Lavagem de dinheiro, compra de jogadores e de juízes, escolha de árbitros. Os seis casos judiciais do Benfica
26-06-2018 - 12:00
 • João Carlos Malta

O universo benfiquista está, há um ano, a ser abalado por uma catadupa de processos judiciais. Chegou-se à meia-dúzia. Os encarnados rejeitam qualquer ato ilícito, mas a pressão motivada pelas denúncias e investigações permanece alta.

O Sport Lisboa e Benfica, mais do que títulos, tem colecionado, no último ano, uma série de processos de investigação criminal, todos eles ligados a casos ilícitos relacionados com o futebol.

São já seis, sendo que esta segunda-feira foi conhecido o último caso, denominado “Mala Ciao”, que liga os benfiquistas à compra de jogadores para perderem contra a equipa encarnada e para ganharem ao FC Porto.

Há de tudo um pouco nesta meia dúzia de processos, desde um alegado esquema de corrupção de arbitragem para beneficiar o Benfica, à ideia de fazer pagamentos fictícios para pagar menos impostos, o que pode configurar crimes como fraude fiscal e ou lavagem de dinheiro.

O Benfica está ainda indiciado da compra de jogadores para ganhar e perder jogos, em mais do que uma época desportiva.

Os encarnados têm negado sucessivamente o envolvimento em práticas ilícitas, mas os rivais continuam a afirmar que onde há fumo, há fogo.

Recordemos então um a um os casos de justiça que envolvem o clube da Luz e que deixam o Benfica debaixo do radar dos investigadores.

Caso dos emails

A 6 de Junho de 2017, o assessor de comunicação do FC Porto, Francisco J. Marques, anuncia, num programa do Porto Canal, estar na posse de vasta documentação que prova a existência esquema de corrupção na arbitragem para beneficiar o Benfica.

O diretor de conteúdos da Benfica TV, Pedro Guerra, era o alvo principal, juntamente com o ex-árbitro da Associação de Futebol de Braga Adão Mendes. Guerra é ainda acusado de monitorizar informação interna e auditorias da Federação Portuguesa de Futebol.

Um dia depois, a 7 de Junho, o Benfica reage às acusações e revela a intenção de avançar com um processo de difamação e calúnia e outros processos. Considera o clube da Luz que os e-mails servem para “desviar as atenções”.

Guerra também reage com um "delay" de três dias em relação à denúncia do caso. E diz que "que o Benfica vai continuar a ganhar, seja futebol, seja no basquetebol, no voleibol, no hóquei em patins, no andebol, no atletismo".

"É esta a resposta que tenho a dar. O Benfica continua a trabalhar, segue o seu rumo independentemente de toda a boataria, de todas as mentiras. O Benfica não pára", reforça Guerra, sem negar nem confirmar a veracidade dos e-mails.

Mais tarde, na TVI, Guerra acabou por admitir a existência dos e-mails, mas disse não se lembrar dos seus conteúdos.

O presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira, também comenta e, num discurso em que o vernáculo foi pontuação, disse: "Em relação aos e-mails, desculpem falar à português, tanta m… e zero. Não temos medo de ninguém, nunca comprámos um filho da p... de um resultado".

O Benfica anunciará, depois, ações judiciais contra os presidentes do Sporting e do FC Porto, medida que será reforçada meses depois pelo facto de os encarnados se queixarem da violação da correspondência interna do clube. O assessor de comunicação do Benfica, Luís Bernard, diz que o Portugal não pode ser um “paraíso do cibercrime”.

Mais tarde na investigação, Francisco J Marques junta novidades ao caso: há mais correspondência eletrónica entre dirigentes do Benfica e elementos da arbitragem. Marques dá a conhecer a troca de e-mails entre o assessor jurídico da SAD do Benfica, Paulo Gonçalves, e o delegado da Liga de Clubes Nuno Cabral. Nesta correspondência, é pedido ao Benfica que mova influência para ajudar a carreira de árbitros, concretamente, neste caso, Manuel Mota.

Em outubro do ano passado, a PJ fez buscas na Luz, sendo Paulo Gonçalves constituído arguido.
O caso ganha cariz político quando o secretário de Estado da Juventude e Desporto, João Paulo Rebelo, afirma, em entrevista à Renascença, a intenção de vierem a ser previstas sanções e punições para discursos difamatórios ou acusatórios no futebol português .

