Em tempo de guerra, o Shaktar Donetsk deslocou as suas equipas dos escalões de sub-12 até aos sub-16 para a cidade croata de Split. No lançamento da 2.ª Conferência Bola Branca, que realiza a 22 de maio, Edgar Cardoso, o português que coordena a academia de formação do Shakhtar, fala, à Renascença, das dificuldades em trabalhar o talento com jovens jogadores deslocados das famílias.
O clube ucraniano compete com as suas equipas nos campeonatos regionais de Split e participa em torneios internacionais.
Edgar Cardoso que coordena a formação do Shakhtar desde 2020, depois de seis anos a trabalhar na Aspire Academy do Qatar, destaca a forma guerreira como os ucranianos lidam com a adversidade que permite ter perto de 100 jovens em permanência em Split.
Quais são os principais desafios que tem para conseguir coordenar esta operação na Croácia?
O maior desafio é tentar conseguir que os jogadores lidem com alguma naturalidade com o facto de estarem longe das famílias e dos amigos. Há alguns destes miúdos que ainda não viram os pais neste período de 14 meses.
Se pensarmos num contexto de Portugal teria um outro impacto, mas eu costumo dizer que os ucranianos são diferentes, são especiais e até posso dizer que esta situação caba por não ter grande impacto na formação deles, também as novas tecnologias permitem que falem todos os dias com a família o que ajuda a amenizar a distância.
Com o vosso trabalho é possível referir que estão replicadas as condições que eram proporcionadas aos jogadores quando estavam na Ucrânia, antes da guerra?
Não posso dizer que estamos numa situação igual aquela que estaríamos se estivéssemos a treinar na Ucrânia, porque temos falta de staff, os jogadores que são menores de idade sentem saudades dos pais.
Os homens não podem sair do país devido às regras impostas pelo governo ucraniano, as mães podem visitar os filhos, mas nem todas têm capacidade financeira suficiente.
Como é que é lidar com o desenvolvimento do talento, perante as condições desportivas em que estão inseridos?
O talento fica comprometido sobretudo pelo nível competitivo, como estamos a disputar os campeonatos regionais de Split, a oposição fica aquém da qualidade dos nossos jogadores e mesmo utilizando algumas estratégias como pedir aos nossos adversários que utilizem jogadores mais velhos ou pedir ao Shakhtar que se inscreva no maior número possível de torneios internacionais, acaba por não ser suficiente.
O exemplo disto foi a nossa recente participação dos na IberCup em Madrid e Cascais com as nossas equipas de sub14 e sub15, em que eu pensava que estávamos bem preparados, mas nos primeiros jogos percebi que estávamos a anos-luz do que normalmente conseguíamos fazer quando trabalhávamos na Ucrânia.
Há alguma forma de poder elevar os momentos destes jovens para que o talento não seja desperdiçado?
O momento competitivo do fim de semana não nos ajuda a desenvolver, o nível de competição fica aquém do exigido para que os jogadores possam dar 100% daquilo que sabem e que podem. Os cinco treinos da semana são importantes, mas é o jogo que diz o momento em que nos encontramos. Temos tentado que na próxima época seja possível competir com as nossas equipas nos escalão imediatamente acima.