Não basta redigir leis
23-05-2022 - 06:15
 • Francisco Sarsfield Cabral

É frequente entre nós os políticos redigirem leis e depois muitas dessas leis não serem aplicadas. Outras vezes as leis não são regulamentadas. E a vontade de legislar leva às vezes a um descabido intervencionismo estatal na esfera privada das pessoas.

Já aqui observei que entre os políticos portugueses existe uma ânsia de elaborar leis, por vezes na ilusão de que assim se resolvem os problemas. De facto, é demasiado frequente entre nós que se redijam leis e depois muitas dessas leis não serem aplicadas. Outras vezes as leis não são regulamentadas, o que lhes tira qualquer eficácia.

Por isso falo em ilusão. Dir-se-ia que, findo o esforço de redigir um diploma legal e de o fazer aprovar, alguns políticos sentem ter cumprido o seu dever e desligam do assunto.

Outras vezes existe incúria, como referiu Paulo Mota Pinto, líder da bancada parlamentar do PSD, a propósito de os governantes não terem enfrentado durante anos a inconstitucionalidade da lei sobre o armazenamento de metadados e só agora acordarem para o problema. Digamos que a primeira exigência que devemos fazer aos políticos que elaboram leis é que estas sejam constitucionais e não enfermem de erros jurídicos.

Por outro lado, a vontade de legislar leva às vezes a um descabido intervencionismo estatal na esfera privada das pessoas. É o caso de se criminalizarem determinadas ações ou omissões que melhor ficariam confinadas no plano privado e pessoal.

Francisco Teixeira da Mota, excelente advogado, referia há dias no “Público” dois casos de excesso de intervencionismo estatal, ao criminalizar atos que que não o deveriam ser. Trata-se, como pretende o Bloco de Esquerda (BE), de considerar crime, com pena de prisão até três anos, “quem publicitar, facilitar, promover ou praticar esforços que visem alterar a orientação sexual de outra pessoa”.

Uma tal tentativa é lamentável, sem dúvida, “mas é crime? Parece-me que não”, afirma F. Teixeira da Mota, com razão.

O outro caso é o apelo de 18 mulheres, apoiado pelo BE, de considerar a violação um crime público, mesmo contra a vontade da vítima. Contra a violação ser sempre um crime público pronunciou-se a deputada Isabel Moreira, por respeito pela vontade da vítima.

Como escreve F. Teixeira da Mota “ou aceitamos a possibilidade de cidadãos adultos também poderem saber o que mais lhes convém ou estamos convictos de que só o Estado é que sabe o que é melhor para cada um de nós”.