Patrões acusam Governo de “grande perseguição ao trabalho temporário”
07-10-2021 - 06:48
 • João Carlos Malta

A ministra do Trabalho quer reduzir o número de renovações dos contratos temporários. Empresários criticam a medida e falam em "mais um constrangimento". Economista especialista na área do trabalho diz que esta mudança "vai no sentido de diminuir a precariedade laboral”.

A secretário-geral da Confederação do Comércio de Portugal (CCP), Ana Vieira, acusa o Governo de “uma grande perseguição ao trabalho temporário e ao recurso ao trabalho temporário”.

É a reação dos patrões à vontade do Governo de que os contratos de trabalho temporário tenham como limite máximo quatro renovações. Se a intenção avançar aproximará este regime ao que é aplicado aos contratos a termo.

Esta foi uma das 67 propostas apresentadas pela ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, na Comissão Permanente de Concertação Social (CPCS), que decorreu quarta-feira, e que o Governo pretende levar a Conselho de Ministros ainda em outubro.

Ana Vieira considera que a “limitação do número de renovações é negativa, porque já só é permitido o recurso a trabalho temporário em situações muito concretas”.

O regime do trabalho temporário já tinha sofrido alterações na última revisão do Código do Trabalho, em vigor desde outubro de 2019. Na altura, o limite máximo passou a ser de seis renovações.

O economista João Cerejeira, especialista na área laboral, defende que “este tipo de medidas faz sentido, vai no sentido de diminuir a precariedade laboral” e lembra que, quando em 2019 foi feita a anterior alteração do regime dos contratos a termo, houve uma moeda de troca: “o aumento do período experimental para os contratos sem termo”.

As consequências

O docente da Universidade do Minho afirma ainda que esta alteração “acaba por aumentar a responsabilidade das empresas e o custo do recrutamento”, uma vez que há um encargo implícito que é a possibilidade de cessação do contrato.

Por outro lado, argumenta que poderá ter um efeito benéfico na produtividade das empresas, uma vez que a aposta deixa de ser no curto prazo. Assim, será mais frequente os casos em que é dada formação aos trabalhadores. “É uma perspetiva mais de longo prazo e não de curto prazo”, sintetiza.

Para a secretária-geral da CCP, as empresas que precisam de recorrer a este modelo de contratação “ficam sem esta alternativa e terão de fazer contratações nos termos gerais como se fazem outras”.

Ana Vieira afirma que os contratos temporários são para situações “muito pontuais” como “doenças prolongadas, ou outras situações em que é difícil de saber ao empregador quando é que o trabalhador volta ao mercado de trabalho”.

É mais um constrangimento para as empresas”, critica.

A representante dos empresários explica ainda que os dados que vão sendo fornecidos pelo Governo dizem “que há um número muitíssimo reduzido de pessoas que se mantêm por muito tempo com este tipo de contratos”. Por isso, “legislar para situações pontuais parece-nos errado”.

"Absurdo"

O Governo quer ainda consagrar na lei a “obrigatoriedade” de celebrar contrato por tempo indeterminado para cedência temporária entre a empresa de trabalho temporário e o trabalhador, “sempre que este seja cedido ao abrigo de sucessivos contratos com diferentes utilizadores por mais do que quatro anos, duração máxima legalmente prevista para a contratação a termo”.

Ana Vieira diz que o pacote de medidas que o Governo quer adotar para o trabalho temporário “não parece equilibrado”, e algumas “parecem absurdas” como a de “obrigar as empresas de trabalho temporário a terem uma percentagem de trabalhadores com contratos sem termo”.

"Isto é uma contradição”, avalia a secretária-geral da CCP.

Já o economista João Cerejeira espera que a limitação de renovações de contratos temporários seja equilibrada com outras medidas que façam com que as empresas não sintam tanto o impacto desta decisão. E pede ao executivo que tente perceber o porquê de as empresas não estarem interessadas em contratar sem termo.

Poder-se-ia descobrir que o custo não é tanto da indeminização, mas mais a incerteza na carga burocrática e jurídica”, remata.

No documento que estará em discussão, o Governo avança para a criminalização do trabalho totalmente não declarado e tem intenção de impedir as empresas que tenham promovido despedimentos coletivos e despedimentos por extinção do posto de trabalho de recorrer ao outsourcing no período subsequente ao despedimento.