Em fevereiro deste ano, o Tribunal de Relação do Porto dá razão ao Benfica e o FC Porto é impedido de continuar a revelar conteúdo dos e-mails.

Mais tarde, em abril, a revista Sábado avança novos conteúdos, entre os quais o de um "powerpoint" em que a Benfica SAD assumia, internamente, como objetivo, em 2012, o "reforço" e "controlo" sobre "conselhos de arbitragem", "poder político", "media" e "judicial".

A questão passou por uma reunião de quadros benfiquistas, realizada a 18 de Junho de 2012, em que essa mensagem foi passada através da apresentação desse "powerpoint".

Em setembro, a mesma revista revelou que os segredos do Benfica foram roubados por um hacker português que vive na Europa de Leste.

Ainda não tem trinta anos e é um “génio da informática”. Rui Pinto será, segundo a “Sábado”, o principal suspeito da Polícia Judiciária de ter furtado milhares de emails e documentos ao clube da Luz.

O pirata informático terá sido apanhado pela primeira vez depois de desviar 270 mil euros de um banco das ilhas Caimão. Franscisco J. Marques, já reagiu afirmando que não sabe se Rui Pinto é ou não um pirata informático. Apenas garante que os e-mails são verdadeiros e qie a PJ sabe como é que ele acedeu à informação.

E-toupeira

Em consequência do caso dos emails, nasce o e-toupeira. Paulo Gonçalves, assessor jurídico do Benfica, um técnico informático e um funcionário judicial são detidos pela Polícia Judiciária por suspeitas de corrupção ativa e passiva.

Alegadamente, Paulo Gonçalves terá subornado ou aliciado três funcionários judiciais para lhe fornecerem dados do chamado “caso dos e-mails”. Mais tarde, o número de arguidos subiu até sete.

Foram realizadas trinta buscas nas áreas do Porto, Fafe, Guimarães, Santarém e Lisboa que levaram à apreensão de "relevantes elementos probatórios".

Nesta investigação, iniciada há quase meio ano pela Unidade Nacional de Combate à Corrupção da PJ, averigua-se "o acesso ilegítimo a informação relativa a processos que correm termos nos tribunais ou departamentos do Ministério Público a troco de eventuais contrapartidas ilícitas a funcionários".

No início de setembro, o Ministério Público acusa dois funcionários judiciais, a SAD do Benfica e Paulo Gonçalves de vários crimes, incluindo corrupção, favorecimento pessoal, peculato e falsidade informática.

Para o MP, "ficou suficientemente indiciado que os arguidos com a qualidade de funcionários de justiça, pelo menos desde março de 2017, acederam a processos-crime pendentes no DIAP [Departamento de Investigação e Ação Penal] de Lisboa e do Porto e em outros tribunais, transmitindo as informações relevantes ao arguido colaborador da SAD, fazendo-o de acordo com a solicitação do mesmo e em benefício da mesma sociedade".

O Benfica considera a acusação "absurda e injustificada" e reitera a convicção "quanto à inexistência de factos que justifiquem qualquer acusação".

Já o presidente do FC Porto, Jorge Nuno Pinto da Costa, numa entrevista à revista Dragões fala sobre a suposta "rede de tentáculos a todos os títulos vergonhosa" do Benfica, que a "operação e-toupeira" veio expor mais ainda.

Neste processo, há uma nova ramificação política com a revelação de um documento em que o primeiro-ministro, António Costa, pede bilhetes para os seus filhos, na altura em que era presidente da Câmara de Lisboa.

Em setembro, o Ministério Público acusou a SAD do Benfica de 30 crimes e o assessor jurídico, Paulo Gonçalves, de 79 crimes.

Gonçalves é suspeito de um crime de corrupção ativa, um de oferta ou recebimento indevido de vantagem, seis de violação de segredo de justiça, 21 crimes de violação de segredo por funcionário (em coautoria com os arguidos Júlio Loureiro e José Silva, funcionários judiciais), 11 crimes de acesso indevido (em coautoria), 11 crimes de violação do dever de sigilo (em coautoria) e 28 crimes de falsidade informática.

A SAD está acusada de um crime de corrupção ativa, de um crime de oferta ou recebimento indevido de vantagem e de 28 crimes de falsidade informática. A consequência mais grave que pode resultar do processo é a de "suspensão de participação em competição desportiva por um período de seis meses a três anos".

