Valeu-nos Santos Silva!
21-04-2022 - 22:17

Sabe-se que a política, enquanto realidade humana, pode ser cínica e hipócrita, mas António Costa, ao fazer figura de corpo presente sem aplaudir Zelensky, fez-nos o favor de lembrar que assim é.

A sessão solene do Parlamento em que discursou o presidente Zelensky fica marcado pelo discurso brilhante do Presidente da Assembleia da República.

Augusto Santos Silva enunciou em poucos minutos as razões pelas quais as democracias não podem duvidar do apoio à Ucrânia.

Na guerra iniciada pela Rússia joga-se o futuro da liberdade e da paz e o presidente da Assembleia da República disse-o de uma forma cristalina que honra o país e as suas instituições.

Quase ao fim de dois meses de guerra com a Federação Russa, o presidente Zelensky descreveu atrocidades que alguns continuam a não querer ver e fez os apelos inerentes a quem se encontra em tão grande estado de necessidade.

Tal não significa que se possa fazer tudo e concordar com tudo o que o presidente Zelensky propõe ou defende. Mas a resistência da Ucrânia e do seu Presidente merece agradecimento e apoio de quem se opõe a qualquer tipo de ditaduras ou regimes autocráticos, sejam eles de esquerda ou de direita.

Ao fazer expressa referência ao 25 de Abril, o presidente da Ucrânia pretendeu sensibilizar todos aqueles que em Portugal prezam a liberdade e defendem a democracia. Algo que deixou incomodado o PCP que considerou um insulto tal referência.

Decididamente, o PCP perdeu a cabeça.

Depois de há quase 50 anos (após o 25 de Abril), querer impor nova ditadura em Portugal, o partido comunista coloca-se – objetivamente - ao lado da invasão militar russa, despreza o direito internacional, não condena as atrocidades e, apesar de tudo isso, continua a dizer-se ... ‘democrático’. Nunca o foi e pelos vistos nunca o será.

Um partido político baseado no medo interno e nos ‘controleiros’ que vigiam a cada passo o posicionamento político dos respetivos ‘camaradas’, não é nem pode ser considerado democrático.

Quando defendia a ditadura do proletariado, o PCP, em êxtase, contemplava a URSS como o sol que aquecia a terra. E fazia-o, desvanecido, num tempo em que já todos sabíamos que o proletariado nunca mandara no regime do Moscovo, antes era (mais uma) vítima de um partido comunista soviético imperial e dogmático.

Tantos anos depois, os comunistas portugueses continuam fiéis à defunta União Soviética, abraçando o papel de peões (in)úteis do Kremlin, talvez porque o poder de Putin, ele próprio ex-dirigente soviético, lhes traga as memórias de um passado que para milhões de pessoas significou morte, miséria e o mais profundo desprezo pelos direitos humanos.

Ninguém esperava que o PCP passasse a defender os Estados Unidos, cujas políticas, internas e externas, podem e devem ser criticadas. Mas a posição assumida na guerra da Ucrânia mostra que os comunistas portugueses ainda não fizeram o luto da União Soviética, não evoluíram, não são europeístas e não conseguem escapar às teias da sua própria decadência.

Infelizmente, nada disto surpreende. Mas nesta sessão parlamentar com Zelenski não deixa de ser triste que António Costa, acompanhado de alguns dos seus ministros, não se tenha dado ao trabalho de aplaudir o discurso do presidente da Ucrânia.

O primeiro-ministro de Portugal e os seus ministros foram as únicas pessoas que no hemiciclo de São Bento não se levantaram nem aplaudiram quando Zelensky terminou o seu discurso.

Parece que António Costa se terá baseado num costume parlamentar para não aplaudir um presidente estrangeiro. Se esse for o pretexto, estaremos então perante um verdadeiro conservador: nem os tambores da guerra nem o clamor pela liberdade comovem o primeiro-ministro português a violar tão venerável preceito.

Como se o regresso da guerra ao coração da europa, fosse coisa banal e de somenos; e que o discurso, na Assembleia da República, de um presidente estrangeiro cujo território está a ser barbaramente invadido, não passasse de mera formalidade.

Sabe-se que a política, enquanto realidade humana, pode ser cínica e hipócrita, mas António Costa, ao fazer figura de corpo presente sem aplaudir Zelensky, fez-nos o favor de lembrar que assim é.

Valha-nos, neste caso, Augusto Santos Silva. E também Marcelo Rebelo de Sousa que não deixou de se levantar e aplaudir o discurso do Presidente de um país, cuja população está a ser brutalmente agredida e chacinada aos olhos do mundo.