​Portugal terá menos três milhões em 2080. Mas isso é necessariamente mau?
01-04-2017 - 11:39
 • João Carlos Malta

A presidente da Associação Portuguesa de Demografia responde que “nim”. Pode não ter apenas consequências negativas, mas que as terá, terá. E a desertificação do interior será ainda mais real.

Primeiro os números: o Instituto Nacional de Estatística (INE) divulgou na semana que acaba um estudo que aponta que em 2080, seremos 7,5 milhões em Portugal, haverá apenas 900 mil jovens com menos de 15 anos, e o número de idosos será de 2,8 milhões. Mas será tão negativo sermos menos? Que consequências é que isso terá?

A presidente da Associação Portuguesa de Demografia, Maria Filomena Mendes, responde que “não é necessariamente mau, mas talvez não corresponda ao que os portugueses esperariam.”

“Não é mau termos uma população envelhecida, não é mau termos uma população com uma esperança média de vida elevada, provavelmente poderá ser mau termos uma natalidade tão baixa porque ela fica abaixo do número de filhos que os portugueses tencionam ter”, defende a especialista.

“Termos famílias sem filhos ou só com um quando queriam ter dois, pode ser mau. Não só teremos menos jovens como poderemos ter casais mais insatisfeitos”, argumenta.

A demografia e a economia também estão ligadas. O INE revela nas projecções que faz que a população activa que em 2080 haverá menos três milhões de pessoas activas (3,8 milhões de pessoas). Isso terá impacto no mercado de trabalho.


Números a reter

7,5 - Portugal perderá população, dos actuais 10,3 para 7,5 milhões de pessoas, ficando abaixo do limiar de 10 milhões em 2031.

900 - O número de jovens diminuirá de 1,5 milhões para os 900 mil.

2,8 - O número de idosos passará de 2,1 para 2,8 milhões.

317 - Face ao decréscimo da população jovem, a par do aumento da população idosa, o índice de envelhecimento mais do que duplicará, passando de 147 para 317 idosos, por cada 100 jovens, em 2080.

3,8- A população em idade activa diminuirá de 6,7 para 3,8 milhões de pessoas.


“Se tivermos um grande conjunto de pessoas na idade de reforma pode criar contrariedades e diminuir o crescimento económico, mas por exemplo se aumentar a produtividade e se tivermos uma população activa mais inovadora e mais qualificada, podemos mitigar o efeito de um elevado número de pessoas em idade mais avançada”, contrapõe Maria Filomena Mendes.

Essa transformação obrigará a transformações do mercado de trabalho, que podem passar por as pessoas com mais de 65 anos serem obrigadas a continuar a trabalhar. “Haverá nos próximos 60 anos uma adaptação no mercado de trabalho e que poderá fazer com que a evolução da população não seja também a que se prevê”, argumenta.

A presidente da Associação Portuguesa de Demografia pensa que o envelhecimento da população no ponto em que estamos é inevitável. Isso decorre de nas últimas décadas termos uma população que ”vem perdendo jovens e ganhou população em idades mais avançadas.”

Já hoje a dualidade entre litoral e interior é manifesta a diversos níveis, sendo que a população residente e a natalidade se tornam causa e consequência desses desiquilibrios. A demografa afirma que isso se irá manter “se nada for feito em contrário”, é que também neste campo será inevitável o despovoamento cada vez maior do interior e uma concentração em algumas áreas do litoral.

“Se deixarmos a demografia continuar as tendências dos últimos anos, sendo que actualmente já há regiões do país em que não temos população em idade activa jovem, nem população em idade fértil. Em muitas zonas do país há uma população já em idade avançada que não vai ter filhos, e os poucos jovens que há, saem dessas regiões porque não têm emprego”, ilustra.

A especialista critica ainda aquilo que considera ser a dissonância entre o discurso político e a tomada de medidas concretas no terreno. “Normalmente quando se tomam as decisões políticas a demografia não é equacionada porque se fosse, algumas situações não teriam acontecido. Tem de haver mais do que uma preocupação no discurso e têm que ser tomadas decisões que têm de ser transversais e a todos os níveis”, remata.