Mia Couto vai angariar verbas para ajudar vítimas do Idai em Moçambique
02-05-2019 - 07:08
 • Maria João Costa

Porque os donativos ficaram aquém das necessidades, o escritor Mia Couto está a preparar um livro e um documentário para angariar verbas para ajudar as vítimas do ciclone Idai, em Moçambique.

O ciclone Idai interrompeu a escrita do novo livro de Mia Couto. É passado na Beira, onde o autor moçambicano viveu a infância. Desde a catástrofe natural que o escritor não conseguiu regressar à escrita do livro. Em entrevista à Renascença, o autor diz que agora tem de voltar á Beira e “esperar que a cidade diga como é que estas coisas são resolvidas”.

Mas Mia Couto quis ir à Beira logo depois da passagem do Idai. “Eu ia lá para abraçar os meus amigos e os consolar, mas foi eu que fui consolado porque eles já estavam colocando mãos á obra”. No terreno, o escritor encontrou resiliência das gentes da Beira. A mesma que agora quer retratar num livro e documentário que será feito para angariar verbas para ajudar as vítimas do ciclone.

Em entrevista à Renascença, na véspera de estrear domingo em Lisboa o documentário biográfico “Sou autor do meu nome Mia Couto” de Solveig Nordlung no Indie Lisboa, Mia Couto denuncia que “os donativos foram muito, muito aquém” do que Moçambique precisa. Daí, junto com os seus irmãos, e com a Fundação Fernando Leite Couto, o escritor ter lançado a ideia de fazer um livro e um documentário para angariar mais ajuda para as populações.

Numa fase estão a lançar o projeto e a constituir equipa, Mia Couto diz-nos no seu tom de voz calma que quer que esse documentário vídeo seja “sobre como as pessoas responderam com dignidade e capacidade enorme de fazerem regressar à sua condição inicial da vida”. Nas palavras de um dos autores mais criativos da língua portuguesa este vídeo será “uma celebração da capacidade de resistir dos moçambicanos”.

E porque é de histórias que se faz o olhar do autor de “Estórias abensonhadas”, aquilo que este vídeo terá são “histórias de pequenos heróis, que salvaram outros, se dedicaram e se entregaram á solidariedade. Essas pessoas não podem ficar sem rosto e voz”.

Questionado sobre o livro que estava a escrever, Mia Couto sabe que vai regressar a ele e à narrativa interrompida pelo ciclone. Contudo, admite: “estou um pouco perdido” e acrescenta, “a linha narrativa estava construída e ia à procura de memórias”. Mas o personagem, um autor que vai à procura das suas memórias ficou em suspenso pela força da chuva e do vento devastadora. Mia que deveria ter viajado para a Beira na semana do Idai, explica que “há sítios que já não existem”. Agora o autor terá se procurar na memória a matéria para o novo livro.

“Sou autor do meu nome Mia Couto”, o documentário que estreia no Indie Lisboa

A vida de Mia Couto na Beira surge agora retratada no documentário da autoria da realizadora luso-sueca Solveig Nordlung que no domingo, às 18h, estreia na Culturgest, no Festival Indie Lisboa. “Sou autor do meu nome Mia Couto” começa nas primeiras imagens por mostrar a população da Beira a abordar Mia Couto na rua. É um “ilustre” como se ouve no filme onde o autor passa pela sua casa de infância, revisita as memórias da guerra civil de 16 anos e diz que “ninguém em Moçambique tem força para uma nova guerra”; fala da sua carreira de jornalista, lembra os primeiros passos na escrita e fala da sua paixão pela biologia.

Em entrevista à Renascença, a realizadora Solveig Nordlung que já conhecia Mia Couto há cerca de 20 anos revela que ficou surpreendida com a forma como o autor de “Terra Sonâmbula” é “muito amado” pelos seus conterrâneos. Segundo Solveig Nordlung que já antes fez outros documentários sobre escritores como António Lobo Antunes, “um escritor é um bocadinho mágico, num pais onde normalmente as pessoas são contadoras de histórias.”

A câmara da realizadora acompanha Mia Couto pelas ruas da Beira, a visita a uma escola, mas vai também com ele ao teatro em Maputo, onde o escritor começou por escrever para ser representado. Solveig Nordlung afirma que ficou “a conhecer Mia Couto através do filme”, onde descobrimos a relação do autor com a sua outra profissão, a de biólogo.

Quem for ver este documentário, ficará também a perceber a verdadeira história do nome Mia Couto. O escritor revela na primeira pessoa que foi ele que se deu a si mesmo esta alcunha que se tornou nome próprio. Para saber mais sobre este filme, poderá ouvir a entrevista de Mia Couto ao programa Ensaio Geral da Renascença que vai para o ar esta sexta-feira depois das 23h.