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A família Udnikov partiu-se. O pai de Mykyta, 19 anos, estudante de informática, ficou em Kharkiv. Por saber que pode surpreender o ouvinte, diz-me que fala a sério quando confessa que o pai faz coberturas para abrigos contra bombardeamentos.
Veio para Lviv com a mãe, que aqui tinha trabalho. O jovem Mykyta, dispensado da incorporação militar devido a problemas de visão, integra-se em ações de voluntariado e nos trabalhos manuais da comunidade que faz da população de Lviv um autêntico "exército civil" de resistência.
Kharkiv pode ficar sem pedra sobre pedra, mas este jovem ucraniano teme sobretudo pela face humana da cidade.
Na estação de comboios de Lviv há dois terminais de autocarros. O provisório foi transformado num parque de permanentes embarques de gente em fuga para o resto da Europa. Não muito longe das portadas da estação, sobram as velhas paragens para os autocarros que vão seguir para diversos pontos dos países vizinhos.
É lá que estão mãe e filha, duas mulheres de Odessa, lá longe, quase na Crimeia que a Rússia decidiu anexar.
Tatiena, actriz e professora, esconde mal a emoção e faz falar a razão que se impôs numa conversa de família num fim-de-semana de bombas.
Atrás dela, a filha vai ler por si o que a mãe aprendeu nos livros. Até chegar ao primo de Cracóvia, pensará em formas de refazer de forma remota o ofício de ensinar o que são o drama e a comédia. A guerra sobe ao palco na Ucrânia e Tatiana não quer esta peça no seu futuro e no horizonte da sua filha.
As filas da estação esmorecem mas resistem ao frio nocturno de Lviv. Numa porta lateral entram aqueles que vão para a Polónia em fuga da guerra.
É literalmente um entroncamento de espíritos inquietos, com os que entram na cidade para combater no leste, outros que vêm para ficar na cidade, os residentes que também se decidem pela fuga e ainda os que apenas transitam de cidade em cidade, como quem vai fazendo escalas em lugares cada vez mais afastados dos estrondos.
Marena deixou Kiev, a capital que resiste ainda de bandeira azul-amarela hasteada. A guerra é uma coisa feia e esta esteticista espera voltar para ajudar a disfarçar as feridas que o conflito possa trazer aos rostos do combate.
Não esperava largar tudo e não quer desistir nada dessa ideia de uma capital em paz, defendida também pela Europa que agora procura como abrigo temporário.
De Portugal, país do tal grande futebolista, espera remates à baliza russa, mesmo lá longe, detrás do meio campo. Toda a gente tem que ajudar na defesa, diz a morena Marena.