Para que serve o Estado?
22-11-2018 - 07:53

Entrámos na fase de sacudir a água do capote quanto à tragédia de Borba. O Estado português cada vez menos protege as pessoas.

Muita gente sabia que poderia acontecer uma tragédia como a de Borba, alguns até a previram – mas nada se fez para a evitar. Em síntese, este é mais um exemplo de como o Estado português não protege as pessoas.

O primeiro-ministro, António Costa, garantiu ontem que “o Governo não sabia que aquela era uma zona de risco". Estranha ignorância: também ontem a manchete do diário “Público” dizia: “Estado foi alertado cinco vezes para o risco de tragédia em Borba”. E acrescentava na sua primeira página: “Câmara (de Borba) e Direcção-Geral de Energia e Geologia ignoraram os sucessivos alertas sobre a iminência de um acidente na Estrada Nacional 255”.

É certo que aquela estrada passou em 2005 para a responsabilidade da Câmara Municipal, só que, como é habitual, não foi transferida para autarquia o dinheiro relativo a essa responsabilidade adicional. Mas a Câmara também é Estado e deveria ter proibido o trânsito automóvel naquela estrada. Na qual, aliás, não era respeitada a margem de segurança de 30 metros em relação às pedreiras. Em 2014 um relatório promovido por quatro empresas de extração de mármore defendeu o encerramento daquela estrada, tornada municipal.

Uma resolução parlamentar de 1994 (há 24 anos!) alertava para a necessidade de precaver situações de risco em estradas situadas em zonas de exploração mármores no Alentejo. Os engenheiros e técnicos do setor conheciam bem os perigos da situação. Etc., etc.

Mas o Estado parece ignorar quem conhece os assuntos. Talvez por já não ter os necessários quadros técnicos na Administração pública. É que a tragédia de Borba não é um caso isolado.

No ano passado foi a tragédia dos incêndios. E o governo abdicou de proteger os passageiros do caminho de ferro quando deixou de investir neste meio de transporte. Não passaram muitos meses desde que o Secretário de Estado do setor tentou tranquilizar os portugueses, afirmando que a situação era normal. Viu-se. E ainda não aconteceu uma tragédia ferroviária por sorte. Que não dura sempre.

O governo também não pode ignorar que os cortes, ou cativações, na despesa pública, não sendo reduções racionais de despesa, estão a dar cabo do Serviço Nacional de Saúde. Ou que a falta de meios humanos e materiais (carros, sobretudo) não permite à PSP acudir a vários pedidos de socorro. É esta a proteção do Estado português, uma das suas obrigações essenciais?