Autarca de Loures diz que Moedas lhe pediu desculpa depois do discurso de Cavaco
21-03-2023 - 07:00
 • João Carlos Malta

Os presidentes de câmara socialistas Ricardo Leão e Luísa Salgueiro abandonaram as comemorações dos 30 anos do Programa Especial de Realojamento durante a intervenção de Cavaco Silva. Ricardo Leão, autarca de Loures, explica à Renascença o porquê da atitude e conta como que o anfitrião Carlos Moedas reagiu.

O presidente da Câmara de Loures, Ricardo Leão, garante que o presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, lhe pediu desculpas após o discurso de Cavaco Silva pautado por críticas ferozes ao Governo.

O episódio ocorreu durante a intervenção do ex-Presidente da República nas comemorações dos 30 anos do Programa Especial de Realojamento (PER).

Ricardo Leão e a presidente da Câmara de Matosinhos e também líder da Associação Nacional de Municípios, Luísa Salgueiro, abandonaram a sala enquanto Cavaco arrasava o programa “Mais Habitação” lançado recentemente pelo Governo socialista.

O autarca de Loures recorda à Renascença todos os contornos que antecederam a saída da sala. “A sessão correu toda ela muito bem. Houve diferentes pontos de vista, [foram apresentados os] resultados do PER, o que foi bom, o que foi de mau, e os problemas depois que surgiram a seguir”, explica.

Tudo bem, segundo Ricardo Leão, até à intervenção de Aníbal Cavaco Silva. “Esta era uma atividade da Câmara de Lisboa e eu pensei, sinceramente, que estava num comício do PSD”, comenta. “E eu, para comícios do PSD não vou”, explica.

Leão qualifica as palavras de Cavaco como “deselegantes” e “inoportunas”. “Foi a opinião que tive, partilhei com a senhora presidente da Câmara de Matosinhos, Luísa Salgueiro, e ausentamo-nos”, afirma.

O presidente da Câmara de Loures diz que Carlos Moedas compreendeu a atitude. “Pediu-me desculpa por isso, porque é algo que saiu fora daquilo que estava programado e transformou-se num autêntico comício do PSD”, confidencia.

A Renascença tentou confirmar junto de Carlos Moedas esta versão dos acontecimentos, mas o social-democrata, líder da autarquia da capital, não quis comentar.

Reação oposta à que é atribuída a Carlos Moedas teve o presidente do PSD, Luís Montenegro, que falando sobre a atitude dos dois socialistas disse que “é muito sintomático que o PS reaja mal e que, mesmo na própria sessão onde tive a ocasião de estar presente, os autarcas do PS e, em particular a presidente da ANMP, não tenha tido a humildade de ouvir as críticas ao Governo”.

Ainda por cima, acrescentou, “tratando-se da presidente de uma Associação dos Municípios que contempla naturalmente presidentes de câmara municipal do partido dela, mas também do PSD, do PCP, de todas as forças políticas e até de cidadãos e grupos independentes, não tenha, enfim, o respeito e a humildade de ouvir aquelas que são considerações legítimas, mesmo que ela discorde delas, do senhor Presidente Aníbal Cavaco Silva”.

Já dentro da sala, no seu discurso perante militantes transmontanos, Luís Montenegro voltou ao assunto e acusou os socialistas de falta de “fair-play democrático”.

Para o presidente do PSD, esta atitude “demonstra, aliás, uma forma de estar que, infelizmente, o PS vem incutindo no país que é demasiado tribal no que diz respeito à convivência democrática entre forças políticas”.

Já Ricardo Leão, convidado a comentar as palavras de Cavaco Silva que tiveram elevado eco público, declarou: “Percebo que o Sr. Aníbal Cavaco Silva tenha pouco tempo agora de antena, aproveitou aquilo e fez um comício político no qual não tinha de estar presente”, qualifica.

Sobre o teor da intervenção de Cavaco, o autarca socialista define-o como “revanchista”, em que este “fez um conjunto de críticas sem apontar nenhuma solução”.

Ainda questionado se a atitude que os dois socialistas tomaram não denota falta de capacidade de encaixe às críticas, Ricardo Leão reforça que foi convidado para uma iniciativa da Câmara de Lisboa e não uma atividade partidária do PSD.

“Se eu for convidado para uma sessão do PSD, decido se vou ou não. Se tomar a decisão de ir, tenho de aceitar a crítica e tenho de lá estar. Mas fui ali enquanto presidente da Câmara de Loures convidado pelo presidente da Câmara de Lisboa para uma iniciativa da autarquia. Aquilo transformou-se numa atividade partidária do PSD. Aceito as críticas, mas depende do local e do tipo de evento”, explica.

Achei que estava ali um bocadinho a mais”, rematou.

A Renascença contactou a presidente da Câmara de Matosinhos, Luísa Salgueiro, que fez saber que, para já, não deseja comentar o que se passou na comemoração dos 30 anos do PER.

Ainda no sábado, o PS reagiu as críticas de Cavaco Silva através do secretário-geral adjunto do PS, João Torres, que acusou Cavaco Silva de estar desatento às medidas de habitação do Governo e de continuar a usar um "espírito destrutivo" relativamente ao executivo.

O "número dois" do PS reagia às declarações de este sábado do também antigo primeiro-ministro social-democrata para o setor da habitação e da sua conclusão de que a crise nesse domínio "é resultado do falhanço da política do Governo", manifestando "muitas dúvidas" quanto ao sucesso do pacote do executivo, que considerou ter um "problema de credibilidade".