Zika. Madeira pode ser zona de risco no Verão
27-01-2016 - 10:44
 • André Rodrigues

No dia em que a Dinamarca confirma a existência de mais um caso em solo europeu, o infecciologista Jaime Nina esclarece que, nesta altura do ano, todos os casos são importados. Ou seja, ocorrem em pessoas que viajaram por países da América Latina e contraíram a doença.

Em declarações à Renascença, o especialista Jaime Nina lembra que o arquipélago da Madeira pode ser um dos poucos territórios do espaço europeu onde a propagação do Zika estará facilitada no próximo Verão. Em causa, a presença do Aedes Aegypti, o mosquito responsável pela transmissão do vírus, precisamente o mesmo que transporta o dengue e a febre amarela. Nesta altura do ano não há perigo porque, num quadro de baixas temperaturas, não há insectos.


A Dinamarca confirma o primeiro teste positivo num turista que esteve recentemente na América Latina. Mas há outros casos confirmados na Europa. Há razões para preocupação quanto a uma eventual expansão rápida da doença?

Não. Estamos a falar de casos importados, porque o vírus não tem capacidade de se transmitir na Europa. Estamos no Inverno e não há mosquitos que transmitam a doença. Além disso, não é qualquer mosquito que transmite este vírus. Têm de ser mosquitos da espécie Aedes, fundamentalmente os Aedes Aegypti, que é o mesmo que transmite o dengue e a febre amarela.

Precisamente por isso, por ser o transmissor da febre amarela, o mosquito foi muito combatido na Europa e foi eliminado da maior parte dos países, incluindo Portugal. Mas foi reintroduzido na Madeira em 2005. Depois disso já houve um surto de dengue na Madeira, mas foi eliminado. O mosquito é que não. Portanto, diria que a Madeira é das poucas regiões do espaço europeu que no próximo Verão será susceptível a uma introdução do vírus Zika.

E nesse sentido, há algum tipo de medidas que devam ser, desde já, aplicadas?

As medidas em relação aos casos importados - a menos que seja uma mulher grávida - não existem. Esta é uma doença benigna, de curta duração e 80% das infecções nem sequer apresentam sintomas. E, como disse, nesta altura do ano, nem há perigo de transmissão porque não há mosquitos. Medidas de fundo não são para agora, são para o futuro e devem passar pelo reforço das medidas de combate aos mosquitos. Por isso, no caso de Portugal, a pretexto do vírus Zika, penso que seria uma boa altura para tentar fazer a erradicação do mosquito Aedes Aegypti da Madeira.

Para além do mosquito, é conhecida alguma outra forma de transmissão do Zika? Pergunto isto porque há um alerta recente da Organização Mundial de Saúde (OMS) que não exclui outras vias de propagação do vírus, nomeadamente através de contactos com sangue ou por via sexual...

Aquilo que a OMS diz é que o vírus está mal estudado e que, por isso, não exclui outras formas de transmissão para além dos mosquitos. Dizer que não exclui não quer dizer que seja verdade. Quer apenas dizer que não se sabe. E isto acontece com outros vírus deste grupo, muito mais bem estudados - como a febre amarela ou o dengue.

E neste último caso, sabe-se que é possível a transmissão por via sexual. Mas isso é um caso em cada 900.000 transmitidos por mosquitos. Do ponto de vista epidemiológico e de saúde pública, é o mosquito que interessa. O resto são curiosidades.

Depois de confirmados diversos casos positivos de Zika em alguns países europeus, qual é a situação em Portugal? Tem conhecimento de algum diagnóstico positivo?

Até agora não. Já me apareceram algumas suspeitas mas foram todas negativas. Mas há muitas outras pessoas a ver doentes destes. Portanto, o mais provável é que estes pacientes apareçam nas urgências dos hospitais, fundamentalmente de Lisboa, porque tem o maior aeroporto internacional do país. Mas não é de excluir que possam surgir casos também nos aeroportos do Porto e de Faro.

E, provavelmente, os hospitais que receberem casos suspeitos têm de estar preparados os tratar. No caso concreto do hospital onde trabalho, que é o Egas Moniz, isso está a acontecer.

Há sinais clínicos a ter em atenção?

O problema desta infecção é que, na maioria dos casos, não há sinais. E pode ter complicações se se tratar de uma mulher grávida. Nos outros casos é uma doença benigna.

Por isso diria que, a título de precaução, uma mulher grávida, ou que engravidou enquanto viajava em países onde o vírus está activo - no caso português, o que interessa mais é o Brasil - seria boa ideia verificar à chegada se teve ou não algum contacto com o vírus. E isto é particularmente verdade se a pessoa teve uma doença febril.

E existe algum tipo de terapia ou vacina preventiva para este vírus?

Não há nenhuma terapia específica dirigida. Mas isto também é verdade para os outros vírus considerados primos direitos deste vírus, como o dengue, a febre amarela ou o Chikungunya.