D. Américo Aguiar diz que nomeação para cardeal é "homenagem à juventude portuguesa"
09-07-2023 - 13:38
 • Ricardo Vieira

Papa Francisco anunciou este domingo a nomeação de D. Américo Aguiar. Consistório está marcado para 30 de setembro. O novo cardeal português confessa que a notícia foi uma completa surpresa e que ainda está "a recuperar". "É inimaginável", declarou.

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A nomeação para cardeal é uma “homenagem a Portugal, aos portugueses e à juventude portuguesa”, afirmou este sábado o bispo auxiliar de Lisboa e presidente do conselho de administração da Renascença, D. Américo Aguiar.

O presidente da Fundação Jornada Mundial da Juventude (JMJ2023) falava aos jornalistas, em Setúbal, num armazém onde estão a ser montados os kits para os peregrinos do maior encontro mundial.

D. Américo Aguiar confessa que a notícia da nomeação para cardeal foi uma completa surpresa e que ainda está "a recuperar" da emoção e do que apelida de um "soco". "É inimaginável", declarou.

Questionado pela Renascença se o futuro passa pela Diocese de Lisboa, o novo cardeal diz que "não faz ideia" e que, "seja onde for", estará às ordens para aquilo que o Papa Francisco precisar.

Como soube da notícia de que tinha sido nomeado cardeal pelo Papa Francisco?

Estava aqui a trabalhar, estamos aqui numa tarefa muito urgente e necessária para a JMJ, a montagem dos kits e o meu telemóvel estava particularmente nervoso. A certa altura espreitei e vi que tinha uma mensagem que tinha qualquer coisa linguagem cardinalícia que eu li por brincadeira, mas continuavam, continuavam… e a certa altura a curiosidade foi maior, fui ver e tomei consciência daquilo que tinha acabado de acontecer.

Disseram-nos que ficou pálido e nervoso?

Pálido não sei, porque não tenho espelho, mas que estou a recuperar estou. Isso é verdade.

Não estava a contar com esta decisão do Papa?

Não estava a contar. Eu sei que as pessoas podem achar estranho, mas estas nomeações não são pré-comunicadas a ninguém, com o Papa Francisco. No passado, penso que eram pré-comunicadas. Com o Papa Francisco deixaram de ser. Qualquer um está sujeito a que aquela janela do Palácio Apostólico tenha um anúncio deste género, que me apanhou totalmente de surpresa, mas estou convencido que o que Papa teve no seu coração foram estes jovens, a preparação da Jornada Mundial da Juventude que é indispensável com eles. Acho que o Papa quis deste modo homenageá-los e valorizá-los e fazer ele o que ele diz para nós fazemos: dar aos jovens a possibilidade de serem os protagonistas da história, das suas vidas e acho que esta decisão é muito esse gesto do Papa, não tem nada a ver comigo, com as minhas competências, mas tem muito a ver com esta gente que tem dado até aos limites para que tudo esteja pronto daqui a 23 dias.

Pensou alguma vez que seria cardeal?

Sou cardeal desde o seminário, porque o meu apelido no seminário era “cardeal”. Por isso, só tenho desclassificado nos últimos tempos. Eu sei. O Porto teve um cardeal, o cardeal D. Américo Santos Silva, que faleceu em 1899, e eu chamo-me Américo e por isso, com muita facilidade, aliás, foi o reitor do Seminário na altura, o Dr. Jorge Cunha, que começou a chamar-me cardeal e, a partir daí, fiquei com essa alcunha.

Era um sonho que tinha?

Não, ninguém sonha ser cardeal. Só se não tiver juízo. Acho que no passado muitas destas coisas eram muito protocolares e de estatuto e acho que todos concordamos que, hoje em dia, é tudo menos isso. Aliás, o Papa lembra muito que o vermelho não é para ser mais vistoso e pavoneador, mas é o símbolo do sangue e do testemunho do Cristo vivo e eu tenho plena consciência de que nos últimos anos o quanto isso é verdade.

Vai ser com muito orgulho que vai usar esse vermelho?

Agora tenho um problema, é que eu converti-me há pouco tempo do Benfica ao Porto, mas não há vestes azuis, portanto, não sei como vai ser.

Quais vão ser as responsabilidades a partir de setembro?

Eu não sei de nada além daquilo que vocês ouviram. Não sei nada.

As reuniões que já teve com o Papa ajudam-no a perceber esta nomeação?

