Bolsonaro está a tentar “replicar invasão do Capitólio”, acusa constitucionalista
29-05-2022 - 09:01
 • Lusa

"Nos últimos meses ficou claro que o Governo tem um plano em andamento, que é minar a confiança nas eleições e no judiciário" e de "intimidar os juízes", alerta Diego Werneck Arguelhes.

O constitucionalista Diego Werneck Arguelhes, signatário da carta enviada à ONU sobre a "campanha sem precedentes" contra os tribunais brasileiros, avisou que o Presidente brasileiro está a criar bases para `uma invasão do Capitólio’, como aconteceu nos Estados Unidos.

"Jair Bolsonaro está fazendo isso em câmara lenta, o que a gente está a ver no Brasil é um 6 de janeiro, a invasão do capitólio em câmara lenta", contou à Lusa o professor associado do Instituto de Ensino e Pesquisa do Brasil e doutorado em Direito pela Yale University, nos Estados Unidos.

O ataque à sede do poder legislativo norte-americano ocorrido em 6 de janeiro de 2021 por uma multidão de apoiantes do ex-presidente Donald Trump que pretendiam impedir a confirmação da eleição de Joe Biden, na sequência de Donald Trump ter levantado suspeitas infundadas de que processo eleitoral tinha sido fraudulento.

"Olhamos para o que aconteceu nos Estados Unidos com a invasão do Capitólio e percebemos que estava muito claro, basta juntar os factos, que o Bolsonaro está tomando o que aconteceu lá nos Estados Unidos como um `blueprint`, um plano que ele pode seguir", denunciou o constitucionalista brasileiro.

Foi precisamente o receio de que aconteça o mesmo no Brasil, que em outubro terá eleições presidenciais, altamente polarizadas entre o atual Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, e o ex-presidente Lula da Silva, que levou Diego Werneck Arguelhes e mais de 80 professores e juristas brasileiros a enviarem a carta ao relator especial para a Independência de Juízes e Advogados da ONU, Diego Garcia.

"Somos um grupo de académicos, de direito, nós não somos ativistas, nem políticos", frisou.

Para o constitucionalista, o risco de acontecer algo mais grave após as eleições presidenciais no Brasil é maior do que o que aconteceu nos Estado Unidos já que, Bolsonaro, começou a plantar o discurso "de fraude nas eleições há muito tempo", desde as eleições que ele próprio venceu, em 2018.

"Ele já disse várias vezes que o resultado que não reflita a vitória dele vai ser suspeito", lembrou Diego Werneck Arguelhes.

"Já faz parte da base de apoio dele essa desconfiança em relação às urnas, mesmo que isso não faça sentido alguma e que não existam evidências", considerou.

Para além disso, denunciou, as ações de Bolsonaro para minar o processo eleitoral têm "conivência de várias instituições" como a Câmara dos Deputados, que nunca iniciou um processo de impeachment (como aconteceu nos Estados Unidos com Trump) e até por parte da Procuradoria-geral da República por não investigar atos de Bolsonaro passiveis de crime.

"Trump chegou a sofrer um processo de impeachment (...) no Brasil o Bolsonaro não teve nenhum início de processo contra ele, a mensagem que ele recebeu da Procuradoria-Geral da República é de que ele pode minar a justiça eleitoral, semear a desconfiança nas eleições sem que isso gere um problema para ele", acusou.

Em paralelo, para além de insistir que o sistema de votação eletrónica do país não é confiável, Bolsonaro tem intensificado os ataques a magistrados do Supremo Tribunal Federal (STF) e tem dito que não respeitará determinadas decisões judiciais, em especial do juiz Alexandre de Morais, que será o presidente do Tribunal Superior Eleitoral durante as eleições presidenciais do Brasil.

Em abril, Bolsonaro reverteu a condenação, através de um indulto presidencial, do congressista de extrema-direita Daniel Silveira, condenado a oito anos de prisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF) pelas suas ameaças às instituições democráticas.

A acrescentar, tem acusado repetidamente membros da autoridade eleitoral de favorecer o seu principal rival, Luiz Inácio Lula.

"Nos últimos meses ficou claro que o Governo tem um plano em andamento, que é minar a confiança nas eleições e no judiciário" e de "intimidar os juízes", afirmou Diego Werneck Arguelhes.

De acordo com o Constitucionalista, Bolsonaro é um "Presidente que quer remover limites ao seu poder" e é um homem "hostil à ideia de que o poder dele é limitado por qualquer outra instituição".

Nas últimas semanas os ataques do Presidente brasileiro à segurança do processo eleitoral têm aumento, tendo Bolsonaro pedido, repetidamente, a participação de militares no apuramento dos votos nas eleições que decorrerão em outubro.

De acordo com as últimas sondagens, Lula da Silva aumentou a diferença para Jair Bolsonaro. O candidato do PT tem 48% das intenções de voto e Bolsonaro, candidato do Partido Liberal (PL), te 27%.

Para vencer à primeira volta é necessário mais de 50% dos votos.