O semanário alemão “Der Spiegel” noticiou que o governo alemão está aberto a abandonar a regra dos orçamentos equilibrados e a contrair mais dívida para evitar uma possível entrada em recessão. A confirmar-se, esta abertura marcará uma reviravolta apreciável na política financeira alemã.
Na opinião pública da Alemanha é muito forte o receio de pressões inflacionistas e de défices orçamentais. Esta tendência é antiga naquelas paragens, mas foi acentuada pela híper inflação de 1923. Nessa altura, o banco central alemão viu-se obrigado a imprimir dinheiro para cumprir compromissos impostos pelos vencedores da I guerra mundial. O aumento de preços foi então vertiginoso, reduzindo a pó todas as poupanças.
Depois da II guerra mundial a economia alemã recuperou dos desastres sofridos. E o perigo da inflação não foi esquecido: o Bundesbank seguiu uma rigorosa política anti-inflacionista, subindo juros ao primeiro sinal de alta de preços. No plano orçamental, a constituição da RFA incluiu um travão à dívida pública: o défice estrutural (isto é, descontando as evoluções cíclicas e conjunturais) não pode exceder 0,35% do PIB.
Ora os governos alemães têm indo mais longe, na prática erigindo o défice zero como imperativo absoluto. Desde 2014 que as contas públicas federais da Alemanha fecham com excedente.
A economia alemã contraiu 0,1% no segundo trimestre deste ano. E as perspetivas não apontam para melhorias; a hipótese de uma próxima recessão é ali muito falada. Daí que, pela primeira vez desde há muito tempo, se ouçam vozes influentes (como a do presidente da maior central patronal) solicitarem ao governo federal maior despesa pública em infraestruturas e no combate ás alterações climáticas, ainda que tal leve a um défice orçamental (mas sem por em causa o “travão” constitucional acima referido).
Esta mudança de política financeira parece justificada, também, pela presente possibilidade de o Estado federal alemão contrair empréstimos a juro negativo. Apelos nesse sentido também têm sido feitos por organizações internacionais, como o FMI. Mas o governo de Merkel, até agora, tem-se mostrado insensível às sugestões de mudar a sua política.
Mudança que seria muito apreciada pela maioria dos parceiros europeus da Alemanha, como Portugal, que assim teriam maiores possibilidades de exportarem para o mercado alemão. E representaria o cumprimento de uma das exigências da moeda única: coordenação das políticas económicas nacionais. Uma exigência que os alemães têm sistematicamente ignorado.
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