Salvini acusado de gerar "crise artificial" para forçar remodelação do Governo
08-08-2019 - 18:34
 • Renascença com Reuters

Primeiro-ministro Giuseppe Conte reuniu-se com o Presidente, mas nada avançou sobre o encontro. Fonte da Liga diz que Salvini vai esclarecer a sua posição na próxima semana.

O primeiro-ministro italiano, Giuseppe Conte, reuniu-se esta quinta-feira com o Presidente do país, Sergio Mattarella, para discutir a situação política atual, perante rumores de um iminente colapso da coligação no poder.

A coligação, composta pelo populista MoVimento 5 Estrelas e a Liga (extrema-direita) de Matteo Salvini, está há vários meses a lidar com divisões internas por causa de uma série de políticas públicas.

As tensões, aponta a Reuters, atingiram um pico na quarta-feira, quando os dois partidos se colocaram em barricadas opostas durante uma votação no Parlamento sobre o futuro de uma contestada ligação ferroviária entre Itália e França.

De acordo com fontes governamentais, Conte não deu qualquer sinal de que pretende demitir-se do cargo de primeiro-ministro no seu encontro com Mattarella. Questionado pelos jornalistas sobre essa reunião, o chefe do Governo escusou-se a fazer qualquer comentário.

Ontem, durante um comício em Sabaudia, no sul de Roma, o líder da Liga e vice-primeiro-ministro, Matteo Salvini, proferiu um discurso carregado de indiretas sobre como poderia mandar abaixo o Governo que integra, sem no entanto avançar quaisquer informações concretas sobre que exigências ou condições terá apresentado a Conte para manter a coligação em funcionamento.

Era esperado que Conte desse uma conferência de imprensa esta tarde para levantar o véu sobre a saúde da coligação, um encontro com jornalistas que acabou por cancelar. Uma fonte da Liga disse à Reuters que Salvini vai clarificar a sua posição na próxima segunda-feira.

Atualmente, o MoVimento 5 Estrelas tem mais assentos no Parlamento do que a Liga, mas o partido de Salvini tem agora o dobro do apoio entre os eleitores, de acordo com sondagens recentes.

A Reuters recorda que, por várias vezes desde que a coligação entrou em funções, Salvini e outros elementos da Liga ameaçaram derrubar o Governo e forçar a marcação de eleições antecipadas quando negociações específicas não lhes correm de feição.

Uma crise governamental em agosto, com uma grande parte dos italianos de férias e com o Parlamento igualmente fechado para férias de verão, seria altamente incomum, acrescenta a agência.

Uma "crise de verão" artificial?

O Presidente, que é, como em Portugal, o único com poderes para dissolver o Parlamento, pode não querer fazê-lo até os deputados voltarem ao trabalho em setembro, altura em que começarão os debates e votações do Orçamento para 2020.

No contexto de eleições antecipadas, o MoVimento 5 Estrelas é o que mais tem a perder. Esta quinta-feira, o líder do partido, Luigi Di Maio, cancelou uma série de eventos públicos e acusou Salvini de estar a fazer "jogos políticos" para conseguir garantir mais ministros do seu partido na coligação, algo que o líder da Liga desmente.

A Liga continua a garantir que não quer uma remodelação governamental, mas sim ser mais ouvida numa série de áreas sobre as quais tem uma "visão diferente" do 5 Estrelas, incluindo infraestruturas, impostos, justiça, autonomia regional e relações com a União Europeia.

"Cada dia que passa é um dia desperdiçado", referiu o partido de extrema-direita em comunicado esta semana, citando as constantes querelas com o parceiro governamental. "Para nós, a única alternativa a este Governo é devolver aos italianos o seu poder de escolha com novas eleições."

Para Wolfgango Piccoli, da empresa de consultoria de risco político Teneo, as declarações e ameaças da Liga não devem ser levadas a sério.

"É improvável que esta 'crise de verão' bem orquestrada por Salvini conduza a eleições antecipadas antes do final do ano", diz o especialista à Reuters, citando 30% de possibilidades de tal acontecer. "O resultado mais provável é uma remodelação governamental que irá ver alguns ministros do M5S substituídos por figuras da Liga ou por figuras de confiança dos líderes do partido."