IVA da luz em função do consumo pode "criar grandes disparidades entre os portugueses"
10-12-2019 - 19:42
 • Henrique Cunha , com redação

Economista João Duque alerta que famílias numerosas e habitantes de regiões onde o inverno é mais frio podem ser penalizados pela ideia do Governo.

A criação de escalões de IVA na eletricidade consoante os consumos é difícil de entender, de aplicar e pode criar disparidades entre os portugueses, afirma o economista João Duque.

O anúncio foi feito pelo primeiro-ministro no debate quinzenal. António Costa enviou esta terça-feira uma carta à presidente da Comissão Europeia solicitando a alteração de critérios do IVA da energia para permitir a variação da taxa "em função dos diferentes escalões de consumo".

João Duque manifesta muitas dúvidas em relação a esta medida. Admite ser “muito difícil” estimar o seu impacto, porque “não sabemos o limiar em que se vai solicitar essa diferença”.

“Eu acho isto muito complicado de fazer em termos práticos e até potencialmente suscetível de criar grandes disparidades ou diferenças entre os portugueses. Uma família que tem quatro ou cinco filhos - uma raridade já em Portugal mas que, supostamente, o Governo até devia de aplaudir dado o problema demográfico que temos - então essa família gasta mais ou gasta menos? Se calhar até gasta menos per capita, mas gasta mais no total! Então e depois o contador também conta as pessoas que lá estão dentro de casa ou não conta?”, pergunta o economista.

O ex-presidente do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) dá outro exemplo: o dos habitantes do interior que no Inverno consomem mais energia para se protegerem do frio.

"Fora das cidades há mais rigor, o inverno é mais frio. Então essas pessoas gastam mais? Claro que gastam! Mas estamos a penalizar aquilo que é a interioridade. A mim choca-me francamente este tipo de proposta, porque acho que até vai mesmo contra a construção do próprio código do IVA”, sublinha.

João Duque extrapola a aplicação do IVA variável na energia para o setor das bebidas, para enfatizar o que considera ser o caráter insólito da proposta.

“E se eu imaginasse isto aplicado por exemplo nas bebidas, então as pessoas que bebessem mais começavam a pagar mais IVA e então a pessoa ia para uma cervejaria e partir da terceira cerveja diziam-lhe: olhe a partir de agora o IVA é mais caro. Estou a caricaturar, mas isto é estranho para mim", sublinha.

Para João Duque, a proposta do primeiro-ministro não é mais do que uma justificação para que o IVA da eletricidade acabe por não descer.