​Partido de Santana prevê financiamento por "crowdfunding"
09-02-2019 - 09:00
 • Eunice Lourenço e Paula Caeiro Varela

Aliança tem este fim de semana o seu congresso fundacional em Évora. No PSD, há quem receie que o novo partido possa fazer “mossa”.

O "crowdfunding" – que pode ser traduzido por financiamento coletivo ou colaborativo – é uma das fontes de financiamento previstas para o Aliança, o partido fundado por Pedro Santana Lopes, que começa neste sábado o seu primeiro congresso.

Este sistema de recolha de fundos, que tem estado no centro da discussão sobre a greve cirúrgica dos enfermeiros, passa geralmente por redes sociais ou plataformas digitais, sendo fixado um objectivo para a recolha. Embora esteja regulado em Portugal por lei (o regime jurídico do financiamento colaborativo de 2015) este tipo de recolha de fundos não está previsto na lei do financiamento dos partidos, que estabelece limites para os donativos individuais e diz que têm de ser feitos obrigatoriamente por cheque ou transferência bancária.

A lei do financiamento dos partidos também diz que não podem receber donativos anónimos. Ou seja, o "crowdfunding" para poder ser enquadrado na lei do financiamento partidário não pode permitir doações anónimas e tem de ser feito através de um meio (cheque ou transferência direta para o beneficiário e não para uma plataforma) que permita identificar o doador. Foi assim que António Costa teve de fazer na sua campanha para Lisboa quando decidiu usar o "crowdfunding" para financiar a produção de um vídeo de apelo ao voto.

O financiamento é um dos pontos dos estatutos do Aliança que serão apresentados neste congresso fundacional. Antes são apresentados a declaração de princípios (que diz que o partido tem três eixos: personalismo, liberalismo e solidariedade), os símbolos e o hino.

Segundo a proposta de estatutos, o Aliança parece ser um partido com uma organização muito semelhante ao PSD, ainda que com outros nomes para os mesmos órgãos: o principal órgão será o Congresso Nacional, o principal órgão entre congressos chama-se Senado Nacional; depois há uma Direção Política Nacional, que terá um presidente, que será Santana Lopes, e uma Comissão Executiva; e, no que diz respeito a órgãos de fiscalização, tem uma Comissão Jurisdicional e um Gabinete de Auditoria.

Haverá militantes (que pagam quota e têm direito a voto) e simpatizantes (só com direito a opinião e colaboração), os órgãos locais ficam por definir (terão sido já criadas comissões instaladoras em todos os distritos, nas regiões autónomas e nas comunidades da diáspora, os órgãos regionais são um desejo e os eleitos têm mandatos de três anos. O partido terá um “diretor executivo” com funções correspondentes ao cargo de secretário-geral do PSD ou do CDS.

“País às direitas”

O congresso de fundação do Aliança vai também discutir a moção de estratégia global de Santana Lopes, com o título “Um país às direitas” em que o ex-primeiro-ministro e ex-líder do PSD acusa o Governo do PS de estar a pôr em causa o esforço feito durante os anos da troika.

“O atual Governo, liderado pelo Partido Socialista, cedeu às pressões dos seus parceiros de extrema-esquerda, em diversas medidas que põem em causa o crescimento económico. Os resultados estão agora a ser cada vez mais expostos na praça pública. Medidas insensatas que põem em causa o esforço feito pelos Portugueses durante o período do resgate financeiro. Exige-se um caminho alternativo! Não podemos ser permissivos com preconceitos ideológicos impostos por esta Frente de Esquerda que apenas nos levam ao empobrecimento e ao definhamento da economia nacional!”, lê-se na moção de Santana.

“A Aliança nasce motivada pela urgência de invertermos o atual ciclo político e o combate à desertificação do interior é uma das nossas maiores causas fundadoras”, escreve também o ex-primeiro-ministro na moção em que expõe o que já foi feito e até analisa sondagens.

“Marcámos a agenda. Entrámos nas sondagens com 4%. Pese embora ainda sem representação parlamentar, a Aliança é hoje uma força credível e respeitada no quadro político nacional”, congratula-se Santana, que elege 10 “eixos prioritários”, a começar na competitividade e na redução da carga fiscal.

Vigilância a Marcelo

Na sua moção, Pedro Santana Lopes também traça desde já os três desafios eleitorais da Aliança. Primeiro, as europeias marcadas para 26 de Maio e em que a lista do partido será encabeçada por Paulo Sande, que deixou na sexta-feira as funções de consultor da Presidência da República. Paulo Sande será um dos oradores da tarde deste sábado, em Évora.

Depois, as regionais da Madeira “aproxima-se um novo ciclo político, em que a Aliança será chamada a exercer as suas responsabilidades no quadro resultante do parlamento regional, para tanto apresentando-se às eleições com um projeto e uma equipa inovadoras, procurando mobilizar os sectores mais dinâmicos da sociedade madeirense e porto-santense, os quais em vez de um mero rotativismo pretendem optar por uma verdadeira Alternativa, com renovadas energias e novos métodos”, escreve Santana.

Por fim, as eleições legislativas em que o ex-primeiro-ministro quer obter resultados que lhe “permitam um papel expressivo na vitória das forças democráticas do bloco de centro/direita sobre a Frente de Esquerda”. Esse papel expressivo passa por fazer parte de uma aliança pós-eleitoral de direita como Santana Lopes tem vindo a propor e que, na sua visão, deve incluir PSD e CDS.

Na moção, Santana diz que cabe agora aos outros partidos dar resposta ao seu desafio para uma coligação pós-eleitoral. Assunção Cristas, presidente do CDS, já tem admitido essa coligação. E algumas vozes no PSD, como a de Carlos Carreiras, também.

Quanto a presidenciais, Santana deixa em aberto um eventual apoio à recandidatura de Marcelo Rebelo de Sousa. Escreve que o seu novo partido “deve ser especialmente exigente com o chefe do Estado”, considera que Marcelo surgiu “talvez demais, em salvação do Governo”. E deixa um aviso: “Espera-se agora, no tempo que falta para concluir o mandato, que o PR se empenhe mais que na habitual solidariedade com o Governo, na prossecução dos grandes desígnios nacionais, como sejam o crescimento económico, a coesão territorial e as mudanças na Justiça.”

O congresso fundacional do novo partido de Santana realiza-se quase um ano depois do último congresso do PSD, em que Santana e Rio se uniram para listas conjuntas aos principais órgãos do partido, tentando passar uma ideia de união que rapidamente se esfumou e acabou mesmo com a saída do ex-primeiro-ministro do PSD.

Agora, no seu antigo partido as expetativas não são de um grande resultado eleitoral do Aliança, mas muitos reconhecem que Santana pode fazer “mossa” no PSD. Ou seja, pode não ter um grande resultado eleitoral, nem conseguir eleger deputados, mas distrito a distrito – por força do método de Hondt – pode roubar votos aos sociais-democratas que os impeçam de eleger mais deputados. Como exemplificava um dirigente do PSD à Renascença, em Braga ou Coimbra o partido de Santana pode não conseguir eleger um deputado, mas os votos que “rouba” ao PSD podem fazer com que o PSD eleja menos um deputado do que teria se não houvesse Aliança.