Europa Digital. Uma grande oportunidade que até pode gerar desemprego
08-08-2015 - 19:20
 • José Pedro Frazão

Pedro Santana Lopes e António Vitorino defendem que o mercado único digital é a grande oportunidade da Europa em termos económicos. Uma mudança que vai trazer mais competitividade mas, avisam os comentadores, trará também uma factura pesada de desemprego.

Esta é a base da reindustrialização europeia, defende António Vitorino a propósito da criação de um mercado único digital europeu, cujas bases foram lançadas numa recente comunicação da Comissão Europeia.

“Não falamos de voltar a fazer a Siderurgia Nacional ali no Barreiro ou uma petroquímica. As indústrias do futuro vão ser completamente diferentes e estão ligadas ao digital. A reindustrialização europeia é a reindustrialização digital, que depende obviamente da inovação. Sem inovação dos investimentos europeus - para isso serve o plano Juncker -  não haverá reindustrialização europeia”, argumenta António Vitorino no programa Fora da caixa que, todas as sextas-feiras depois das 23 horas, debate temas europeus na Renascença.

Pedro Santana Lopes considera que o mercado único digital representa uma grande oportunidade em termos económicos para a Europa, admitindo que se muitas verbas do Plano Juncker forem encaminhadas para este projecto, “será uma excelente aplicação”.

O antigo primeiro-ministro diz mesmo que esta pode ser “a âncora do seu futuro desenvolvimento”, sublinhando a “poupança que representaria a possibilidade de acesso aos serviços de outros países a cidadãos europeus, quer pelos ganhos económicos que traria, produtividade, valor acrescentado a vários níveis, capacidade de contribuição no esforço de cada país na área da investigação e desenvolvimento cientifico”.

Grandes, pequenos e pequeninos
António Vitorino diz que, com a introdução das tecnologias de informação e comunicação nos processos produtivos, o tamanho das empresas deixa de contar tanto na conquista de novos mercados.

“Permitem dispensar muitas vezes a dimensão de escala para que as empresas possam aspirar a tocar mercados que até aqui só arriscariam se tivessem maior dimensão. Os incentivos são menos fiscais. São mais de criar os apoios necessários para que se arrisque, para que as empresas compreendam que introduzindo essas tecnologias elas têm mais capacidade de sucesso”, argumenta o antigo comissário europeu, que defende que, por esta via,  também as empresas portuguesas podem aproveitar para chegar a novos mercados.
 
“Os portugueses gostam sempre de se auto-flagelar. Achamos sempre que somos ‘pequeninos’, serei um dos poucos portugueses que têm alguma autoridade para dizer isso…”, graceja Vitorino para quem Portugal tem que ultrapassar “essa autoflagelação do ‘pequenino’ e perceber que estas tecnologias colocam mercados de enorme dimensão ao nosso alcance”.
 
 Santana Lopes antecipa uma “excelente capacidade de resposta” dos portugueses a este desafio digital, através das spin-offs das “boas universidades que temos” nesta área.

O antigo primeiro-ministro assinala que , apesar da crise, “se houve algo que se desenvolveu foram estas ‘start-ups' ligadas a Aveiro, Braga , Évora, universidades com muito bons resultados neste domínio”.
 
O risco do desemprego
Apesar das oportunidades, o mercado único digital traz riscos, reconhecem os comentadores do Fora da Caixa.
 
António Vitorino alerta que os ganhos de produtividade decorrentes deste programa vão ter duas consequências sociais muito sérias.
 
“Só terá emprego quem tiver qualificações adaptadas a este novo mundo. A preparação do ponto de vista educativo e de formação profissional para o mundo digital vai ser o "rubicão" que aqueles que quiserem ter emprego no futuro vão ter que atravessar. Em segundo lugar, os ganhos de produtividade muitas vezes traduzem-se em diminuição da necessidade de postos de trabalho. Vamos ter um problema estrutural de emprego resultante da agenda digital. É preciso saber qual é a dimensão social desta agenda digital”, adverte o antigo ministro socialista.
 
Por isso, Santana Lopes sugere a disponibilização de uma fatia da riqueza produzida no mercado digital para fazer face aos custo social deste plano.
 
“Nós hoje temos que medir o tempo de uma forma diferente. Aquilo que poderiam ser duas décadas de transição aqui há uns tempos, hoje em dia, pode ser uma década. Temos que encontrar um bilião destes biliões todos para a protecção dos desempregados de longa duração que hoje em dia vão para cima dos 45 anos até à idade da reforma, que pode acontecer a todo e a qualquer um por força desta reconversão”, remata o actual provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.

O programa Fora da Caixa é uma parceria Renascença/Euranet, para ouvir às sextas-feiras, depois das 23h00.