“Todos os encontros que tive com o Papa serviram para eu me aconselhar. Não sei qual foi a leitura que o Santo Padre teve. Quero que acreditem que acolho com muita surpresa, porque não estava previsto. As conversas eram sobre outros contextos e outros cenários e esta é uma decisão à Papa Francisco. Ponto.

Sente responsabilidade acrescida para que a JMJ seja um sucesso?

Acrescida não, porque nós já estamos nos limites daquilo que eu tenho dito a estes queridos jovens. Nós temos consciência que é com um pouquinho de cada um que se vai fazer tudo e que temos consciência das nossas limitações. Eu não tenho feito outra coisas nos últimos meses e semanas, às vezes com a vossa ajuda, e às vezes com a vossa ajuda, de tentar as pontes, as pacificações e a serenidade para que tudo corra da melhor maneira, para que todos os que estão envolvidos sejam capazes do seu trabalho e tudo junto corresponde à JMJ correr bem, que é aquilo que todos desejamos. É uma homenagem a Portugal, aos portugueses e à juventude portuguesa. Isto é o que eu sinto verdadeiramente.

Tem 49 anos e é jovem para cardeal. É assim que interpreta?

Isso é um problema que passa com o tempo. Resolve-se rapidamente. É uma responsabilidade acrescida, mas é também é um olhar e um coração… há coisas que a gente com 60 faz e outras que não faz, há outras que tem mais cuidados e reflexão e quando somos mais novos temos talvez menos medos, menos “ses” e “mas” e arriscamos e acho que é um bocadinho um contexto de tudo isto junto que pode significar um acrescento naquilo que seja o coletivo do Colégio Cardinalícia.

O Papa Francisco sentiu que estava preparado. Sente-se preparado?

Não, absolutamente. É algo que ultrapassa o nosso pensamento. As pessoas podem pensar o contrário, mas eu gostava que acreditassem que é um soco, é inimaginável, não faz parte… A gente pode nas conversas e nas brincadeiras, mas acontecer na realidade e desta maneira são os caminhos de Deus e os caminhos de Deus são insondáveis. Quando me perguntam essas coisas sobre outras circunstâncias, eu digo sempre que no dia 8 de julho de 2001, quando o Sr. D. Armindo Lopes Coelho me ordenou, acabou-se a minha vontade e, de lá para cá, tem sido assim. Há coisas simpáticas e agradáveis que eu acolho, há outras menos, mas tem sido assim. A minha vontade nesse dia ficou para trás. Seja o que Deus quiser.

A JMJ ajudou a sua nomeação como cardeal?

Não sei se ajudou ou não ajudou. Eu leio como um gesto do Papa Francisco em relação aos jovens e àquilo que ele nos diz insistentemente, de os jovens se levantarem e assumiram protagonismo nas suas vidas, serem protagonistas no cuidado da Casa Comum ”Laudato Si”; na “Fratelli Tutti”, a fraternidade universal; serem protagonistas na Economia de Francisco e nós somos meros intermediários que vamos ajudar a que isso possa ser ainda mais incentivado junto dos jovens.

Por onde pensa que vai passar o seu futuro? Pelo Vaticano ou pela Diocese de Lisboa?

Eu não faço a mínima ideia. Eu sou escuteiro, não tenho problema quanto à geografia e quanto às latitudes e longitudes e eu digo o mesmo de sempre: aquilo que o Papa Francisco precisar, se ele achar que eu tenho possibilidades de concretizar pode contar. Sempre alerta. Seja onde for.

Tem a ambição de ser bispo de Lisboa?

Tenho a ambição de às 15h30 de hoje fazer uns crismas em Óbidos. Se nós acreditamos que Deus providencia os pastores para o seu povo, se nós o dizemos às pessoas para rezar pelo seu pastor, quando é anunciado o pastor nós temos que dar graças a Deus por Deus ter escolhido aquele pastor. Quando é anunciado um pastor para uma Diocese, uns ficam contentes, outros menos contentes, mas se nós próprios dizemos que é Deus que providencia os pastores, quando for anunciado o pastor para a Diocese de Lisboa eu darei graças a Deus por esse pastor, seja ou não seja.

Está com lágrimas nos olhos?

É do pó do armazém. Normalmente, as lágrimas são qualquer coisas que nós não dominamos. Choramos por coisas boas e por coisas más. Acho que isto é um misto de alegria e de aflição e de consciência de que eu sou muito pequenino. Quando me compara com os outros cardeais anunciados, sou um "Danoninho".