Caso Aliciamento

A Polícia Judiciária (PJ) e o Ministério Público (MP) investigam todos os jogos realizados pelo Benfica, para a Liga, nas últimas cinco épocas. Em causa estão mais de 160 jogos.

O caso começa por se reportar a um jogo entre Benfica e Rio Ave, mas, mais tarde, junta-se-lhe o jogo com o Marítimo da mesma época: 2015-2016.

Segundo uma reportagem da SIC, um jogador do Marítimo revela que dois homens, entre os quais o empresário César Boaventura, marcam um encontro no Pestana Casino Park Hotel, na Madeira, em vésperas da equipa madeirense defrontar a da Luz. Oferecem-lhe 40 mil euros para não jogar como o habitual. O jogador recusou a oferta e diz que nunca mais os viu. Os homens nunca se identificaram durante a conversa.

Ao mesmo tempo, também o Sporting é acusado de ter pagado 40 mil euros à equipa insular para que ganhasse esse jogo ao Benfica.

Operação Lex

A investigação visa o juiz desembargador Rui Rangel, ex-candidato à presidência do Benfica, e implica o atual líder dos encarnados, Luís Filipe Vieira. São os pontos de partida para a Operação Lex, uma grande investigação Unidade Nacional de Combate à Corrupção (UNCC) da Polícia Judiciária (PJ).

A investigação surgiu a partir de uma certidão extraída da Operação Rota do Atlântico, na qual há dois arguidos em prisão preventiva: José Veiga, ex-empresário de jogadores, e Paulo Santana Lopes, irmão do antigo primeiro-ministro Pedro Santana Lopes.

A PJ fez 33 buscas, entre as quais na casa e no gabinete de Rui Rangel, na SAD do Benfica e na casa do Vieira. Nas palavras da Procuradoria-Geral da República, estão em causa suspeitas dos crimes de “corrupção e recebimento indevido de vantagem, branqueamento de capitais, tráfico de influências e fraude fiscal”.

Os juízes Rui Rangel e Fátima Galante encabeçam a lista que conta já com 12 arguidos. São ambos desembargadores - juízes de um tribunal de segunda instância - no Tribunal da Relação de Lisboa.

O presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira, terá prometido lugares de destaque no clube ao juiz Rangel, com quem comunicava em código, segundo a revista "Sábado". O líder encarnado usava o código "IC19", designação da via que liga Lisboa e Sintra, para comunicar com Rangel, quando se referia à alegada promessa do juiz de intervir no litígio fiscal de 1,6 milhões de euros que a empresa de Vieira tinha com o Fisco.

Em troca Vieira prometia um cargo remunerado na futura direção da escola e universidade do Benfica. Rangel passaria, ainda, a ser um "convidado VIP" das viagens do clube ao estrangeiro, a contar para as competições internacionais.

Suspeitas de lavagem de dinheiro

O alerta bancário sobre a transferência de 1,89 milhões de euros do Benfica para uma consultoria informática e o posterior levantamento do dinheiro está na origem da investigação que foi espoletada por um alerta bancário. O depósito de uma grande quantia e o imediato levantamento da mesma motivou o alerta às autoridades.

De acordo com o Jornal de Noticias deu a conhecer, existe no Benfica um esquema para pagar menos impostos que pode configurar o crime de fraude fiscal e o de lavagem de dinheiro.

Fonte oficial da Policia Judiciária confirmou as buscas no Estádio da Luz e até agora já há seis arguidos confirmados, entre os quais sociedades ligadas aos encarnados.

A investigação procura “esclarecer se os montantes faturados por várias empresas ao Benfica tinham na sua base efetivas prestações de serviços ou se foram apenas uma forma de justificar a saída de alguns milhões de euros das contas dos encarnados”. Por outras palavras, o MP e a PJ desconfiam de lavagem de dinheiro na Luz.

O Benfica começou por negar a notícia do Jornal de Notícias que denunciou o caso, dizendo ser difamação, mas mais tarde a Procuradoria-Geral da República confirmou buscas que contaram com 25 inspetores da PJ resultaram seis arguidos, oito mandados de busca e uma quantia de 1,9 milhões de euros de uma suposta prestação de serviços de consultoria informática.

[Notícia atualizada a 13/09/2018]