Entre uma remodelação e um puxão de orelhas, os media optam pela remodelação
17-09-2020 - 12:14

Sempre que Marcelo surge do outro lado pronto a dar uma “bela pantufada” ao chefe do Executivo, este, com mestria inesperada, consegue tirar uma nova "selfie" com o Chefe de Estado a provar que não se passa nada. Pelo contrário, como irá demonstrar a nova foto, a sintonia é sempre total. Hoje vai ser mais um dia assim.

Costa é um verdadeiro artista em mudar o tema sempre que este se lhe torna desagradável e a gerir a seu favor a agenda mediática. Pior: é mesmo difícil contrariar a sua arte porque muito melhor do que Marcelo (acusado de ser o co-criador dos factos políticos) Costa consegue criar verdadeiras notícias que matam as que lhe podiam ser desagradáveis. Desta vez, coitados, foram quatro secretários de Estado que foram forçados a mudar de cadeiras só para que hoje estivéssemos a falar da sua posse com mais uma foto Costa/Marcelo em plena sintonia.

E o puxão de orelhas de Marcelo a Costa, que esperávamos desde o fim de semana? E o gravíssimo caso do apoio do Costa “cidadão” ao candidato Vieira à presidente de um clube? E a promiscuidade entre política e futebol? E o dever de reserva do primeiro-ministro? E as questões com o fisco ou as pressões sobre a justiça do “apoiado”? Nada. Já passou. Vai ser uma breve? Provavelmente.

Sempre que Marcelo surge do outro lado pronto a dar uma “bela pantufada” ao chefe do Executivo, este, com mestria inesperada, consegue tirar uma nova "selfie" com o Chefe de Estado a provar que não se passa nada. Pelo contrário, como irá demonstrar a nova foto, a sintonia é sempre total. Hoje vai ser mais um dia assim.

Alguém se lembra dos nomes dos ex-secretários de Estado que saem (espero que para belos cargos e nenhum para o desemprego)? Provavelmente, não. Nos governos de António Costa, os nomeados são frequentemente gente do partido que transita de uns cargos para outros de tal forma rápida que apenas nos lembramos de os ver algures nas empresas públicas ou nos mais variados cargos. Gente polivalente e resoluta. Sejam eles nomeados agora para a administração pública, depois para o mar, agricultura e florestas, ambiente ou obras públicas. Mas, em rigor, quase ninguém saberia ao certo onde estavam e o que faziam.

Num Governo de um homem só, para cúmulo o maior de sempre, onde Costa é o ministro de tudo, até os nomes de alguns ministros nos falham quanto mais os daquela lista infinita a que Cavaco Silva chamava “ajudantes” e que o atual chefe do executivo trata como verdadeiro material descartável. Talvez Jamila Madeira, por causa da presidência da Juventude Socialista e das mais recentes conferências de imprensa da DGS como adjunta na saúde fosse verdadeiramente conhecida. Mas, tratando-se da quarta mudança nas chefias de um ministério chave e em plena pandemia ,até aqui já estamos baralhados.

Na verdade, aos despedidos de ontem à noite correspondem outros tantos “santos da casa” promovidos. Quem? Ex-assessores, adjuntos e congéneres. Uma dança a pretexto da saída pré-anunciada de José Apolinário, secretário de Estado das Pescas, uma cara socialista muito conhecida do aparelho e que agora se ia candidatar à CCDR do Algarve. Já foi visto em tanto lado que poucos saberiam exatamente onde parava agora. Pelos vistos, fazia parte do Governo e, provavelmente, era até bastante bom. Agora, não sai sozinho porque isso, em si mesmo, já não era notícia. Era preciso que saíssem, com ele mais uns tantos.

É verdade que entre eles poderão estar, ou estarão certamente, gente competentíssima. Inês Ramires, por exemplo. Foi vista, enquanto chefe de gabinete de Brandão Rodrigues durante quatro anos, como a potencial substituta do ministro, o eterno “remodelável”. Não saiu ele, saiu ela. Agora, volta, inesperadamente, para secretária de Estado.

Em contrapartida, em plena abertura do ano escolar, salta Susana Amador, que, por via do calendário, era exatamente a pessoa que menos se previa que fosse dispensável nesta altura.

Não importa. É sempre inútil procurar uma lógica guiada pelo bom senso nestas mudanças. Hoje, era o dia do “puxão de orelhas a Costa” e era fundamental que se sacrificassem uns tantos.

Marcelo não podia fugir ao ralhete e era suposto aparecer com ar compungido, antes e depois da reunião das quintas-feiras, com o primeiro-ministro com “orelhas de burro” ou virado para a parede colocado de castigo pelo professor.

Há praticamente uma semana que os media andavam à espera disso. A capa do Correio da Manhã, de hoje, com mais notícias na linha Futebol Leaks, vinha mesmo a calhar para apimentar a coisa e não deixar esquecer que o primeiro-ministro não deixa de ser primeiro ministro, até quando vai ao futebol.

O mesmo primeiro-ministro que tinha despedido João Soares porque “nem à mesa do café” e menos ainda nas redes sociais se pode aparecer quando se é ministro da Cultura a prometer a um colunista um belo par de “bofetadas”. Na altura, o ministro da Cultura já não estava para maçadas, disse a Costa mais ou menos o que teria dito ao colunista se o tivesse apanhado no Chiado, mas saiu de fininho e sem dar nas vistas.

Também por isso Costa tinha mesmo de dar explicações a Marcelo e ao povo. Incluíndo aos benfiquistas de outros costados. Não vai dizer porque as palavras de Marcelo que vão sair para os jornais vão ser as de “desejos de bom trabalho e muito sucesso para os novos empossados” nas mais variadas funções. E a foto será, mais uma vez, de cordial cooperação estratégica. Isto depois dos empossados repetirem respeitosamente que juram servir com “lealdade, as funções que lhes forem confiadas, sejam elas quais forem”

Quando é que vimos isto pela última vez? Que me lembre foi em Maio. Recordando: no debate parlamentar de dia 8 Costa tinha garantido a Catarina Martins que sem auditoria conhecida, e estava mesmo para sair, não haveria nem mais um cêntimo para o novo banco.

Entretanto soube-se que, na véspera destas declarações, já tinha seguido a transferência ao abrigo das obrigações contratuais. António Costa não tinha nenhuma escapadela para dizer que “não sabia” porque a transferência foi feita no último dia do prazo, estava prevista contratualmente e inscrita no Orçamento debatido no Parlamento cerca de um mês antes. O debate parlamentar da tarde de dia 13 seria inteirinho reservado à questão.

Antes da previsível “coça” parlamentar. António Costa de visita à Auto-Europa viu o presidente lançar gasolina para a fogueira. Marcelo puxa o tapete ao ministro dizendo que Costa tinha dito muito bem que sem auditoria não devia seguir nenhum apoio para o novo Banco pelo que o ministro certamente não o informara como devia.

Costa não pensou duas vezes e sem a opinião do Partido nem conselho de ninguém resolve declarar apoio a Marcelo nas presidenciais. Assumindo-o como o vencedor das próximas eleições. A noite acaba com Marcelo e Centeno sorridentes a ultrapassar uma crise política que terá durado umas duas horas. A “mentira” de Costa dilui-se entre as bátegas de tanta água.