Sobe e desce dos combustíveis. "Mercados estão a antecipar cessar-fogo" na Ucrânia
19-03-2022 - 09:31
 • Marina Pimentel

A escalada do preço dos combustíveis devido à guerra e a elevada carga fiscal é o tema em debate no Em Nome da Lei desta semana, com Pedro Silva, analista de mercado de energia da DECO Proteste, Carlos Barbosa, presidente do ACP, e o advogado fiscalista Samuel Fernandes de Almeida.

Os portugueses podem esperar uma descida do gasóleo e da gasolina na segunda-feira, porque os mercados estão a antecipar um cessar-fogo na guerra da Ucrânia, afirma o especialista da DECO Proteste, Pedro Silva, em declarações ao programa Em Nome da Lei da Renascença,

O analista de mercado de energia acredita que o preço dos combustíveis vai descer na proporção em que subiu no início desta semana. “O que se verifica desde o dia 10 e até hoje tem sido um decréscimo, a níveis históricos, pelo menos nos últimos anos, e que indiciam uma descida, se não acontecer nada de extraordinário num montante na mesma ordem da subida que ocorreu na semana que passou”, adianta Pedro Silva.

A descida do preço do barril do petróleo nos últimos dias, que perspetiva uma descida dos preços pagos em bomba na segunda-feira, resulta de “os mercados internacionais estarem a antecipar um cessar-fogo entre a Rússia e a Ucrânia”. Mas Pedro Silva alerta que os mercados andam, por estes dias, “muito voláteis, nenhuma descida ou subida é sustentável”. Dependendo do evoluir da guerra, os preços dos combustíveis podem voltar a subir e manter-se em alta.

Portugal é o sexto país da União Europeia (UE) que paga mais caro os combustíveis por causa dos impostos a que estão sujeitos. A carga fiscal (ISP - Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e IVA) pesa cerca de 50% no valor final. Pedro Silva garante que, “por cada litro de combustível em bomba, o Governo arrecada 1 euro, carga fiscal direta, mesmo com as medidas compensatórias que estão a ser aplicadas”.

Estado arrecada mais de 4 mil milhões/ano

Um crítico da elevada carga fiscal que pesa sobre os portugueses, o fiscalista Samuel Fernandes de Almeida fez as contas e diz que o Estado arrecada mais de 4 mil milhões de euros todos os anos, só com os impostos sobre os combustíveis.

“Não tenho ainda os números de 2021, mas a receita de ISP variou entre 3,3 e 3,5 mil milhões de euros, entre 2019 e 2020. E o IVA à volta dos 1,3 e 1,4 mil milhões de euros, o que significa que o Estado arrecada mais de 4 mil milhões de euros por ano, só com os impostos sobre os combustíveis”, contabiliza o advogado fiscalista.

Samuel Fernandes de Almeida lembra que Portugal tem a sexta gasolina mais cara da Europa, exatamente por causa da carga fiscal. Na mesma linha, o presidente do Automóvel Clube de Portugal (ACP), recorda que o setor automóvel representa 32% da receita fiscal do Estado”.

Quanto às margens de lucro das petrolíferas e da rede de distribuição, Carlos Barbosa diz que “é normal que queiram ter lucros”. O problema é que não há concorrência de preços dos combustíveis, por causa da posição dominante da Galp.

“O que acontece é que uma única entidade acaba por regular tudo. A Galp acaba por levar atrás as outras companhias de referência que existem em Portugal. Porque nós vamos numa autoestrada e vemos que os preços são todos iguais. Nós temos três tipos de bombas: as que pertencem às companhias petrolíferas, depois há as que, pertencendo às companhias, são exploradas por terceiros e depois há as que são de terceiros e exploradas por terceiros. E esses terceiros se quiserem modificar o preço em relação às bombas que são das companhias o que lhe acontece é que não conseguem ser abastecidos”, afirma o presidente do ACP.

“Aconteceu há uns anos um caso célebre, em Reguengos de Monsaraz, em que uma bomba da Galp esteve quase uma semana sem receber combustível. Você pergunta-me se há cartelização? Não há como provar que há cartelização. Mas agora que há uma tendência para as outras bombas seguirem o que faz a Galp, isso não tenho dúvida nenhuma que acontece”, analisa.

A concorrência é praticamente nula em Portugal, diz o presidente do ACP, “ao contrário do que acontece por exemplo em Espanha ou em França”. E esse é também um fator que pesa no facto de os portugueses pagarem preços tão altos pelos combustíveis.

Quanto vale uma eventual redução do IVA?

O Governo aguarda, entretanto, luz verde de Bruxelas, e a posse do novo Parlamento, para poder baixar a taxa de IVA sobre os combustíveis dos 23% para os 13%.

O analista da DECO Proteste, Pedro Silva, diz que, “na prática, essa alteração vai representar para os portugueses uma descida de 15 cêntimos do preço dos combustíveis, porque entretanto a medida de compensação em sede de ISP, previsivelmente, desaparece”.

Pedro Silva considera que “uma descida da taxa do IVA é muito bem-vinda, mas não resolve o problema de fundo”. O analista defende que “é preciso mexer em termos definitivos na fiscalidade sobre os combustíveis”.

Quanto à fixação de preços máximos, uma medida que também já foi admitida pelo Governo, o presidente do ACP não acredita que tenha um efeito positivo. “É um pau de dois bicos. É perigoso porque as gasolineiras vão ter tendência a estar sempre nos preços máximos. E o que era importante era termos concorrência”, defende Carlos Barbosa, em declarações ao programa Em Nome da Lei da Renascença, que é transmitido aos sábados, pouco depois do meio-dia.