportos mais seguros porque nenhum piloto pode aterrar sem antes ter tido alguma experiência aqui. O que é verdade é que isso existe e é um fator muito determinante sobretudo no mercado português que tem sido o que tem aguentado o decréscimo nos mercados tradicionais, inglês e alemão. Efetivamente este ano é um ano muito instável”.

Um dos fatores que pode afetar o turismo madeirense é o Brexit, reconhece o presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque que fala em preocupação. “É um dos nossos principais mercados”, explica e acrescenta: “Assistimos nos últimos anos a uma descida da Libra de 13% e constatamos que isso não teve repercussões no mercado da Madeira. Mas temos de estar atentos e continuar a trabalhar e daí termos feito um reforço da promoção nos nossos destinos internacionais designadamente no mercado alemão e inglês.”

No mercado dos Lavradores encontramos o casal David e Anne. Já visitaram a Madeira várias vezes, vem de Inglaterra e prometem voltar, mesmo que tenham de pedir visto como já fizeram no passado. Este casal de idade avançada ri-se ao dizer que “são os políticos que provocam as confusões em tudo. Provavelmente vamos sair da União Europeia, mas não fará diferença”, até porque lembram já antes viajavam pedindo visto para sair do seu país.

O turismo e em particular o mercado britânico pesam na economia madeirense. Outro dos fatores determinantes para o orçamento do arquipélago é a zona franca. Miguel Albuquerque é critico dos que a criticam.

“São 122 milhões de euros de receita fiscal que são essenciais por exemplo para financiamento do sistema de saúde regional. Mas mais do que isso, o Centro Internacional de Negócios da Madeira é fundamental para a economia portuguesa. Só por masoquismo, estupidez ou má fé é que se pode dar cabo de um centro internacional de negócios como o da Madeira que significa no quadro da política atlântica de Portugal uma plataforma essencial da nossa economia”.

Questionado sobre se há risco, Albuquerque vai mais a fundo nas críticas. “Temos um conjunto de personagens estranhas na política portuguesa, com responsabilidades políticas que continuam a dar tiros nos pés e que querem se suicidar”. Perante as acusações, perguntamos ao presidente do Governo Regional se quer especificar. Albuquerque avança, sem medos. “Tem uma fulana, uma Ana Gomes qualquer que tem feito um conjunto de demagogia barata á custa do nosso centro e que tem obviamente nos prejudicado”.

Que cenários políticos podem surgir na Madeira depois de 22 de setembro?

Dia 22 de setembro, o voto determinará quem vai governar a Madeira e ocupará a quinta da Vigia que no passado se chamou Quinta das Angústias

O candidato do PS Paulo Cafofo, admite coligações à direita e à esquerda caso vença sem maioria. “Um verdadeiro político é aquele que constrói pontes e derruba muros e, portanto, acredito sempre no diálogo. A experiência que tenho aqui na câmara deu-me musculo para ser a pessoa mais bem preparada para num cenário de não existência de maioria absoluta, de ter a capacidade de dialogar, seja com quem for, numa solução de governabilidade.”

Uma geringonça madeirense onde o CDS pode ser o fiel da balança admite o candidato Rui Barreto. “Se não houver maiorias de um partido, mas houver uma convergência programática, eu estou disponível para encetar essas negociações”. Questionado sobre se tratam de acordos parlamentares, Barreto afirma que “se for para assumir um compromisso tem de haver um casamento. Eu não gosto destas coisas híbridas do Bloco de Esquerda e do PCP que uma hora aprovam os orçamentos e na outra estão na rua a contestar e promover manifestações, tentando ludibriar o povo. Se é para assumir um compromisso é um casamento. Tem de haver um propósito e uma convergência e integrar o governo. Se não houver essa possibilidade, não vem mal ao mundo. Ficamos na oposição.”

Já os Juntos pelo Povo que quer voltar a eleger 5 deputados ou mais fala em manter-se na oposição, quanto a outras soluções, é ainda cenário em aberto explica Élvio de Sousa. “Há dois cenários que estão em cima da mesa. Um cenário de fiscalização e continuidade; ou um cenário de eventualidade de parceiro de governança. Neste momento, considero que há mais relação de proximidade entre o PS e o PSD do que desconexão. Quem será o nosso parceiro? Não sabemos, mas posso dizer que quem será o nosso adversário político, é o PSD.”

E o PSD? O que espera destas eleições regionais da Madeira? Foi o que perguntamos a Miguel Albuquerque. “Estas eleições regionais resultam numa obsessão. Como o primeiro-ministro disse quando aqui veio, ele está obcecado com a Madeira. Daí há aqui uma catadupa de diligências de comunicação pagas por Lisboa e ministros que vêm para cá a iniciativas do partido socialista. Eles estão obcecados com isto, estão com uma arrogância e uma soberba, mas penso que lhes vai sair o tiro pela culatra”.

Mas será que poderá haver necessidade de uma geringonça também aqui na Madeira? “Não sei, vamos ver os resultados das eleições. Mas acho que neste momento, qualquer solução de coligação negativa e qualquer solução que não tenha como consequência a vitoria do PPD-PSD na Madeira, será quanto a mim extremamente negativa para o futuro da Madeira, dos madeirenses e da Região Autónoma da Madeira”. Dia 22 de Setembro logo se verá o que as urnas ditarão.