Portugal conseguiu 57 pontos nos Jogos Olímpicos de Paris. São os melhores resultados de sempre (em igualdade com Tóquio, mas com medalhas de maior valor a desempatar). Factos: 57 pontos, quatro medalhas e 14 diplomas olímpicos.
Foi decisivo (e histórico) o contributo de Iúri Leitão, com medalha de ouro e prata, no omnium e no madison (duas medalhas nuns Jogos, coisa nunca vista). É campeão do mundo em título, tem 26 anos e, sem lesões, poderá estar em plena forma em Los Angeles 2028.
Pedro Pichardo era campeão olímpico em título e, desta vez, foi prata. Ficou a ideia durante o concurso que estava superior ao adversário, mas não acertou bem na chamada e acabou por ficar dois centímetros atrás.
Percebo a frustração. E ele voltou a Portugal com críticas e ameaças de abandonar. Se se entender com quem de direito e mantiver o foco, poderá estar na luta daqui a quatro anos, mesmo sabendo que o adversário espanhol, Jordan Diaz, leva duas vitórias seguidas, no Europeu e nos Jogos Olímpicos, e é mais jovem.
Já se sabia do imenso potencial de Patrícia Sampaio e só as muitas lesões vinham atrasando a evolução da judoca. No dia da prova esteve intratável, foi ultrapassando adversárias com facilidade e o torneio só não foi perfeito porque acabou por perder contra a futura campeã olímpica. Foi bronze, mantendo a tradição portuguesa da medalha olímpica no judo.
Estas foram as quatro medalhas alcançadas. Nas minhas previsões, eu tinha colocado num primeiro escalão de candidatos às medalhas Pichardo e Leitão, tal como Fernando Pimenta e a dupla João Ribeiro/Messias Batista, ambos na canoagem.
Os canoístas chegaram à final como previsto, mas na regata decisiva não conseguiram o pódio, como esperavam, como esperávamos todos. Desilusão, sim, mas “falhanço” parece-me demasiado forte. Percebo que alguns o digam, até porque eles são campeões do mundo, mas lembro que a dupla falhou a prata por seis décimas.
Pimenta tem mais de 100 medalhas internacionais conquistadas e este pode ter sido apenas um dia mau na pior altura ou o primeiro sinal de que a idade não perdoa. O canoísta acredita que vai estar em Los Angeles. Tenho dúvidas mas, aconteça o que acontecer, já ninguém tira Fernando Pimenta dos melhores desportistas de sempre.
No atletismo havia duas baixas de peso: Patrícia Mamona e Auriol Dongmo, duas candidatas a medalhas. Muito azar com as lesões impediram a presença em Paris.
De Isaac Nader esperava-se mais, mas, na verdade, não era realista pensar em diploma. Salomé Afonso melhorou em seis segundos o seu melhor tempo, prova superada. Cátia Azevedo voltou a não conseguir as meias-finais, mas estava feliz (e ainda nem sabia do pedido de casamento).
Agate Sousa era claramente uma candidata a diploma, mas uma lesão a cinco dias da prova estragou tudo, mas é jovem e daqui a quatro anos lá estará na luta. Jéssica Inchude garantiu um diploma, minimizando a falta da Auriol.
No judo, para além da medalha de Patrícia Sampaio, vários outros judocas tinham capacidade para mais, especialmente Jorge Fonseca, que já foi bicampeão do mundo. Sem Telma Monteiro, que uma lesão tirou dos seus sextos Jogos, Tais Pina vai ser aposta clara. Veremos quem mais vai chegar a Los Angeles.
Na natação, o país punha todas as fichas no Diogo Ribeiro, mas aí está um claro exemplo de falta de cultura desportiva. Sim, é verdade que o miúdo foi campeão do mundo nos 100 metros mariposa, mas tinha o 17.º tempo à chegada aos Jogos. Vários dos melhores não estiveram nesses tais Mundiais, mas ninguém quis explicar isso bem às pessoas.
