Movimentações na União Europeia
13-05-2022 - 06:11
 • Francisco Sarsfield Cabral

O governo de Boris Johnson prepara-se para rasgar o acordo sobre a Irlanda do Norte que negociou com a UE. Uma decisão unilateral, que a UE não poderá aceitar. Já Macron avançou com uma proposta que não necessita de qualquer revisão dos tratados.

Na Irlanda do Norte (Ulster), segundo o regime atual, o partido mais votado indica o chefe do governo e o segundo indica o vice primeiro-ministro. O Sinn Féin ganhou as eleições, pela primeira vez em 101 anos, e chefiará o governo do Ulster. No entanto, o partido pró-britânico, protestante, recusa-se a ir para o governo, enquanto vigorar uma fronteira virtual, no mar, entre a ilha irlandesa e a Grã-Bretanha. Esta foi a solução encontrada para manter aberta a fronteira terrestre entre o Ulster e a República da Irlanda.

Perante as reclamações dos protestantes pró-britânicos, que julgam que a solução encontrada ameaça a ligação do Ulster à Grã-Bretanha, o governo de Boris Johnson prepara-se para rasgar o acordo que negociou com a UE. Uma decisão unilateral, que a UE não poderá aceitar.

Se os britânicos não apresentarem uma melhor solução - o que parece muito difícil - a UE terá de fechar a fronteira terrestre entre o Ulster e a República da Irlanda, de modo a que no mercado único europeu não entrem bens britânicos sem pagar direitos alfandegários.

Este problema foi e é o mais difícil nas negociações do Reino Unido com a UE, por causa do Brexit. E Boris Johnson já mostrou não ter escrúpulos em renegar um acordo por si assinado.

Entretanto sucedem-se as declarações de políticos europeus apelando a que sejam revistos os tratados da UE, para se aprofundar a integração, agora que a guerra na Ucrânia colocou novos desafios. Até a presidente da Comissão, Ursula von der Leyen, se mostrou favorável a uma revisão dos tratados. Infelizmente, não parece que tenham sido ponderados os riscos, diria mesmo, a forte probabilidade, de referendos em vários Estados membros rejeitarem as mudanças propostas.

Não é o caso do Governo português. O secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Tiago Antunes, entrevistado por Teresa de Sousa no “Público”, afirmou que “é possível responder às necessidades de cada crise sem a revisão dos tratados”, acrescentando “sabemos bem quão traumáticos foram alguns processos de revisão dos tratados”. É uma posição sensata.

O presidente francês Macron defende a revisão dos tratados. Mas uma das suas sugestões, que defendeu há dias perante o Parlamento Europeu, não necessita de qualquer revisão dos tratados. Refiro-me à criação de uma comunidade política europeia, juntando os países da UE, candidatos à adesão e países que tenham saído da UE (Reino Unido). A condição para pertencer a esta nova comunidade seria que os seus membros partilhassem os valores democráticos da UE.

Macron retoma assim uma proposta de confederação apresentada por Mitterrand após a queda do muro de Berlim e que não teve seguimento. Para criar esta nova comunidade bastará negociar e aprovar um novo tratado, ao lado dos tratados da UE. A prevista Comunidade Política Europeia seria sobretudo um “fórum” de debate de ideias e projetos. Talvez seja útil.