Do aeroporto à TAP. As polémicas de Pedro Nuno Santos no Governo
30-06-2022 - 15:16
 • Olímpia Mairos , Fábio Monteiro

O cenário chegou a estar no horizonte mediático, mas António Costa aterrou em Lisboa, vindo da cimeira da NATO, e não demitiu o ministro das Infraestruturas. Desde 2018 que a relação entre os dois socialistas registou sobressaltos. E o primeiro-ministro já tirou o tapete a Pedro Nuno Santos – putativo sucessor na liderança do PS - em mais do um momento nos últimos anos.

O Governo abanou no último dia, com a polémica do novo aeroporto, mas o ministro das Infraestruturas não caiu.

Menos de 24 horas depois de Pedro Nuno Santos ter anunciado - a maior obra pública em Portugal em décadas – que a solução para o novo aeroporto de Lisboa seria juntar Montijo e Alcochete, e que o atual aeroporto Humberto Delgado era para desmantelar, António Costa puxou-lhe o tapete, mas não houve demissão.

O primeiro-ministro revogou esta quinta-feira o despacho do ministro das Infraestruturas relativo ao novo aeroporto. Em comunicado, o gabinete de António Costa justificou a decisão dizendo que a solução “tem de ser negociada e consensualizada com a oposição, em particular com o principal partido da oposição”. Mais ainda: “em circunstância alguma”, a resolução seria tomada “sem a devida informação prévia ao senhor Presidente da República”.

Fonte próxima do processo garantiu à Renascença que António Costa não tinha conhecimento da existência do despacho publicado na quarta-feira à tarde.

Esta quinta-feira à tarde, o ministro Pedro Nuno Santos admitiu "falha relevante" no processo, mas não se demitiu.

Tête-à-tête no PS

Desde o início da semana, António Costa tem estado por Madrid para a cimeira da NATO. Da capital espanhola, já esta quinta-feira, fez saber que, quando chegar a Portugal, “se for necessário” dirá “mais qualquer coisa” sobre a revogação do despacho.

Na quarta-feira à noite, Costa deu tempo para Pedro Nuno Santos ir à RTP justificar a decisão (entretanto anulada) quanto ao novo aeroporto de Lisboa.

O ministro defendeu que Portugal "não podia esperar tanto tempo" para uma nova decisão, por estar a perder "milhares de milhões de receita" devido à falta de uma nova plataforma aeroportuária.

“Precisamos de ter uma resposta rápida o quanto antes. E essa resposta é o Montijo”, disse.

Visto por muitos socialistas como um dos putativos sucessores de António Costa na liderança do Partido Socialista, não é ainda claro como é que este desenlace irá afetar as aspirações de Pedro Nuno Santos. Também não se sabe o porquê de António Costa não ter logo revogado o despacho assim que foi conhecido.

A rutura com o primeiro-ministro, em todo o caso, não é uma surpresa. Pelo menos desde 2018, quando o primeiro-ministro tirou Pedro Nuno Santos do lugar de interlocutor principal com os parceiros da geringonça (promovendo-o de secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares para ministro das Infraestruturas), que as relações entre António Costa e Pedro Nuno Santos “esfriaram”, sabe a Renascença.

Aliás, esta não foi a primeira vez que Costa desautorizou publicamente o ministro. No ano passado, o primeiro-ministro obrigou Pedro Nuno Santos retirar o convite a Miguel Frasquilho para continuar à frente da TAP como chairman e a apresentar outros nomes.

Depois, quando o ministro das Infraestruturas disse que tencionava sujeitar a votos no Parlamento o plano de reestruturação da TAP, foi também forçado a recuar.

Publicamente, o ministro assumiu a derrota: “Queria a TAP votada no Parlamento. Não consegui. É pena.”

O homem geringonça

Se António Costa tem o mérito de ter, em 2015, montado a geringonça com o PCP e o Bloco de Esquerda, conseguindo assim chegar ao poder e governar, Pedro Nuno Santos ficou com os créditos de fazer a solução funcionar. Os dois políticos são de fornadas da JS diferentes e, no espectro ideológico dentro do PS, estão afastados.

Pedro Nuno Santos, natural de São João da Madeira, tem 45 anos e é licenciado em Economia pelo ISEG, instituição da Universidade Técnica de Lisboa na qual foi presidente da Mesa da RGA (Reunião Geral de Alunos). Entrou no Parlamento em 2005, onde foi deputado na X e na XII legislaturas, após um breve intervalo para ajudar na gestão da Tecmacal, na capital do calçado, ao lado da irmã e do pai.

Conotado com a ala mais à esquerda do PS, Pedro Nuno Santos ficou conhecido, em 2011, por defender que Portugal devia suspender o pagamento da dívida soberana.

Num jantar de Natal do PS em Castelo Branco, o então vice-presidente da bancada socialista afirmou que se estava a “marimbar para o banco alemão que emprestou dinheiro a Portugal nas condições em que emprestou”.

“Se não pagarmos a dívida e se lhes dissermos as pernas dos banqueiros alemães até tremem”, disse até.

Há pelo menos três anos que Pedro Nuno Santos começou a preparar terreno para chegar à liderança do Partido Socialista. O ministro tem vindo, desde 2019, a aumentar a sua influência junto das concelhias e estruturas do PS, e tem “operacionais em quase todos os gabinetes ministeriais", asseguraram fontes do PS à Renascença.