“Dar a vacina aos países mais pobres é também uma forma de nos proteger”
27-12-2020 - 08:24
 • Henrique Cunha

Ana Sofia Carvalho, do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, acredita que a necessidade de se atingir a imunidade de grupo pode precipitar a solidariedade, pois “tudo o que é instrumental é mais fácil de ser acolhido”.

Este domingo fica marcado, em Portugal, por esse passo histórico do início da vacinação anti-Covid. E este é um momento que nos volta a remeter para os apelos do Papa e também das Nações Unidas, para que seja possível o acesso universal à vacina.

Na última semana, a Congregação para a Doutrina da Fé emitiu uma nota em que, entre outras coisas, volta a pedir que “as vacinas sejam acessíveis aos mais pobres e de forma não onerosa para eles”.

Segundo aquele organismo da Santa Sé, a falta de acesso às vacinas tornar-se-ia “mais um motivo de discriminação e de injustiça que condena os países pobres a continuar a viver na indigência sanitária, económica e social”.

Na opinião de Ana Sofia Carvalho, membro do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, a necessidade de se criar uma imunidade de grupo geral pode precipitar a necessária solidariedade para com os mais desprotegidos.

A professora do Instituto de Bioética da Universidade Católica sugere que, “normalmente, tudo o que é mais instrumental é mais fácil de ser acolhido, como medida solidária” e lembra que, “enquanto não tivermos a população mundial vacinada, sabemos que não existirá uma imunidade do ponto de vista geral”. Portanto, “o vacinar e dar a vacina aos países mais pobres é também uma forma de nos proteger".

Ana Sofia Carvalho diz que vai ser necessário pensar a solidariedade de forma diferente e entende ser necessário que os países comecem a pensar em ceder a vacina aos mais desfavorecidos a partir do momento que atingem a ansiada imunidade de grupo.

“Aquilo que tem sido publicado, inclusive pela OMS, é de tentar perceber a partir de que nível da imunidade de grupo nós podemos conseguir começar a dispersas as vacinas a países mais pobres que não tem possibilidade de as comprar”, sublinha a professora de Bioética.

Ana Sofia Carvalho prevê que “isso vai ser certamente um assunto a discutir, um assunto a marcar a agenda no próximo ano”.

A especialista manifesta a esperança de que “estas pessoas não fiquem desprotegidos, porque aquilo que vemos em países sobretudo da América Latina é realmente um problema grave que nos convoca a todos para sermos solidários”.

“Mas convoca claramente cada um dos nossos países e estruturas como a União Europeia para pensar a solidariedade de uma forma diferente”, remata.