O próprio atleta, que terá tido um problema de saúde antes da prova e perdeu alguma forma, podia tê-lo feito, antes ou depois dos Jogos. Camila Rebelo foi campeã da Europa e sofreu do mesmo “mal”, excesso de expectativas.
No triatlo, Portugal tem tradição de bons resultados e desta vez voltou a acontecer. Vasco Vilaça foi quinto e eu tinha a secreta esperança que pudesse ter sido ainda melhor, mas sei lá o que é nadar num rio naquelas condições.
No total a modalidade conseguiu três diplomas olímpicos (Ricardo Batista no individual e mais a estafeta mista, com Maria Tomé e Melanie Santos) e qualquer um dos quatro atletas tem condições para repetir presença daqui a quatro anos.
Na vela, a dupla da equipa mista (Diogo Costa e Carolina João) terminou num excelente quinto lugar e fiquei a saber que são excelentes com pouco vento. Não sei como será nos Estados Unidos, mas vamos ficar de olho.
Já Eduardo Marques acabou por ter azar: estava à porta da “medal race”, mas foram eliminadas as últimas duas regatas. Merecia ter ido até ao fim. Mafalda Pires de Lima, a atleta do kite, não era esperado que estivesse em Paris, mas aproveitou para fazer um bom estágio para daqui a quatro anos.
O surf foi longe de França e longe ficou dos melhores resultados. Se há três anos conseguiu-se um diploma, esperava-se a repetição do feito, mas não foi possível.
Nélson Oliveira é um pêndulo e voltou a repetir o diploma olímpico no contrarrelógio. Um furo impediu Rui Costa de tentar melhor na estrada. Ambos não estarão em Los Angeles. Vamos ver que seleção teremos na altura, mas há juventude com talento a despontar (e João Almeida, claro, se o calendário e a equipa permitirem).
Para fechar os diplomas, tivemos duas belíssimas surpresas: Maria Inês Barros, no tiro, e Gabriel Albuquerque, no trampolim. São dois jovens, claros candidatos a repetir a gracinha daqui a quatro anos.
Nota ainda para Filipa Martins. Nos seus terceiros Jogos conseguiu chegar à final da ginástica e terminou em 20.º lugar. É a melhor classificação de sempre da modalidade.
Ao miúdo do skate, Gustavo Ribeiro, que nos garantiu a medalha à partida, só espero que o azar que teve lhe faça bem para a próxima e lhe permita alguma ponderação. Era o número 2 do mundo à chegada, mas à saída falhou sequer o lugar na final.
A minha prioridade foi acompanhar a comitiva portuguesa, mas ainda dei especial atenção às minhas favoritas: atletismo, natação e ginástica.
Marchant, Duplantis, aquela final dos 400 metros barreiras femininos e a final dos 100 metros decidida por milésimos ficaram na memória.
E, agora, permitam-me esta reflexão, que já vai sendo habitual, infelizmente: Portugal é um país que só liga a futebol (para ser mais correto, ao clube X, Y ou Z). Não conhece mais nada, mas de quatro em quatro anos, durante três semanas, as pessoas são rapidíssimas a exigir medalhas a atletas que nem sabem quem são, nem que condições de treino tiveram.
Quem conhecia as regras do madison? Ou quantas regatas são precisas para a final? Ou quantos saltos se fazem numa final de triplo salto? Ou como é isso do “all-around”?...
Os portugueses no geral têm de ganhar cultura desportiva, o Estado tem de perceber que positiva é essa aposta, desde o desporto escolar à alta competição. E não falo só de dinheiro.
Há pouco mais de 10 anos nem se sabia o que era isso do ciclismo de pista e, agora, só com um velódromo a sério, em todo o país, já se conseguem medalhas olímpicas. Não estou a pedir velódromos em todos os distritos, mas tem de se apostar.
Quantas pistas de atletismo existem? Quem sabe, dar condições aos atletas e replicar o exemplo da natação: juntar os melhores e dar-lhes as melhores condições, no mesmo local, para que possam conciliar desporto e estudos.