Vitorino e Santana. "Europa cada vez mais convencida de que a saída da Grécia do Euro é inevitável"
16-05-2015 - 18:12
 • José Pedro Frazão

Os comentadores do “Fora da Caixa” comentam o estado das economias europeias ao cabo do primeiro trimestre do ano. Em cima da mesa, ficam ainda as recomendações da Comissão Europeia para os países em desequilíbrio orçamental.

A Grécia caminha a largos passos para a porta de saída da zona euro. E a Europa está cada vez mais preparada para esse cenário, admitem António Vitorino e Pedro Santana Lopes.

"Hoje estamos mais próximos desse momento. Já começa a haver sinais de que há já quem tenha dado por adquirido que a Grécia vai sair. Ainda não é o meu caso, mas vejo cada vez mais gente, incluindo países importantes da União Europeia, convencidos de que é inevitável. Estamos preparados na zona euro? Ninguém sabe. É um salto no escuro", afirma o antigo comissário europeu que confessa que o tema está a provocar um grande cansaço na Europa.

Pedro Santana Lopes diz que "há quem pense que a Grécia pode prejudicar mais, continuando com este tipo de atitude dentro da União Europeia”.

“Não estou a dizer que penso isso. Nesta fase já estamos todos - economia, mercados, cidadãos, instituições - mais preparados para um cenário de saída da Grécia, do que estávamos há umas semanas ou meses. Se acontecer, será sempre duro. Mas julgo que todos têm estado a pensar como reagir, como preparar o dia seguinte. Isso está em cima da mesa de trabalho da generalidade dos responsáveis, dos agentes económicos, investidores e fundos de investimento. Se um dia destes tivermos essas notícias, não será já uma surpresa. Nem pouco mais ou menos", acrescenta Santana Lopes.

Caminho certo mas insuficiente
A zona euro acelerou o seu ritmo de crescimento no primeiro trimestre de 2015, apesar do abrandamento do crescimento na Alemanha. Portugal cresceu 1,4% em termos homólogos no primeiro trimestre do ano.

António Vitorino considera que a mensagem essencial destas previsões da Comissão é que "é necessário tornar sustentável esta retoma económica que está em curso na Europa. Para que ela não seja episódica, para que seja duradoura no tempo. O factor mais preocupante é que, num período de baixa do preço do petróleo e de desvalorização do euro, a principal economia exportadora da Europa, a Alemanha, tenha tido um abrandamento do seu crescimento económico".

Já Pedro Santana Lopes diz que estes "não são maus números. Mas não são os números de que a Europa precisava. Temos a situação insólita de vermos Finlândia e Grécia, países tão diferentes no seu perfil de União Europeia, entrarem na mesma zona vermelha, embora com quadros diferentes. A Europa precisa de uma dose de voluntarismo e de envolvimento dos seus dirigentes e das suas instituições, que aparecem agora com as recomendações específicas por países".

Esse detalhe nas recomendações, país a país, é um caminho correcto, diz Santana. "Se formos às recomendações genéricas - reformas estruturais, incentivo ao investimento, assegurar o prosseguimento de políticas orçamentais responsáveis -  dito assim, serve para todos e não serve a ninguém. Tem que se "abrir o melão" para cada caso". No entanto, as recomendações de pouco podem valer, admite Vitorino. "O Banco Central Europeu acha que estas recomendações são respeitadas em média à volta de 10%. O que revela que este mecanismo está longe de responder aos objectivos: permitir que cada pais identifique os seus problemas de competitividade e que os corrija. O que decidirá o destino da moeda única não é tanto saber se a Grécia fica ou sai. É saber se numa moeda com estas características, comum a 19 países e com níveis de desenvolvimentos muito diferentes, é possível corrigir os desequilíbrios que existem nesses países".

"Portugal pode sair do défice excessivo em 2015"
O antigo comissário europeu considera que um crescimento de 1,4% no primeiro trimestre do ano, acima da média europeia, é um dado positivo. "O que é preocupante no nosso caso é que há dois trimestres consecutivos que o desemprego volta a aumentar. Não é a mera retoma da economia que poderá resolver o problema muito grave do desemprego em Portugal", adianta António Vitorino que ainda assim está optimista. " Com 1,4 de crescimento homólogo neste trimestre, creio que, com um bom Verão e o turismo a dar bons resultados, a minha expectativa - e penso que é importante para o país - é que nós possamos sair do procedimento de défices excessivos durante este ano de 2015".

Por seu lado, Santana Lopes saúda os dados mas considera que alguns números nacionais ainda merecem mais debate. "Os sinais do investimento ainda são ténues. Se na campanha eleitoral portuguesa se debatesse, de facto, como aproveitar aquilo que vem para nós do Plano Juncker, junto com os fundos do quadro 2020, seria muito bom. E que cada partido diga o que tenciona fazer quando for governo, o que pensa da Europa neste aspecto. Ouço pouco. Andamos sempre à volta de casos, já sabemos que é assim. Oxalá a TAP se resolva depressa para passarmos a outros temas", desabafa o antigo primeiro-ministro.

Falta debate em Portugal
Em ano eleitoral, Santana considera obrigatório debater estes temas à luz do quadro europeu, face à grande influência que a União tem em Portugal. "É isto que faz muita, muita, muita falta nos debates eleitorais. No pingue-pongue que já existe em Portugal a propósito das diferentes propostas económicas (PS e coligação) há pouco enquadramento com aquilo que se passa a nível europeu. Há poucas referências às posições dos órgãos europeus e à comparação com o que se passa noutros países europeus".

O possível candidato presidencial sugere linhas de debate. "Esperava ver mais tratado pela oposição porque é que a Espanha está a crescer mais do que Portugal. E mais tratado por quem está no poder o que é que acontece com a insistência nas posições europeias num caminho que as conclusões do grupo de economistas do PS, apesar de levarem em conta os números da Comissão, mostram mais dissonância em relação às recomendações", rever Santana Lopes.

António Vitorino diz que os deputados passam ao lado das recomendações de Bruxelas a Portugal. " As recomendações deviam ser objecto de debate no Parlamento. O destinatário das recomendações é o Parlamento português, que tem que corrigir o défice estrutural em 0,6%. É o Parlamento português que recebe uma recomendação que diz que um problema sério da economia portuguesa é a dívida das empresas privadas, não tanto a dívida pública, de que tanta gente fala. É o Parlamento português que recebe a recomendação que tem que haver uma correlação entre a polícia de rendimentos e a produtividade da economia. Parece que o Parlamento português nem dá por estas recomendações", critica o antigo ministro do PS.

"O que está aqui em causa é que, enquanto nós vamos debater-nos para regular os ajustes de contas internos, estas recomendações vão sendo feitas. Vamos ser claros - isto não vai ter nenhuma tradução prática, a não ser depois de Outubro", acrescentou.

O programa “Fora da Caixa” é uma parceria da Renascença com a Euranet, que pode ouvir às sextas-feiras depois das 23h00.