Directores de hotéis defendem "contratos zero" para os picos de procura
07-04-2017 - 00:43
 • Ana Carrilho

Em entrevista à Renascença, o presidente da Associação de Directores de Hotéis de Portugal diz que o modelo implementado no Reino Unido pode ser bom para os patrões e para os "funcionários que recebem muito poucochinho”.

A possibilidade de recurso aos chamados “contratos zero horas” para fazer face aos picos de procura é uma das possibilidades que os diretores de hotéis discutem no seu congresso, que termina esta sexta-feira em Vila do Conde.

Em entrevista à Renascença, o presidente da Associação de Directores de Hotéis de Portugal (ADHP), Raúl Ribeiro Ferreira, argumenta que há alturas em que os hotéis têm mais hóspedes e os trabalhadores efectivos não chegam para fazer face ao trabalho acrescido.

Sublinhando que o princípio deve ser o da existência de uma relação contratual, Raul Ferreira questiona “como é que se contrata uma pessoa só para um jantar ou um almoço, para um dia ou um evento? É uma dificuldade para os directores”, reconhece.

Normalmente recorrem às empresas de trabalho temporário. Mas o presidente da ADHP refere que o “contrato zero horas” – que é utilizado no Reino Unido - seria mais uma alternativa para a angariação de mão-de-obra, fazendo os necessários descontos para a Segurança Social e Finanças, mas sem passar pelas empresas de trabalho temporário que, “obviamente ficam com uma parte que poderia ir para os funcionários porque o que este recebem é muito poucochinho”.

Por isso, o “contrato zero horas” entra na discussão no congresso da Associação, em que que também participa um inspector da Autoridade para as Condições de Trabalho para avaliar a legalidade e impacto que teria no mercado de trabalho.

O que é o “contrato zero”?

O modelo “inventado” no Reino Unido há alguns anos estabelece que os empregados não têm que cumprir um número de horas certo mas, em compensação, têm que estar sempre disponíveis quando a empresa os chamar.

Cerca de um milhão de pessoas trabalham, actualmente, segundo este esquema em terras de Isabel II. O número aumentou cinco vezes desde 2011 e reforçou-se no período de recuperação da crise. Ou seja, não é uma resposta conjuntural e foi-se tornando natural.

Jovens, mulheres e estrangeiros são as pessoas normalmente abrangidas por este “contrato zero”, em que ganham apenas as horas que fazem.

Num dia podem ser 12, 14 ou mais e noutro, uma ou duas horas. Podem estar dias sem trabalho ou ser obrigados a trabalhar sem descanso durante semanas.

Recebem bem menos que os efectivos, mesmo que desempenhem a mesma função. Esta flexibilidade máxima faz com que as pessoas não possam dispor da sua vida. Descontos para a Segurança Social ou seguros assim como pagamento de impostos não há, na maior parte dos casos, a não ser que os próprios trabalhadores se responsabilizem por eles.

No Reino Unido, é um esquema largamente usado no sector do turismo: hotéis, restaurantes, animação turística, lazer.

Hotéis remodelados. Agora é preciso pensar nos profissionais

Numa altura em que o turismo ganha importância na economia nacional, Raúl Ribeiro Ferreira assume que é preciso aproveitar o crescimento que, por enquanto se concentra mais em Lisboa, Porto e Algarve, e alargá-lo a outras regiões em que os hotéis ainda vivem com muitas dificuldades, taxas de ocupação relativamente baixas e com pouca rentabilidade.

Em entrevista à Renascença, o presidente da ADHP defende que é necessário apostar na qualidade dos produtos e serviços oferecidos aos clientes.

“Temo-nos preocupado em rentabilizar as empresas, em remodelar e fazer crescer as unidades, mas temos esquecido as pessoas. E os recursos humanos são uma parte muito importante deste sector. Se melhorarmos as qualificações vamos dar um grande passo na qualidade e na rentabilidade da oferta. Apesar de haver cada vez mais alunos nas escolas de hotelaria e turismo, metade das pessoas que estão há mais tempo no sector têm pouca formação. Por outro lado, “temos dificuldade em fixar os melhores nos hotéis porque eles emigram ou vão para outros sectores, onde ganham, em média, mais 33% no exercício de funções semelhantes”, admite Raul Ferreira.

Esta realidade poderia levar a que os salários fossem mais altos. Raúl Ferreira contra-argumenta com o crescimento desigual que impede que hotéis pequenos ou em zonas menos procuradas sejam suficientemente rentáveis para ter um quadro permanente bem pago. Mas mostra-se convicto que, em breve, essa situação poderá melhorar.

Os colchões são todos iguais. O que vale é a experiência única

Saber comunicar as experiências é um desafio diário para os directores de hotéis. “Os quartos são todos iguais, os colchões são feitos no mesmo sítio, as televisões são iguais, os tapetes verdes, amarelos ou rosa mas já está tudo inventado”, frisa Raúl Ferreira, para quem a diferença se faz com a experiência que se proporciona ao cliente e que deve envolver cada vez mais a comunidade em que o hotel está inserido e a diversidade de produtos e serviços existentes.

Por isso, considera que é preciso saber passar a mensagem. Porque para cada cliente existe uma forma diferente de comunicar.

“Se o fizermos de forma errada, pode ser contraproducente e defraudar as expectativas do hóspede.” Razão pela qual o presidente da ADHP defende que é uma área que precisa cada vez mais de ser profissionalizada, recorrendo a especialistas em marketing e comunicação.