A forma como os americanos interpretam o problema dos abusos sexuais na Igreja Católica varia consoante a identidade religiosa e, por vezes, da etnia.
Um estudo da prestigiada Pew Research Center revela que embora a maioria dos americanos acredite que o problema dos abusos diz respeito sobretudo à Igreja Católica, os próprios católicos consideram que é uma questão social, que também acontece noutras religiões e com igual, ou maior, frequência entre outros setores da sociedade que têm contacto com crianças.
Segundo o estudo, quase 80% dos inquiridos consideram que o problema dos abusos sexuais é uma questão que se mantém atual na Igreja Católica, com apenas 12% a dizer que diz respeito a situações que já estão no passado.
Entre os católicos a maioria também acha que o problema é atual, embora o valor desça para 69%, com 24% a dizer que diz respeito sobretudo a questões do passado. A discrepância é ainda maior quando a pergunta é sobre se os abusos acontecem mais na Igreja Católica do que noutras confissões religiosas. Aí 51% dos não-católicos dizem que o problema é prevalecente entre a hierarquia católica e 44% que acontece na mesma medida noutras religiões. Contudo, 61% dos católicos diz que o problema é transversal a todas as confissões, com apenas 33% a manifestar a ideia de que acontece mais na Igreja Católica.
O estudo revela algumas divergências étnicas. Entre católicos caucasianos, por exemplo, 39% consideram que o problema é mais comum na Igreja Católica do que noutras, enquanto esta visão apenas é partilhada por 22% dos católicos de origem hispânica.
Entre os não-católicos, ateus e judeus são os que têm uma visão mais crítica da Igreja. Ao todo 93% dos ateus considera que os problemas no seio da Igreja se mantêm, enquanto 72% dos judeus inquiridos considera que os abusos acontecem com mais frequência na Igreja Católica do que noutras confissões.
Papa com nota positiva
Outro tema que o estudo aborda são os efeitos que a crise tem tido sobre os fiéis. Entre os inquiridos católicos, 27% passou a ir menos frequentemente à missa e 26% passou a doar menos dinheiro à Igreja por causa do escândalo. Contudo, estes dados variam bastante consoante o nível de prática religiosa. Entre os que afirmam que vão à missa pelo menos uma vez por semana, só 15% é que admitem que a crise os levou a diminuir a prática e 20% a cortar nos donativos. Já entre os que vão com menos frequência, os números são 32 e 28%, respetivamente.
Um dos efeitos que esta última ronda da crise de abusos nos Estados Unidos tem tido é uma quebra na confiança em relação aos bispos e à sua capacidade de lidar com o assunto, particularmente depois de se ter sabido, no verão de 2018, que o responsável por elaborar e apresentar as orientações da Igreja americana para lidar com casos de abusos sexuais, o cardeal Theodore McCarrick, era ele próprio um abusador. McCarrick foi destituído do Colégio dos Cardeais pouco depois das revelações e, já em 2019, laicizado.
De acordo com o estudo da Pew, apenas 36% dos católicos americanos consideram que os bispos têm estado a lidar bem com esta questão. O caso muda bastante de figura quando questionados sobre o seu bispo em particular, com 49% a dizer que a atuação tem sido positiva. Já 55% do total considera que o Papa Francisco tem lidado bem com o assunto.
Mais uma vez, porém, os dados variam consoante a prática religiosa. Entre os católicos que vão pelo menos uma vez à missa 64% aprova da atuação do Papa Francisco, 66% do seu próprio bispo e 51% da conferência episcopal americana em geral. Para os que vão menos do que uma vez por semana à missa os valores são mais negativos, com 51% para o Papa, 42% para o próprio bispo e 30% para os bispos em geral.
A Pew informa que o estudo foi elaborado entre a cimeira sobre os abusos sexuais na Igreja convocada pelo Vaticano em fevereiro de 2019 e a emissão de orientações universais por parte do Papa Francisco, em março.
Outra conclusão do estudo é que cerca de sete em cada dez americanos ouviu falar mais na crise de abusos sexuais dentro da Igreja Católica do que noutras confissões, o que poderá refletir o facto de os casos ligados à Igreja Católica serem alvo da atenção da comunicação social com maior frequência do que os casos que se têm verificado noutras igrejas ou religiões.