O veto presidencial
14-08-2020 - 11:17

O nosso regime democrático tem tido, felizmente, muitos sucessos. Mas também tem registado alguns fracassos. E um deles, porventura dos menos visíveis para a opinião pública - completamente alheada do assunto -, tem sido a forma como o regime, persistentemente, bloqueou o debate das decisões sobre a forma da nossa pertença às instituições europeias.

Merece todo o aplauso o veto do Presidente da República ao diploma sobre o acompanhamento das questões europeias pela Assembleia da República. Merece aplauso pelo acto em si em si próprio e também pela clareza da razão que o justifica. O Presidente constatou, simplesmente, que se o diploma fosse promulgado se reduziriam apenas a dois por ano, no nosso parlamento, em plenário, os debates sobre a União Europeia. Seria certamente inaceitável se tal sucedesse, mas não há surpresa nenhuma nesta tentativa de eliminação das questões europeias do debate público. Vem no seguimento de 35 anos de pertença à CEE, actual União Europeia.

O nosso regime democrático tem tido, felizmente, muitos sucessos. Mas também tem registado alguns fracassos. E um deles, porventura dos menos visíveis para a opinião pública - completamente alheada do assunto -, tem sido a forma como o regime, persistentemente, bloqueou o debate das decisões sobre a forma da nossa pertença às instituições europeias.

Logo desde o início, PS e PSD, por vezes, mas nem sempre, apoiados pelo CDS, monopolizaram as decisões e reduziram a quase zero o debate público sobre a nossa participação na integração europeia. Todos estamos lembrados da ópera bufa em relação a um possível referendo sobre as questões europeias: primeiro, não era possível realizá-lo por que a Constituição não o permitia. Depois, a Constituição foi alterada e o referendo foi prometido para muito breve. Depois, o referendo foi eliminado porque a Alemanha não quis que se realizasse. A seguir vem o Brexit, que só “prova” que os referendos (e já agora os debates públicos) não se devem realizar porque podem dar alguns amargos de boca a quem monopoliza as decisões, etc .

Agora já nem é o referendo. São os próprios debates que estão em causa. É a altura de relembrar que na ausência de debate efectivo e livre as decisões políticas são sempre deficientes, como deficientes - e muito - têm sido as que temos tomado relativamente à Europa.