​A informação e a crise da condição humana
06-11-2017 - 08:08

“Parte das sociedades que celebram a ciência e a tecnologia modernas, e que mais lucram com elas, parece estar numa situação de bancarrota ‘espiritual’".

Há dias em que somos surpreendidos por algo que deveria ser banal: encontrar nos media alimentação para as nossas buscas e inquietações. E mesmo quando encontramos algo interpelativo, a vertigem das notícias e a sua volatilidade, aliadas à falta de tempo, fazem com que esse mantimento se eclipse sem o termos digerido devidamente e tirado dele tudo o que tinha para dar.

Na semana passada, encontrei alguns desses motivos, desses que nos dão o sentimento de que o tempo e o dinheiro que gastamos com informação não é mal empregado. Destaco as três peças (uma delas da Lusa) do jornal "Público" a propósito do novo livro do cientista António Damásio, intitulado “A Estranha Ordem das Coisas – A Vida, os Sentimentos e as Culturas Humanas” e, em particular, a edição do dia 2, com a antecipação de um excerto desse livro.

O texto é uma meditação sobre “a crise actual da condição humana”. Crise “curiosa” já que, apesar de situações geográficas e sociais distintas, suscitar respostas semelhantes “marcadas pela zanga, fúria e confronto violento, a par de apelos ao isolamento dos países e de uma preferência por governação autocrática”. Mas, ao mesmo tempo, crise “decepcionante, pois não devia de todo estar a acontecer”, se tivermos em conta as conquistas e recursos da civilização e as lições da Segunda Guerra e da Guerra Fria. “Parte das sociedades que celebram a ciência e a tecnologia modernas, e que mais lucram com elas, parece estar numa situação de bancarrota ‘espiritual’, tanto no sentido secular como religioso do termo”, sublinha Damásio.

Nesta crise, conta de forma saliente e poderosa o universo da informação e da comunicação. O autor lamenta “o tratamento cada vez mais deformado das notícias e das questões públicas”, pautadas pelo entretenimento da televisão comercial, e a “conversão de quase todos os ‘media’ de interesse público ao modelo lucrativo de negócios”. Perante a internet e as redes sociais, o autor alerta: “o público não dispõe nem de tempo nem de método para converter as quantidades imensas de informação em conclusões razoáveis e de uso prático”.

Para que textos como este não se eclipsem no turbilhão dos acontecimentos, é necessário estudá-los criticamente e deles tirar ilações. Desafio que cabe às instituições educativas e culturais assumir, incluindo os próprios media.